MANAUS – A frase é do médico cubano Richel Collazo Cruz, que trabalha no programa Mais Médicos no município de Chapada, no Rio Grande do Sul, a 336 quilômetros de Porto Alegre. Ele disse mais à Rádio Gaúcha, de acordo com reportagem da Folhapress:
“Ninguém vem de Cuba para cá enganado. Todo mundo sabe o que vai ganhar e a parte com a qual o governo vai ficar. Quando você chega aqui, vem com a mente de que é isso. Quando a gente vê essa diferença, de R$ 300 para R$ 3.000, é uma grande diferença. Esses R$ 3.000 correspondem a um grande salário lá em Cuba”.
Esse médico, diz a reportagem, foi convidado pelo prefeito de Chapada, Carlos Alzenir Catto (PDT), para ser secretário de saúde. O convite ocorreu porque desde que chegou na cidade, em 2014, Collazo passou a fazer a diferença. Não se considera explorado ou escravo do regime cubano. Apenas cumpre seu papel como médico, de acordo com o que foi acordado ou de acordo com o contrato que assinara em Cuba para vir trabalhar no Brasil.
O depoimento do prefeito merece reflexão: “Gostaríamos que ele continuasse no município, porque ele foi muito bem aceito pela comunidade. É um bom médico, nunca nos deixou na mão. Se entrar na nossa página no Facebook, vai ver os elogios. Claro que gostaríamos que ele continuasse médico aqui”.
A prefeitura de Chapada lançou um edital em outubro passado para contratar três médicos para trabalhar no programa Saúde da Família, em regime de 40 horas e com salário de R$ 11 mil, o mesmo salário pago no ‘Mais Médicos’ e o mesmo salário do prefeito.
Não apareceu nenhum médico brasileiro interessado. A prefeitura prorrogou o prazo e nada. Ninguém se interessou para prestar serviço em um município nos confins do Rio Grande do Sul.
Se no Rio Grande do Sul há dificuldade de se contratar médicos, imagine no Amazonas. E não é pelo salário. Pode-se oferecer R$ 40 mil, valor acima do teto salarial do funcionalismo e acima dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Não vai aparecer interessado em fincar raízes num município distante de tudo, sem escolas particulares para os filhos dos médicos, sem assistência à saúde no padrão dos hospitais particulares de referência. Sem mercado para um consultório particular, quem sabe. O que moveria um médico a aceitar ir para um município isolado senão a vocação pela profissão e a vontade de prestar um serviço fora da lógica capitalista?
O presidente Jair Bolsonaro tem todo o direito de não aceitar os termos do acordo com Cuba para o programa Mais Médicos. Mas o governo dele deveria tentar resolver a questão pelo diálogo. Da forma como tratou o assunto, resta agora apresentar uma solução para o problema que criou.