O funesto evento de Suzano ainda dói e deixa os que se importam perplexos. Talvez alguma resposta a essa ocorrência tão grave possa ser extraída do sanguinário ocorrido na escola de São Paulo. Subestimar os aspectos e detalhes de delitos tende a piorar as perspectivas de prevenção dos mesmos.
Embora se reconheça a educação escolar algo essencial, não é apenas dela a “culpa” pelo problema. A questão é mais profunda: tratar-se da socialização ou formação de gente pra viver com outras gentes.
O processo pelo qual estamos formando as pessoas, desde a fase infantil, é frequentemente debilitador e raramente agrega qualidades humanas e sociais aos indivíduos e grupos. Estes são iniciados em processos débeis e mentalmente adoecidos, os quais não os prepararam para conviver em sociedade nem assumir certas responsabilidades. Tais indivíduos acabam se vendo como vítimas desprezadas do mundo ou se fazem dele justiceiros a seu trágico modo. E, sendo possível obter meios que provoquem destruição e impactos sociais, colocam-se contra o todos, em especial aqueles com os quais convivem, na família, na escola e no meio social.
O processo de socialização que estamos ofertando a crianças, adolescente e jovens, mesmo aos que frequentam boas escolas, é quase sempre fútil, um tanto débil e não raro adoecedor, refletindo-se nas formas sociais e institucionais de relacionamento, inclusive alcançado até mesmo as esferas e poderes estatais. Não é à toa que continuamos sendo a ridícula sociedade dos delírios, dos vícios e do “sabe com quem está falando?”.
O massacre de Suzano expõe questões de segurança pública diante das quais os métodos tradicionais de abordagem da insegurança, da violência e do crime nada podem fazer. Armas, viaturas, inteligência policial, tecnologias operacionais, grupos especiais de repressão, guerra contra as drogas e suas facções de tráfico pouco ou mesmo nada podem fazer frente às questões mais profundas ligadas aos fatores humanos, psicossociais e estruturais da segurança pública. Pode-se reprimir um tanto a insegurança com o sistema de justiça criminal (polícia-judiciário-presídios), mas não se pode promover segurança pública “de costas” para a educação emocional, a saúde mental, a assistência social, o planejamento familiar, a qualificação e inserção profissional. As reais questões de segurança pública não se limitam aos efeitos, mas alcançam efetivamente aspectos causais.
A matança na escola de Suzano, em São Paulo, revela aspectos torpes e doentios do processo de socialização a que podem estar sendo sujeitados a maioria das crianças, adolescentes, jovens e grupos de nossa complexa composição social. É preciso repensar e rever os atuais modelos de formação de pessoas. Tornar os indivíduos seres humanos deve ser a prioridade nas famílias, nas escolas, nas comunidades e em toda sociedade, inclusive com exemplos que partam de todos os que exercem alguma função de autoridade pública ou representação coletiva. O sangrento enigma de Suzano, ao lado de outros como o de Realengo, não podem simplesmente continuar sendo trágicos números estatísticos.
Guernica (1937, Pablo Picasso) – símbolo da repulsa às atrocidades da guerra civil espanhola imposta pela ditadura franquista, pode alcançar também muitas outras tragédias.
Os artigos publicados neste espaço são de responsabilidade do autor e nem sempre refletem a linha editorial do AMAZONAS ATUAL.