Por Camila Mattoso e Ranier Bragon, da Folhapress
BRASÍLIA – A Polícia Federal decidiu nesta sexta-feira, 22, investigar o esquema de candidatas laranjas do PSL de Minas vinculadas a Marcelo Álvaro Antônio, ministro do Turismo do governo Jair Bolsonaro. O esquema dos laranjas foi revelado pela Folha de S.Paulo.
O promotor de Minas Fernando Ferreira Abreu, responsável pela apuração na parte eleitoral, se reuniu nesta manhã com delegados federais para pedir parceria na apuração do caso. O objetivo é que a PF ajude os promotores na busca de mais provas sobre o caso ocorrido nas eleições passadas.
O promotor vai enviar o material do caso à PF na quarta-feira, 27, com os termos de depoimentos de pelo menos sete pessoas envolvidas -as oitivas estão marcadas para esta sexta e a próxima terça, 26.
De posse desses documentos, a PF vai abrir um inquérito e entrar na investigação. Paralelamente à conversa com o Ministério Público, a PF também recebeu uma representação da aposentada Cleuzenir Barbosa, candidata nas eleições passadas que diz ter se recusado a entrar no esquema dos laranjas.
O escândalo dos laranjas do PSL, revelado pela Folha em uma série de reportagens, levou à queda do ministro Gustavo Bebianno do cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência na última segunda-feira (18) e deixou o ministro do Turismo em situação delicada. Integrantes do PSL defendem a demissão do ministro.
As autoridades de Minas iniciaram a investigação no caso após o jornal publicar, em 4 de fevereiro, reportagem segundo a qual o ministro do Turismo, deputado federal mais votado em Minas, patrocinou um esquema de quatro candidaturas de laranjas, todas abastecidas com verba pública do PSL.
Álvaro Antônio era presidente do PSL em Minas e tinha o poder de decidir quais candidaturas seriam lançadas. As quatro candidatas laranjas receberam R$ 279 mil da verba pública de campanha da legenda, ficando entre as 20 que mais receberam dinheiro do partido no país inteiro.
Desse montante, pelo menos R$ 85 mil foram destinados a quatro empresas que são de assessores, parentes ou sócios de assessores do hoje ministro de Bolsonaro. Ele nega irregularidades. Não há sinais de que essas candidatas tenham feito campanha efetiva durante a eleição. Ao final, juntas, somaram apenas cerca de 2.000 votos, apesar do montante recebido para a campanha.
Na última terça-feira, 19, a Folha mostrou que uma outra candidata em Minas disse ter havido um esquema de lavagem de dinheiro público pelo PSL no estado.
Segundo essa candidata, Cleuzenir Barbosa, o agora ministro do governo Bolsonaro sabia de toda a operação. Mensagens de celular dela, publicadas pelo jornal, também contradizem a versão de Álvaro Antônio e revelam cobrança para desvio de verba eleitoral. Ela diz não ter aceitado entrar no esquema.
Sob pressão, o ministro recorreu ao foro especial quando soube da investigação no Ministério Público e pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) que a investigação passe a tramitar perante a Corte. A defesa do ministro quer que, até que o Supremo decida sobre a prerrogativa de foro, a apuração em Minas seja suspensa. O pedido foi sorteado para o ministro Luiz Fux, que cuidará da relatoria.
No ano passado, o Supremo definiu que o foro se restringe a supostos crimes cometidos no exercício do cargo e em razão dele. Além de ministro, Álvaro Antônio é deputado licenciado em segundo mandato.
A defesa afirma que os supostos ilícitos foram praticados enquanto ele era deputado federal e têm ligação com seu cargo, uma vez que o dinheiro de campanha foi parar em contas de empresas ligadas a ex-assessores de seu gabinete na Câmara.
“Observe-se o que diz a reportagem publicada no jornal Folha de S.Paulo que versaria sobre os mesmos fatos: ‘O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, deputado federal mais votado em Minas, patrocinou um esquema de candidaturas laranjas no estado que direcionou verbas públicas de campanha para empresas ligadas ao seu gabinete na Câmara'”, escreveu a defesa.
“Os fatos investigados teriam sido cometidos durante o exercício do mandato parlamentar e seriam intrinsecamente ligados ao cargo público”, sustentou na reclamação ao Supremo.
Além do esquema vinculado ao ministro do Turismo, a Folha também revelou caso semelhante em Pernambuco, que causou a maior crise no governo Bolsonaro até agora, levando à queda de Bebianno da Secretaria-Geral da Presidência.
Reportagem de 10 de fevereiro mostrou que o grupo do atual presidente do PSL, Luciano Bivar (PE), recém-eleito segundo vice-presidente da Câmara dos Deputados, criou uma candidata laranja em Pernambuco que recebeu do partido R$ 400 mil de dinheiro público na eleição de 2018.
Maria de Lourdes Paixão, 68, virou candidata a deputada federal de última hora para preencher vaga remanescente de cota feminina e teve apenas 274 votos. O PSL repassou R$ 400 mil do fundo partidário no dia 3 de outubro, quatro dias antes da eleição –ela foi a terceira que mais recebeu dinheiro do partido no país. O dinheiro foi parar numa gráfica de fachada. As polícias federal e civil, além da Procuradoria, entraram no caso.
Bebianno presidiu o partido de forma interina durante as eleições e era responsável pela distribuição de verbas públicas a candidatos nos estados.
Com a revelação do caso da laranja de Pernambuco, Bebianno tentou se explicar ao presidente, que, ainda internado em um hospital de SP, se recusou a atendê-lo por telefone, como mostrou a Folha. Para negar a crise, o ministro disse ao jornal O Globo que falara com Bolsonaro, mas foi chamado de mentiroso primeiro por Carlos, filho do presidente, e depois pelo próprio Bolsonaro, o que ampliou a crise e terminou com sua queda.