Não há como separar as contas da campanha de Dilma Rousseff e Michel Temer, como pretendem os advogados do presidente. Desde o registro, a chapa que disputou e foi vitoriosa nas eleições de 2014 sempre foi única. Mais ainda, votou-se em Dilma e, em decorrência, em Temer, sendo impossível dissociar o sufrágio. No regime constitucional de 1946, tinha-se a possibilidade de votar separadamente no presidente e no vice, como ocorreu com a eleição de Jânio Quadros e João Goulart, integrantes de partidos e coligações políticas diferentes, a UDN e o PTB.
Resulta evidente que as doações feitas à campanha de Dilma, legais ou ilegais, pelo caixa 1 ou 2, beneficiaram também a eleição de Temer, em igual intensidade e proporção. Portanto, qualquer vício ou ilegalidade terá que necessariamente contaminar a chapa inteira, sendo irrelevante os demais aspectos. Se os recursos que abasteceram e azeitaram a eleição de Dilma tiveram origem em escândalos de corrupção na Petrobras e em outros procedimentos criminosos, a cassação deve ser imposta à cabeça e à sua extensão, sem a menor distinção. Foi com esse propósito que foi ajuizada ação de impugnação de mandato eletivo pelo PSDB, exatamente nos seus precisos termos, contra ambos os eleitos, por abuso de poder econômico e político, além de outras fraudes.
Tenha-se de igual modo em consideração que é nesse sentido que caminha a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, que não vê como apartar as situações, em pronunciamentos consubstanciados em julgamentos reiterados e em obediência a princípios de coerência lógica. Os graves embaraços decorrem da lerdeza e do tempo que a Justiça leva para julgar ações dessa natureza, com decisões que chegam tarde demais, quase sempre em final de mandato do impugnado, gerando incertezas e dificuldades operacionais e funcionais de toda ordem.
No caso de Michel Temer, restando-lhe prazo curto para o exercício do mandato presidencial e com o país na dependência de um plano de recuperação da economia, mergulhada na falência pela administração desastrosa de Dilma Rousseff, o quadro torna-se ainda mais intrincado. Como observou o confuso e polêmico presidente do TSE, Gilmar Mendes, amigo estreito e conselheiro de Temer, os julgadores não são juízes em Marte. Ficam, por conseguinte, sujeitos a todas pressões e circunstâncias que envolvem o processo de castração do atual gestor da República, segundo sinalização feita pelo ministro sem o menor constrangimento. Abriu-se a porta para os advogados do presidente, que logo fizeram coro com as declarações de Mendes, ao sustentarem que o tribunal deve considerar os impactos sobre a economia ao julgar o caso, em homenagem à estabilidade econômica, que ainda nem sequer foi conquistada.
‘Permissa maxima venia’, em linguagem do agrado dos leguleios, ainda que brasileiros, assentados em cátedras judiciais tupiniquins, os juízes não devem e não podem fazer vista grossa a ilícitos de tamanha gravidade. É inadmissível deixar sem punição quem se aproveitou de crimes praticados em assaltos de milhões e milhões de reais contra o erário, capitulados pela legislação eleitoral, tenha a consequência que tiver, aqui ou em galáxias as mais distantes.
Deixar a situação passar em brancas nuvens, a título de preservar interesses, mesmo que consideráveis, não seria nem um pouco edificante. É o velho problema do Brasil. Legislação é que não falta, em todas as direções e para todos os gostos, uma enxurrada de leis, com muita frequência descumpridas, via condutas que estimulam a delinquência e consagram a impunidade.
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