
Por Iolanda Ventura, do ATUAL
MANAUS – As manifestações de eleitores do presidente Jair Bolsonaro (PL) pedindo intervenção militar após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições 2022 são uma demonstração de como o autoritarismo pode ser prejudicial. É o que afirma o cientista social Leonardo Rossatto Queiroz, especialista em Políticas Públicas no governo do Estado de São Paulo.
“Essas manifestações têm encontrado grande rejeição entre o público em geral, que tem tido o seu cotidiano atrapalhado pelo bloqueio nas estradas e tem se assustado com a indisposição dos bolsonaristas em ceder o poder após a derrota nas eleições. É uma demonstração na prática de como o autoritarismo pode ser prejudicial”, afirmou.
O estudo “Violência e democracia: panorama brasileiro pré-eleições de 2022” mede a tendência a apoiar o autoritarismo no Brasil.
A avaliação, da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostra que o Índice de Propensão ao Apoio a Posições Autoritárias no país é de 7,29, em escala que varia de 0 a 10. A pontuação é inferior à média de 8,1 encontrada em 2017.
“No entanto, apesar da sua diminuição, este índice ainda representa um grau forte de apoio a posições autoritárias”, afirmam as entidades no estudo.
O estudo mediu o índice usando a Escala Fascismo, conhecida como Escala F. Foram 2,1 mil entrevistados, com 16 anos ou mais, em cerca de 130 municípios em agosto deste ano.
A escala mapeia a personalidade autoritária em três dimensões e tira uma média dos itens: convencionalismo (a adesão aos valores tradicionais e convenções da sociedade), submissão à autoridade (aceitação incondicional a uma liderança reconhecida como legítima) e agressividade autoritária (predisposição à hostilidade a minorias).

Leonardo Rossatto afirma que embora a propensão a apoiar posições autoritárias continue alta, é bom que tenha reduzido. Também considera uma boa notícia o resultado do índice de propensão à democracia ter sido positivo, atingindo 7,25 pontos.
“É bom ressaltar que estamos diante de um governo que fomenta posições autoritárias, e a diminuição da propensão ao autoritarismo tem a ver, dentre outros fatores, com a rejeição desse governo”, disse.
Rejeição ao governo
O especialista explica que essa manutenção dos índices em níveis altos é comum quando há rejeição à política institucional.
“Tivemos, desde 2013 [governo Dilma Rousseff], uma escalada de rejeição à política institucional. Esse sentimento de desilusão com a política contribui para mudanças democráticas, mas em um segundo momento (à partir de 2015-2016, especialmente), também contribuiu para uma maior leniência com soluções de base autoritária. O que vemos, no momento, é o arrefecimento gradual desse movimento, expresso na derrota eleitoral de Jair Bolsonaro”, pontuou.
O cientista social avalia que esse movimento de rejeição ao autoritarismo deve se consolidar nos próximos meses, com a saída de Bolsonaro do poder.
“O discurso autoritário de Bolsonaro é um alimento constante para a percepção positiva ao autoritarismo, e a perda de poder desse discurso deve fazer com que a preferência pelo autoritarismo diminua, ao menos até o próximo período eleitoral”, disse.
Medo da violência X Apoio ao autoritarismo

Quando observada a relação entre o receio de sofrer alguma violência e autoritarismo, a pesquisa mostra que a tendência a apoiar posições autoritárias é maior entre os que têm muito medo. O estudo calcula o Índice de Medo da Violência, que vai de 0 (não ter medo de sofrer nenhum tipo de violência) a 1 (ter medo de sofrer todos os tipos de violência).
As perguntas foram se os entrevistados tinham receio de se envolver em brigas, morrer assassinado, sequestro, estupro, perder dinheiro pelo celular, ter o celular roubado, ser vítima de violência pela polícia, ser vítima de grupos armados, agressão física pela escolha política ou partidária, entre outras.
Foi observada na amostra um índice médio de medo de sofrer violência de 0,76, considerado pela pesquisa um patamar moderado. A pontuação em 2022 apresentou aumento em relação a 2017, que foi de 0,68.
Combate ao autoritarismo
Rossatto afirma que a propensão ao autoritarismo deve ir diminuindo aos poucos, à medida em que a democracia é fortalecida, e defende a criação de mecanismos legais para evitar a proliferação e a popularização de discursos de ódio.
“Isso passa pelo fortalecimento das instituições, pela melhoria dos serviços públicos e pela retomada de uma trajetória consistente de crescimento da economia, uma vez que movimentos autoritários costumam proliferar em momentos de crise econômica (e foi exatamente isso o que ocorreu no Brasil)”, pontuou.