
Por Valmir Lima, do ATUAL
MANAUS – A mineração na Amazônia é a continuidade do modelo colonial de transferência de riqueza (saque ou roubo), que há centenas de anos vem sendo adotado principalmente pelos países da Europa para enriquecimento desses países. A afirmação é da professora de Direito Ambiental Econômico da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Cristiane Derani, que estuda há quase 40 anos as questões ambientais e econômica da região amazônica.
Ela participou neste sábado (15), em Manaus, da Roda de Conversa, na Valer Teatro, organizada pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Ufam (Universidade Federal do Amazonas), que teve a participação de outros convidados ao debate: o professor de Direito da União Europeia, com atuação na Universidade Degli di Siena, Massimiliano Montini; o professor e ex-procurador do MPAM, José Roque Nunes Marques; e a jornalista Rosiene Carvalho, da Band News FM.
Durante a exposição do tema do evento “Democracia, Climas e Economias”, a professora Cristiane Derani afirmou que a Amazônia é também uma construção humana e não apenas natural. A riqueza que serve aos povos que habitam a região e muito cobiçada por diversos países tiveram a participação humana.
A economia, segundo a pesquisadora, diferente da ideia que se tem hoje, é construída a partir do reconhecimento do meio e deve ser equacionada, não excludente. “A economia ou as economias devem ser pensadas e desenvolvidas para aproveitar os recursos e garantir vida plena às pessoas que vivem naquele espaço”, explicou.
Neste sentido, ela lembrou que o conceito de países ricos e países em desenvolvimento é falso, porque nenhum país no mundo foi construído a partir do reconhecimento do meio, mas a partir da transferência de riqueza de um lugar para outro. No caso da Europa, os países hoje considerados ricos colonizaram a África e a Ásia e transferiram grande parte da riqueza lá encontrada.
Esse processo de colonização e saque das riquezas de determinados territórios por outros permanece vivo na sociedade atual, e se materializam na forma de exploração de recursos naturais e minerais. Um exemplo citado no evento pela jornalista Rosiene Carvalho é a exploração de potássio no Amazonas, que está autorizado a uma empresa Canadense, com o nome de Potássio do Brasil.
“Continuamos no modelo colonial de transferência de recursos e de riquezas, sob a alegação de que aqui está se construindo uma riqueza. E não é verdade. É uma transferência de riqueza. Isso é tão claro, mas é tão claro para quem consegue abrir os olhos e ver justamente todo o processo de transferência”, afirma a professora Cristiane Derani.
Derani faz um alerta a respeito da exploração mineral antes de afirmar que para a população ficam apenas as mazelas depois da transferência de riqueza para outros territórios.
“Quando a gente fala em mineração, a gente está falando simplesmente de uma atividade de extração, que por si nos causa ou deveria nos causar um alerta, porque estamos extraindo da terra algo que precisou de milhões de anos para ser construído. Isso nós precisamos olhar com cuidado. Nós somos uma espécie que estamos usando da Terra de maneira bastante inconsequente. Mas mesmo pensando sobre isso, é necessário pensar o que fazer com isso. Para onde isso vai, o que se constrói com isso? A quem isso serve? E quais são as negatividades que isso traz?”
Cristiane Derani diz mais: “Sem esse reflexão inicial, sobretudo de maneira franca e clara, sobre as negatividades, nós vamos sempre estar comprando o discurso barato de que estamos criando empregos, de que estamos levando desenvolvimento. E aqueles que são contra são tachados como os que não querem levar o bem-estar para a população. A história já mostra que isso é uma grande inverdade.”

BR-319
Sobre a BR-319, a professora Cristiane Derani se posicionou contrária à repavimentação e disse ser necessário pensar em modelos de integração diferente da construção de estradas.
Os que defendem a estrada, segundo ela, sempre “colocam os povos na linha de frente, como escudos. ‘Vocês não querem que eles tenham comunicação com o mundo, vocês querem o índio sempre de tanga e sem educação e sem saúde’. É sempre o mesmo discurso há 40 anos”, disse.
“Defendo uma sociedade que não fique defendendo modelos de desenvolvimento, como por exemplo, a Hidrelétrica de Balbina, e outros empreendimentos que só levaram para as pessoas que moram no local todas as mazelas, culturais, sociais, educacionais, de saúde e econômicas. Porque as pessoas ficam sem água, sem saneamento, sem dinheiro, sem educação, sem saúde e com todos os vícios, e os piores vícios, que a nossa sociedade leva. É a isso que tem levado a estrada. Todas as estradas, desde o início das construções, desde a transamazônica”.