
Do Estadão Conteúdo
BRASÍLIA – O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou que o projeto de lei que amplia a isenção do Imposto de Renda (IR) é “neutro” e não vai gerar aumento de carga tributária. As declarações ocorreram nesta terça-feira (18) em cerimônia no Palácio do Planalto para o envio da proposta ao Congresso Nacional.
O texto isenta de cobrança do Imposto de Renda as pessoas que têm renda mensal de até R$ 5 mil.
“Este é um projeto neutro. Este projeto não vai aumentar um centavo na carga tributária da União”, afirmou. “O que nós estamos fazendo é apenas uma reparação. Nós estamos falando que 141 mil brasileiros que ganham acima de R$ 600 mil, acima de R$ 1 milhão por ano, vão contribuir para que 10 milhões de pessoas não paguem Imposto de Renda”.
O presidente acrescentou: “É simples assim. É como se fosse dar um presente para uma criança. Não vai machucar ninguém, não vai deixar ninguém pobre”. Segundo o petista, o projeto “vai permitir que o pobre possa comer um pouco de carne, seja músculo, seja filé mignon, seja alcatra, seja contra filé, seja um fígado”.
Lula prosseguiu com o apelo aos mais ricos. “Estamos pedindo aos brasileiros que ganham mais, pessoas que vivem de dividendos e nunca pagaram Imposto de Renda, pessoas que ganham milhões e milhões e muitas vezes encontram um jeito de não pagar Imposto de Renda, nós estamos dizendo para eles: gente, vamos elevar o patamar de vida do povo”.
Ele afirmou ainda que o projeto é uma sinalização em favor da política. “Vamos dar uma chance para aqueles que não acreditam na política voltarem a acreditar, porque a política, com esse gesto, dá um grande sinal para a sociedade brasileira de que vale mais a pena ser democrático do que ser negacionista”, disse.
Lula também afirmou que o Congresso Nacional “tem direito de fazer as mudanças que entender necessárias”, mas pediu que não sejam mudanças para pior. “Eu espero que, se for para mudar para melhor, ótimo. Para piorar, jamais”, declarou.
O presidente também defendeu os gastos sociais com os mais pobres: “Às vezes, um pouquinho só para o pobre, como eles são muitos, dá um volume muito grande. E muitas vezes as coisas não se fazem, porque se utiliza muito a palavra gasto, e o pobre fica fora”.
Na solenidade, também se pronunciaram o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann.
A avaliação de integrantes do governo é de que o PL deve ser aprovado, mas que parlamentares usarão o tema como uma espécie de “moeda de troca” para fazer pleitos, a exemplo da reforma ministerial que Lula deve intensificar nas próximas semanas.
No Congresso, a previsão entre deputados é de que o caminho vai ser longo. O problema não é proporcionar a isenção em si, afinal, até os parlamentares da oposição dizem ser favoráveis à redução de impostos. A questão está na compensação. O próprio presidente da Câmara já deixou claro em entrevistas que não há clima para a elevação de tributações sobre quem quer que seja. A bancada do PL, de maior número de deputados, já avisou que, se a compensação vier em forma de taxação dos mais ricos, serão contrários.
O projeto não irá promover uma revisão geral da tabela do IR. Pelo projeto formalizado no evento, os trabalhadores que ganham menos de R$ 5 mil estarão isentos do IR. Atualmente, só deixam de pagar o imposto as pessoas que ganham menos de R$ 2.824, pouco menos de dois salários mínimos.
Isso significa que, com o projeto apresentado, apenas os trabalhadores que ganham menos de R$ 5 mil vão ter direito à isenção – e não que todos os rendimentos abaixo de R$ 5 mil estarão isentos para todos os trabalhadores. Ou seja: se uma pessoa recebe R$ 8 mil, ela não terá isenção sobre os R$ 5 mil. Na prática, a mudança representa um impacto fiscal menor do que a revisão geral da tabela do IR teria.
Também haverá um bloco de “transição” para trabalhadores que ganham até R$ 7 mil. O modelo deve ser debatido pelos parlamentares, que serão informados que o objetivo do Executivo é o de não criar distorções entre os que têm rendimentos próximos a quem estará na faixa beneficiada.
No projeto, será descrito como deve ser feita a compensação dessa redução de arrecadação pela Receita. Uma parte virá da tributação maior para quem recebe até R$ 600 mil ao ano e outra de cobrança de imposto fixo de 10% para quem tem rendimentos a partir de R$ 1 milhão por ano, com taxação de dividendos.
Na segunda-feira, Haddad adiantou que a estimativa de renúncia com o projeto ficará em torno de R$ 27 bilhões. O número é fruto de um recálculo, que considera o aumento do salário mínimo.
O ministro também já havia mencionado que, a pedido de Lula, a equipe econômica havia retirado da proposta o fim da isenção do IR para quem tem doença grave em faixas de renda mais altas, hoje garantida a aposentados por moléstia grave ou acidente. Ele também já tinha mencionado que o projeto consideraria o CNPJ, sem detalhar a medida.
(Reportagem: Sofia Aguiar, Fernanda Trisotto, Victor Ohana e Giordanna Neves)