Por Teófilo Benarrós de Mesquita, da Redação
MANAUS – Uma cidade caótica e travada, mas que precisa enfrentar os desafios de aperfeiçoamento e atualização na prestação de serviços públicos e relacionamento com o contribuinte. Essa é a realidade de Manaus diante das exigências do conceito de cidades inteligentes, processo iniciado em 2019 com a publicação de documento do Ministério de Desenvolvimento Regional intitulado Carta Brasileira para Cidades Inteligentes.
A aposta mundial é que a transformação digital é uma mudança fundamental para as cidades. Em 2016 foi iniciada cooperação com a Alemanha para estratégias, soluções e iniciativas visando implementar o conceito de cidades inteligentes no Brasil.
Para chegar ao status de cidade inteligente Manaus precisa avançar. A criação do CCC (Centro de Cooperação da Cidade), em 2019, foi o primeiro passo. Em setembro deste ano, o prefeito David Almeida (Avante) instituiu a Comissão Técnica Manaus 4.0 para implementar o conceito de Cidade Inteligente.
A comissão é composta por 8 representantes de secretarias e órgãos municipais, presidida por Radyr Gomes de Oliveira Júnior, secretário da Semtepi (Secretaria Municipal de Trabalho, Empreendedorismo e Inovação). As reuniões do colegiado foram iniciadas, mas o presidente da comissão ainda não tem estimativa dos custos necessários para implementar as ações. “A ideia é desonerar ao máximo o poder público”, afirmou.
Projetos e ações
“Manaus é caótica porque ainda não foi dado o primeiro passo para a criação do conceito de cidade 4.0. Nós vamos fazer um cronograma e nós vamos começar a implementar”, disse Radyr, que planeja entregar os primeiros resultados mesmo antes do prazo. As ações pretendem integrar todos as secretarias envolvidas na Comissão: saúde (Semsa), educação (Semed), finanças (Semef) e mobilidade urbana (Immu).
Apesar da boa vontade governamental, o desafio é grande. Há décadas Manaus não consegue avançar em aspectos simples, como semáforos inteligentes, por exemplo, que auxiliem no fluxo do trânsito e reduzam “gargalos” que se tornaram quase permanentes na cidade.
Na defesa da execução do projeto, o presidente da comissão teoriza: “Precisamos pensar em mobilidade urbana, sinais inteligentes, pensar em um governo mais digital, praças inteligentes, distribuição de internet, e aí você vai espraiando essas ações que são muito importantes para a população”, afirma.
Nesse sentido, nos próximos dias 22, 23 e 24 de outubro será realizado evento para alinhar e discutir soluções tecnológicas para a mobilidade urbana. Será o “Hackathon: Experience”, no Casarão da Inovação Cassina, no Centro Histórico.
O próprio centro antigo, uma das áreas mais degradadas ao longos dos últimos anos está na mira da comissão. “A ideia é levar para lá mais negócios e ocupar o centro novamente com comerciantes tradicionais”. Radyr explica que a evolução das ações será em faixas, corrigindo problemas que a área sempre apresentou.
“A primeira praça de Manaus, a Praça Dom Pedro II, sempre foi conhecida por abrigar mendigos, por crimes, pela prostituição, pela promiscuidade. Hoje isso não existe mais. Nós chegaremos na área dos Remédios, nas feiras. Tem projeto para revitalização da orla. Tem um projeto de ponta a ponta da [avenida] 7 de Setembro”, pontua.
Outro ponto de gargalo com relação à mobilidade, o comércio varejista da Avenida Brigadeiro Hilário Gurjão, conhecida como “Fuxico”, na zona leste de Manaus, também será melhorada. “Neste ano tivemos uma ação do Implurb. Já foi feito um trabalho de planejamento urbano, com a retirada de algumas pessoas que ocupavam a calçada, obstruindo a mobilidade”, disse.
As promessas de regularização dos comerciantes do setor já duram mais de uma década e o desrespeito às calçadas ocupadas por fardos de mercadorias ainda persistem.
O Residencial Viver Melhor também recebe estudos da comissão técnica. “Lá tem mais de 8 mil informais. Foi um conjunto planejado, mais de 22 mil famílias, que ocuparam as garagens e as calçadas com pequenos negócios. É um desafio, porque a distribuição de renda está distante. Nós não queremos, não podemos e não devemos fazer isso, estragar o empreendedorismo que existe ali dentro. Mas nós precisamos dar caminhabilidade (sic), segurança, ter planejamento urbano, cuidar do saneamento. A Cidade 4.0 vai pensar nisso também”.
