Da Redação, com Ascom DPE
MANAUS – O juiz Rivaldo Matos Norões Filho, da 1ª Vara Criminal da Justiça do Amazonas, aceitou, na última sexta-feira, 12, o pedido da DPE (Defensoria Pública do Estado) para afastar o médico obstetra Armando Andrade Araújo dos plantões nas unidades públicas de saúde. Na mesma decisão, o magistrado também aceitou o pedido da DPE para atuar como assistente de acusação no processo em que o médico é acusado de corrupção passiva.
“Diante do aspecto fático e dos fundamentos jurídicos anteriormente expostos, defiro o presente pedido, nos termos dos arts. 282, I e II, e art. 319,VI, do CPP, e, via de consequência determino, pelo menos neste momento, o afastamento do acusado do exercício da sua função na rede pública saúde”, diz trecho da decisão.
Armando é o médico que aparece em um vídeo no qual uma grávida de 16 anos de idade é agredida em trabalho de parto em maio de 2018 na Maternidade Balbina Mestrinho, na Zona Sul de Manaus. O vídeo viralizou nas redes sociais e o obstetra já está afastado da função após a Justiça acatar, no dia 26 de março, outro pedido da Defensoria Pública e deferir liminar que mantivesse válida a decisão de afastar o médico.
No último dia 15 de março, uma decisão judicial havia permitido que Armando voltasse ao trabalho. Com a nova determinação de afastamento, o obstetra passa a ter duas decisões que o impedem de exercer suas funções na rede pública de saúde.
No processo em que a DPE-AM passa a atuar como assistente de acusação do Ministério Público (MP-AM), Armando é acusado de cobrar R$ 3 mil de uma parturiente no Instituto da Mulher e Maternidade Dona Lindu, na Zona Centro-Sul, para realizar uma cesariana em setembro de 2012. O marido da paciente chegou a pagar R$ 2 mil ao obstetra, que realizou o procedimento após receber a quantia.
“Conforme o relato da paciente, ela chegou no Instituto às 18h e, por volta das 22h, foi informada pelo médico Armando que o parto não poderia ser feito na unidade por falta de anestesia, disse que ela deveria ser transferida para a Maternidade Chapot Prevost, na Zona Sul, e pagar a quantia para realizar a cesariana. A mulher estava sangrando, com muitas dores e perdendo líquido. Essa cobrança por um procedimento na rede pública de saúde foi feita durante o trabalho de parto. Eu vejo isso como violência obstétrica”, explica o defensor público Theo Eduardo Ribeiro Costa, que atua na 16ª Defensoria Pública Forense Cível de 1º Grau.
“A cobrança foi feita no momento em que a vítima tinha um estado diferenciado. No parto, se está em uma situação de risco tanto para a criança que está nascendo como para a mãe. Então fica muito mais fácil de você abusar de uma parturiente e fazer uma cobrança indevida, tirar vantagem”, destaca o defensor que foi autor do pedido aceito pela Justiça na última sexta-feira.
A denúncia contra Armando nesse caso foi ofertada à Justiça pelo MP-AM em fevereiro de 2016. A audiência de instrução e julgamento do caso está agendada para o dia 17 de dezembro deste ano.
Para embasar a nova decisão sobre o afastamento de Armando Andrade Araújo, o juiz Rivaldo Matos Norões Filho cita o histórico de processos contra o médico. Armando já foi condenado em outro caso por cobrança para a realização de partos na rede pública.
“[…] e não bastasse, o denunciado ainda responde por outro delito relacionado ao exercício das suas funções junto à 10ª Vara Criminal (processo n. 0231392-27.2016), o qual também foi, em tese, praticado após o fato em apuração nestes autos, inferindo-se, portanto, que há NECESSIDADE da suspensão do exercício da função pública do acusado a fim de evitar a prática de novas infrações penais, uma vez que denunciado vem dando demonstrações de ser contumaz na prática de delitos relacionados ao seu exercício funcional”, diz o magistrado na decisão.
Custos Vulnerabilis
O pedido para a DPE-AM atuar como assistente de acusação do Ministério Público no processo contra o obstetra Armando Andrade Araújo foi embasado com a teoria do custos vulnerabilis (guardiã dos vulneráveis). Conforme a tese, que foi criada pela comunidade acadêmica do Direito amazonense em 2014 e já é utilizada em todo o Brasil, a Defensoria Pública pode atuar institucionalmente em um processo como protetora dos direitos da população vulnerabilizada.
Nesse pedido, a Defensoria Pública considera as parturientes que utilizam a rede pública de saúde do Amazonas como vulneráveis que devem ser assistidas.
“Isso mostra a capacidade da Defensoria de intervir como terceiro interessado pelos vulneráveis e nos dá legitimidade para tutelar esses direitos. Há uma condenação transitada em julgado contra ele e, mesmo assim, o médico Armando continuava trabalhando. Essa atuação dele, obviamente, causava transtornos a inúmeras parturientes que, por fazer uso da rede pública, não têm o direito de escolha de quem vai realizar o parto. A mulher se dirige a uma maternidade de Manaus e é atendida pelo médico plantonista. Muitas vezes quem fez o atendimento foi o médico Armando”, afirma o defensor público Theo Eduardo.
“Isso tem uma consequência muito grave. Porque um médico condenado por fazer cobranças indevidas em um parto não deveria mais estar na rede pública”, ressalta.
Na decisão que habilitou a DPE-AM como assistente de acusação, o juiz reconheceu a vocação constitucional da Defensoria Pública, após também ter recebido parecer favorável do MP-AM para a admissão do pedido feito pelo defensor Theo. O Ministério Público também foi a favor do pedido de medida cautelar diversa da prisão feito pela DPE-AM para o obstetra ser afastado de sua função na rede pública de saúde.