O combate à corrupção e ao abuso de poder é um dever cívico, um imperativo ético, uma obrigação institucional, uma necessidade para viabilizar o justo convívio social, uma condição para o desenvolvimento da sociedade.
Não se deve tolerar, sob qualquer justificativa, a corrupção e o abuso de poder por parte de quem quer que seja, muito menos de grupos, organizações ou partidos que se propõem a dirigir o Estado e administrar negócios públicos.
Sejam organizações partidárias de direita, de centro, de esquerda, de qualquer posição, é preciso investigar todos os envolvidos ou suspeitos e, se comprovada a prática corrupta ou abusiva, punir com justiça e rigor, ainda mais quando do envolvimento de agentes que atuaram ou atuem na esfera pública. Não são princípios da administração pública a legalidade, a impessoalidade, a moralidade? Isso deve ser aplicado a todos indistintamente, sem escamotear nem favorecer uns e outros.
Alcance, relevância e legitimidade
O combate à impunidade tem de abranger a todos os grupos e agentes, públicos e privados, seja quem for que haja concorrido para a prática viciada, corrompida, abusiva ou arbitrária. A investigação e a punição não pode se limitar a uma ou outra organização partidária apenas, mas deve se estender a todas que tiverem de algum modo participação na prática da conduta viciada, corrupta e criminosa. Acusar uma organização, um grupo ou um partido, fazendo “vistas grossas” aos demais, quando estes devem ser também investigados, é ser do mesmo modo convivente com o abuso e a corrupção, pois isso resulta na impunidade dos que não foram alvo das instituições de controle. Tal situação produziria um grave desserviço à nação, vez que criaria a possibilidade de potencias quadrilhas não serem notadas, investigadas nem responsabilizadas. Pior ainda, estariam as mesmas organizações credenciadas a se colocar como efetivas possibilidades de poder, ou seja, de comandar politicamente o governo e o Estado, sujeitando a sociedade ao pior. É essencial que tal combate venha em benefício de toda a sociedade e não apenas de certos grupos, organizações políticas, segmentos ou facções. O amplo e indistinto combate à corrupção e ao abuso de poder, ainda mais em casos que dividem tanto a sociedade, é requisito de legitimidade social e de aplicação da justiça.
Forma – processo e procedimento
Não é democrático um regime que não conduz uma investigação administrativa ou policial de modo suficientemente técnico e preciso com vistas a um resultado justo e correto. Um procedimento policial ou processo judicial não pode ser conduzido ao sabor dos interesses políticos e eleitoreiros em disputa. É preciso extirpar o vício da politização do processo, do contrário, violar-se-á não só a lei, mas todo o espírito da legalidade, do direito e da justiça, decaindo-se em modos de proceder nazifascistas.
Para ser minimamente imparcial e válida uma investigação administrativa, policial, ministerial, judicial tem de ser conduzida sem interferências ideológicas, religiosas, filosóficas, patrimoniais, parentais ou de quaisquer outras naturezas, sob pena de viciar não somente os procedimentos, mas também todo o processo. A idoneidade, a probidade e a lisura dos procedimentos são condições viscerais da investigação numa democracia.
A atuação judicial precisa ser respeitável e responsável, consistente e lúcida, obedecendo garantias, ritos e formas legais, muito distantes das ondas de ódio e irracionalidades difundidas em mídias e redes sociais, as quais confundem e entorpecem tantas mentes com peças preconceituosas, odiosas, maledicentes, caluniosas, igualmente degeneradas.
Certos veículos de comunicação, e indivíduos que para eles prestam serviços, chegam ao ponto de difundir sórdidas diarreias informacionais, incitando as pessoas que os assistem a prejulgamentos odiosos e a posturas também viciadas, frontalmente contrárias aos direitos e garantias fundamentais, tais como o direito à ampla defesa, ao contraditório, ao trânsito em julgado. Posturas tão apelativas e parcializadas de veículos de imprensa, emissoras de rádio e tv, mídias de redes sociais, dentre outras, não devem nortear a atuação de órgãos de controle nem de atores que conduzem investigações, procedimentos e processos judiciais. É necessário proceder segundo um critério válido, consistente e legítimo de justiça.
Justiça, direito e lei
A busca pela justiça deve ser a primeira e grande inspiradora dos órgãos de controle e do judiciário. Não há justiça quando as instituições de controle social e judicial atuam com “olho de pirata”. Ainda mais quando há clara evidência de que está em curso um maniqueísta jogo pré-eleitoral. É necessário ter lúcido discernimento e certa equidistância em relação às partes, do contrário “a emenda sairá muito pior que o soneto” e nada aproveitará à nação.
Em razão isso, cumpre interrogar: será que absolutamente nada de proveitoso resultará ao país depois de todo esse processo e prosseguiremos atolados na lama de toda essa crise política? Será que nenhuma regra, instituição ou atividade partidária será aprimorada? Os partidos continuarão a ter donos e a serem “terra de cacique ou de coronéis”? Continuarão a formar egocratas, plutocratas e cleptocratas, fornecendo tais matérias-primas à mediação política? Quando os partidos passarão a formar eticamente seus quadros e a serem mais comprometidos com as causas da sociedade? Alguma reforma política será efetivamente realizada? Ou será que tudo continuará a ser um mero e viciado joquete de trocar “seis por meia dúzia”, o ruim pelo péssimo, o trágico pelo catastrófico? Em que tudo isso resultará de positivo para o desenvolvimento político do país? Teremos, afinal, um projeto para o país minimamente pactuado entre as forças políticas?
É imprescindível ir além das aparências, dos disfarces maniqueístas, das jogatinas eleitoreiras e dos nocivos esquemas, cumprindo a lei e promovendo a justiça no combate à corrupção e ao abuso de poder. Não somente cumprir a lei formal, mas com foco na justiça. Muitas vezes, sob o manto da lei ou da formalidade legal, praticam-se horrendas injustiças e saques de recursos públicos, sobretudo por parte de regimes autocratas, poderes ávidos e ditaduras. A lei deve produzir frutos de justiça e, assim, fazer valer o direito.
Combater o bom combate
Enfim, é fundamental fazer da lei o veículo para realizar o direito e promover a efetividade da justiça, combatendo a corrupção, os abusos de poder e punindo todos os envolvidos com práticas ilícitas, a fim de que o país se liberte de velhos vícios e construa alguma perspectiva de desenvolvimento com sustentabilidade. Esse prossegue sendo o bom combate.
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