Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – A PF (Polícia Federal) citou depósito de R$ 10 mil pela RAV Construções e Transporte para a LL Consultoria e Serviços para alegar “forte indício” de que o ex-presidente da Comissão de Licitação de Presidente Figueiredo Jender Lobato teria favorecido a contratação fraudulenta da empresa que os investigadores suspeitam pertencer ao deputado estadual Saullo Vianna (PTB).
De acordo com as investigações da Operação Ponto de Parada, deflagrada na segunda-feira, 23, a RAV Construções tem como “real proprietário” o deputado estadual Saullo Vianna, apesar de a empresa estar registrada na Receita Federal no nome de Rosedilse de Souza, que foi presa na ação policial. A PF afirma que ela é apenas “testa de ferro da família Vianna”.
“A investigada refenda acima é apontada como testa de ferro da família Vianna e foi responsável por representar a empresa RAV no pregão presencial nº 003/2017, assinando o contrato com a Prefeitura Municipal de Presidente Figueiredo em 02/03/2017”, diz trecho da decisão que autorizou a prisão de Rosedilse.
A LL Consultoria, que recebeu o dinheiro da RAV Construções em agosto de 2017, segundo as investigações, pertence a Lígia Laíse de Araújo Lobato, esposa de Jender Lobato, que é o atual presidente da agremiação Boi-Bumbá Caprichoso. Para a Justiça Federal, o depósito do dinheiro entre as empresas é “forte indício” de que Lobato favoreceu Saullo.
A Operação Ponto de Parada investiga suposto desvio de dinheiro público na contratação da RAV Construções para o fornecimento de transporte escolar em Presidente Figueiredo, no valor de R$ 5 milhões, em 2017. A PF cumpriu 11 mandados judiciais, dos quais sete foram de busca e apreensão e quatro de prisão temporária expedidos pela 2ª Vara Criminal da Justiça Federal do Amazonas.
As investigações apontam que, após vencer a licitação contra a empresa Auto Viação Maranhão, de propriedade de Udsom Maranhão Santos Duarte, a RAV contratou a Maruaga Comércio de Materiais de Construção, que também pertence a Udsom Maranhão, para executar o serviço de transporte escolar. A Maruaga recebeu R$ 2,1 milhão entre abril de 2017 e outubro de 2018.
De acordo com a PF, mesmo sendo subcontratada pela RAV, a Maruaga “não possui veículos registrados em seu nome aptos ao transporte escolar, o que torna suspeita a terceirização”. Para os investigadores, Maranhão participou do certame apenas para cobrir a proposta da RAV e, depois, “beneficiar-se de uma ‘subcontratação’, a fim de receber valores obtidos com a prática ilícita, em possível conluio entre os titulares das mencionadas empresas”.
Fraudes
Na época em que a RAV Construções foi contratada, Jender era o presidente da Comissão de Licitação de Presidente Figueiredo e foi o responsável pela assinatura do edital do Pregão Presencial n° 003/2017 e pela condução do certame. Na licitação, a empresa foi representada por Rosedilse de Souza.
A CGU (Controladoria-Geral da União) e a Perícia Criminal Federal identificaram que o edital da licitação “continha diversos itens que restringiam o caráter repetitivo da licitação, como, por exemplo, o Anexo II – Rotas do Projeto Básico do Edital do Pregão, que detalha as rotas a serem percorridas durante a prestação dos serviços”.
“Não é possível comparar os trechos que seriam percorrido em KM de forma que somente as empresas que detinham conhecimento profundo sobre as particularidades das comunidades, ramais estradas e rodovias do município de Presidente Figueiredo, conseguiriam avaliar a relação custo x benefício da prestação de serviço”, diz trecho da decisão.
Além disso, a licitação foi realizada por preço global, descumprindo o teor da Súmula 247 do TCU (Tribunal de Contas da União) que obriga a adjudicação por item e não por preço global, em licitações com objeto divisível, como forma de propiciar a ampla participação de licitantes, o que também restringiu o caráter competitivo da licitação.
“Amigo próximo”
A Polícia Federal aponta que Jender e Saullo são amigos próximos e cita que em 2016 eles concorreram juntos o comando da agremiação Boi-Bumbá Caprichoso. “Conforme assinala a autoridade policial, no ano de 2016, Saullo e Jander fizeram parte de uma mesma chapa para concorrer ao comando do Boi Bumbá Caprichoso”, diz outro trecho da decisão.
Ainda segundo a PF, registros em redes sociais no mesmo período do procedimento licitatório “revelam a relação estreita entre os investigados”.
“Testa de ferro”
De acordo com a Polícia Federal, Rosedilse passou a fazer parte da sociedade em janeiro de 2017, com participação de 50%, tendo como sócio o empresário Sérgio Rodrigues Vianna, pai de Saullo Vianna, com cota também de 50%. Em fevereiro daquele ano, o pai do deputado outorgou procuração a Rosedilse para que ela representasse a empresa na licitação.
Em março de 2017, Sérgio transferiu suas cotas societárias para uma terceira pessoa que, no depois, repassou para Rosedilse e ela deteve 100% do capital da empresa. Segundo a PF, apesar de ser dona de empresa que contratou mais de R$ 10 milhões até 2018, Rosedilse era empregada da empresa Amsterdam (atual Porto Serviços), recebendo um salário de R$ 1,7 milhão, e essa empresa tinha como sócia a empresária Célia Maria Velame Vianna, mãe de Saullo Vianna.
A Operação Ponto de Parada também identificou que Rosedilse representou a empresa SVX Serviços Profissionais (Porto Serviços) em uma Tomada de Preços do TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas), com poderes outorgados por Saullo Vianna, que, “pelo menos desde 2013 possui amplos poderes para gerir e administrar a referida empresa”.
A PF cita que, a partir da quebra do sigilo bancário, foi possível verificar que Rosedilse foi responsável por saques de elevada quantia em espécie da conta da empresa RAV, no período de abril de 2017 a fevereiro de 2019. Ela utilizaria a conta bancária dela como “passagem para desviar recursos públicos e dificultar a identificação dos reais beneficiários”.
“Sócio oculto”
A decisão que mandou prender Sérgio foi baseada em indícios de que ele seria beneficiário direto do esquema de desvio de dinheiro público e quem de fato administrava a empresa RAV Construções. Segundo as investigações, à época da licitação, o empresário ainda era sócio da empresa, mas não atuou no pregão presencial.
Ainda de acordo com as investigações, embora tenha se retirado do quadro societário da empresa logo após a assinatura do contrato com a Prefeitura de Presidente Figueiredo, há indícios de que Sérgio “permaneceu como sócio oculto, na medida em que, mesmo após a sua saída da sociedade continuou se beneficiando do lucro oriundo da prática criminosa”.
A Polícia Federal identificou que Sérgio recebeu entre abril de 2017 e agosto de 2018 o montante de RS 68,8 mil, sendo que desse total R$ 11 mil foram sacados em espécie em uma única transação. Os demais valores foram transferidos para a conta pessoal de Vianna por meio de transferências com intervalo médio de um mês entre elas.