MANAUS – “Merenda é merenda, não é almoço. Eu não posso encher de proteínas e tal, e tal. Porque, se não o menino chega em casa e ele nem almoça”.
Estas foram as absurdas palavras de um vereador da liderança do Governo Municipal, semana passada, que traz uma reflexão sobre o direito dos estudantes de terem alimentação de qualidade e quantidade adequada na rede de educação pública.
A alimentação é um direito humano reconhecido pela Organização das Nações Unidas (ONU). A alimentação é um direito social incluído no artigo 6º, da Constituição Federal (CF/88). O Artigo 208 da CF é observado a disposição do direito à alimentação para os estudantes.
A Lei 11.947/2009 determina que alimentação escolar é direito dos alunos da educação básica pública e dever do Estado. E cria o Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar) e o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) onde a União (Governo Federal) transfere recursos financeiros aos Estados e municípios para providenciar a alimentação para os estudantes. O repasse dos valores é calculado conforme o número de alunos matriculados todo ano.
O PNAE atende cerca de 41 milhões de estudantes, com repasse anual de R$ 4 bilhões aos 27 estados, Distrito Federal e 5.570 municípios, complementado com orçamento dos estados e municípios.
Mas, segundo a lei, o cardápio tem que ter o “emprego de alimentação saudável e adequada, com valor alimentar e nutricional e variedade de produtos”. Por isso, não se entende por que a Prefeitura de Manaus ainda oferece alimentação escolar com baixa qualidade com bolacha e suco, apesar de repasse de mais de R$ 37,7 milhões nos últimos 12 meses.
A legislação federal também exige que seja adquirido no mínimo 30% da alimentação escolar da agricultura familiar, com alimentos mais saudáveis e de qualidade. Pelo visto, não está sendo respeitada.
O Ministério Público Federal, em 2023, já tinha notificado o Governo do Amazonas para que troca de alimentos enlatados por produtos naturais. Esta regra vale para os municípios. No segundo semestre de 2023, foram repassados cerca de R$ 65 milhões pelo Governo Federal destinados à alimentação escolar em escolas públicas estaduais.
Muitas são as denúncias em relação à baixa qualidade e insuficiência de alimentação nas escolas. As palavras do vereador mostram a total insensibilidade com a situação de milhares de estudantes, de famílias pobres, que dependem da alimentação na escola. Não basta a chamada merenda, precisa ser uma refeição com variedade de ítens, uma refeição completa e nutritiva, com proteínas e frutas e verduras, além dos tradicionais feijão, arroz, macarrão e farinha.
Está na hora de garantir que cada escola tenha também nutricionista e profissionais de psicologia e serviço social, conforme o artigo 200, parágrafo 11, da Constituição Estadual aprovada pela Emenda Constitucional 104, de 13/12/2018, de autoria dos então deputados Zé Ricardo e Luiz Castro.
Os vereadores e o prefeito precisam entender que, para muitos destes estudantes, é na escola que se faz a única ou principal refeição do dia. E que a alimentação é um direito, que deve ser respeitado.
José Ricardo Wendling é formado em Economia e em Direito. Pós-graduado em Gerência Financeira Empresarial e em Metodologia de Ensino Superior. Atuou como consultor econômico e professor universitário. Foi vereador de Manaus (2005 a 2010), deputado estadual (2011 a 2018) e deputado federal (2019 a 2022). Atualmente está concluindo mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas, pela escola Latina-Americana de Ciências Sociais.
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