Resíduos sólidos
Outra ação, de acordo com Radyr, é direcionada à questão dos resíduos sólidos. Ele garante que a comissão trata desse assunto e que resultados poderão ser observados já ano que vem.
“Todos os anos a cheia, que este ano foi histórica, traz um relato triste com relação aos nossos tratamentos de resíduos sólidos. E Manaus tem um gasto absurdo na coleta desses resíduos”, afirma. A nossa ideia é que ano que vem nós não tenhamos as mesmas fotos de anos passados.
O uso da logística reversa é um caminho apontado pela comissão. A prefeitura inaugurou na quarta-feira da semana passada a Central de Logística Reversa de Eletroeletrônicos e Eletrodoméstico, com objetivo de tratar do fluxo dos materiais que compõem os produtos, desde o ponto de origem até o destino final, após o consumo.
“A indústria do lixo vale muito dinheiro. Aí você envolve catadores, cooperativas, empresas de reciclagem e também envolve a questão da logística reversa”, defende Radyr. “Cidades Inteligentes vai pensar na solução, vai precificar tudo isso e tentar desonerar o máximo envolvendo as empresas para bancar a operação de coleta”.
Correção de rumo
Radyr observa que a equipe precisará fazer algumas adaptações. “Você vê algo que não atende o tamanho que Manaus é, mas precisa ser iniciado, o processo precisa ser iniciado” diz, referindo à estrutura do Casarão Cassino, entregue no final da administração passada.
“Você pega o distrito de inovação, por exemplo. Ele não cabe dentro do Casarão Cassino. Você não consegue incubar startups, empresas que tem segredo tecnológico um de frente para o outro em baia. Um com outro. Você não consegue fazer isso com empresas que são do ramo de inovação, que tem segredos. É um ponto intrigante. Você inicia o processo, mas você precisa ter um projeto muito mais amplo para tudo isso”, criticou.
A comissão também projeta levar as soluções digitais “às 500 escolas municipais”, facilitando o acesso . “Pensamos em trabalhar com a Semed dentro desse sentido, conectividade, infraestrutura. Tem muita dificuldade nas escolas da zona rural com internet. Existe um vazio digital muito grande com os nossos alunos da rede municipal de ensino. Nas escolas não, mas nas casas deles, sim”.
Prazos e metas
A missão do grupo intitulado Manaus Cidade 4.0 é realizar estudos para identificar as necessidades da administração pública e estabelecer um cronograma de ações e investimentos para implantação de soluções tecnológicas “para suportar a integração digital total da cidade”.
O prazo para apresentar o diagnóstico dos problemas é 31 de dezembro, podendo ser prorrogado, se necessário. As ações efetivas devem ser implementadas até 31 de março de 2022.
“Nós temos um calendário. A ideia é que em 90 dias nós vamos conseguir entregar essas ações para a sociedade. Queremos ao final de cada mês entregar um plano de ação, um diagnóstico, ou já um produto dentro do que for pensado para que a sociedade tenha acesso aos serviços”, disse o presidente da comissão, em setembro.
Sobre as questões prioritárias para investimento ainda não há estimativa do quanto é necessário para fazer as ações da Manaus 4.0. “A ideia é desonerar ao máximo o poder público. Não torne o poder púbico obrigado a fazer tudo”, defende, afirmando que a Comissão só poderá indicar esses valores ao final do prazo para os diagnósticos.
Radyr Gomes de Oliveira Júnior adiantou que ao final dos trabalhos, no primeiro semestre do ano que vem, vai propor que a comissão seja perenizada, transformada em Conselho.
“Pelas questões óbvias, inclusive de avanço tecnológico, a tendência é que essa comissão vire uma outra estrutura e se torne perene. Não dá para negar que estamos em constante mudança. Quem é que vai acompanhar isso? Precisamos melhorar a entrega do serviço e a relação com o contribuinte. E quem vai implementar essa política de cidade inteligente e governo digital?”, são os argumentos apresentados.
De acordo com conceitos contidos da Carta Brasileira, cidades inteligentes são aquelas comprometidas com o desenvolvimento urbano e a transformação digital sustentáveis empregando tecnologias para solucionar problemas concretos, criar oportunidades, oferecer serviços com eficiência, reduzir desigualdades e melhorar a qualidade de vida das pessoas.