Não dá pra aceitar que, de repente, pequeninos e pequeninas tenham que ficar longe daquele que um dia se fez pequeno e se misturou a todos nós para chegar até o Palácio do Planalto
Por Floriano Lins*, especial para o ATUAL
Empresto a interrogativa da saudosa Domitila Barrios de Chungara, líder operária, feminista de voz altiva, apesar das tentativas de silenciamento sobre o sofrimento dos mineiros da Bolívia. Famosa por sua luta pacífica contra as ditaduras de René Barrientos Ortuño e de Hugo Banzer Suárez. Para quem ama este continente chamado América Latina, Domitila é o rosto e a voz da militância, silenciada em março de 2012 por um câncer no pulmão.
Os dias continuam cruentos. Retornei de um Encontro da Rede Nacional de Proteção de Jornalistas e Comunicadores, em Brasília. Ao pôr os pés em Parintins, Ilha onde está plantado o Cóio das Utopias, nosso refúgio dos guetos apelidados de cidades, deparei-me com uma realidade não muito condizente com as campanhas que fizemos em prol da redemocratização deste País.
Não é novidade que o Estado sempre silenciou as vozes daqueles e daquelas que se atreveram galgar os degraus do poder constituído. Dizem que é o Sistema…
Para minha surpresa, de companheiros e companheiras de luta e de cumplicidades nas campanhas em prol da democracia, nos vem a informação de que durante a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, neste dia 4, sexta-feira, a Parintins, capital do Boi Bumbá, “será proibido hastear e agitar bandeiradas, colocar faixas… a polícia vai tomar”. Foram recados levados em reunião prévia com representantes de movimentos sociais. Enfim, proibir as manifestações mais legítimas das bases que acreditam terem sido ponto culminante na eleição do “Companheiro Presidente”.
Não dá pra ficar calado. Não dá pra aceitar que, de repente, pequeninos e pequeninas tenham que ficar longe daquele que um dia se fez pequeno e se misturou a todos nós para chegar até o Palácio do Planalto e, hoje, um dos dirigentes na América Latina mais respeitado no mundo.
De repente nos vêm algumas interrogações: a quem interessa afastar Lula, o Companheiro Presidente, das bases democráticas que o fizeram chegar de volta ao Planalto? A quem interessa a criminalização dos movimentos sociais, que apenas querem chegar perto de uma liderança legitimamente levada até o posto mais alto da Nação?
Não é fácil para quem vive a luta diária por democracia aceitar chavões de uma direita que hoje coordena as visitas de Lula aos estados e municípios e se impõe sobre verdadeiros interesses da coletividade; se impõe àqueles que deveriam estar no topo dos interesses de um governo democrático, de um governo que veio para restabelecer um diálogo positivo; diálogo em que os pequenos voltem a ser respeitados.
Assim vamos vivendo estas horas que antecedem a visita de Lula a Parintins, região do baixo Rio Amazonas, e não deixam de ser horas angustiantes e com aquele direito à revolta, própria de quem é acostumado a erguer a “Clava Forte da Justiça” para que prevaleçam os direitos constitucionais e os direitos mais legítimos das classes invisibilizadas neste País.
Ora, se estamos vivendo um período de restabelecimento dos desígnios democráticos, por que ceder a esses interesses mesquinhos de quem quer separar cada vez mais o poder central do País de suas periferias, de suas mazelas construídas ao longo de 6 anos de escuridão, em que o fascismo permaneceu e continua rondando, inclusive entre os que tentam comandar a vinda de Lula Parintins? Dizem que a Amazônia Brasileira pertence aos brasileiros, mas há brasileiros que pensam ser melhores que os brasileiros da Amazônia: aí mora o perigo, quando somos subjugados e até rechaçados em nossos direitos à manifestação.
Mestre Paulo Freire nos convida à indignação. O canto dos oprimidos nos desafia transgredir as transgressões do sistema. “… Com as bandeiras nas ruas ninguém pode nos calar…”.
Quem sabe a voz das caboquinhas, dos caboquinhos de Parintins, no centro da Amazônia, possa chegar até aqueles e aquelas responsáveis pelos encaminhamentos dos clamores de quem realmente tem o que dizer ao Presidente e não apenas bajular em benefício próprio; não apenas concessão de títulos graciosos pra fazer boi dormir?
Aqui invocamos o nosso poeta baiano Chico César: “Deus me Proteja de Mim e da maldade de gente boa… e da bondade das pessoas ruins…”.
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*Floriano Lins é Jornalista, escritor, graduado em letras pela UEA, bacharel em Comunicação Social/Jornalismo pela UFAM. Autor do livro “O Homem em Sintonia com a Natureza”. É Educador Popular e Ativista Social. Editor do Portal Floriano Lins.