Por Gustavo Uribe, da Folhapress
BRASÍLIA-DF – O presidente Jair Bolsonaro defendeu nessa quinta-feira, 23, que as comunidades indígenas se integrem ao restante da sociedade e avaliou que, cada vez mais, o índio está “evoluindo” e se tornando um “ser humano igual a nós”.
Em vídeo, divulgado nessa quinta, o presidente destacou que o Conselho da Amazônia, estrutura criada no início da semana e que será comandada pelo vice-presidente Hamilton Mourão, será responsável pela coordenação das atividades de proteção da floresta e também de defesa das reservas indígenas.
“Com toda a certeza, o índio mudou. Está evoluindo. Cada vez mais o índio é um ser humano igual a nós. Então, fazer com que o índio cada vez mais se integre à sociedade e seja realmente dono da sua terra indígena. É isso que nós queremos aqui”, disse.
Em dezembro, o presidente já havia pregado que, na proposta de liberação da mineração em terras indígenas, fosse regulamentada a atividade de pecuária e agricultura. Ele defendeu a autorização para que comunidades indígenas possam arrendar suas terras para a agricultura e pecuária, o que hoje não é permitido.
Em tese, a legislação permite ao indígena usufruir da terra para a sua sobrevivência. Há casos em todo o país de índios que plantam produtos agropecuários e comercializam para gerar renda para a sua comunidade. A ideia inicial era que a proposta fosse enviada pelo presidente ao Poder Legislativo em setembro, mas acabou sendo adiada para este ano, ainda sem uma data definida.
O avanço das áreas de pecuária e de agricultura no Centro-Oeste e no Norte contribuem com o desmatamento na floresta amazônica, que teve uma alta no ano passado.
Ainda nos primeiros nove meses da atual gestão, o número de invasões a terras indígenas no país explodiu, segundo dados divulgados pelo Cimi (Conselho Indigenista Missionário), vinculado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).
Em 2018, foram registrados 111 casos do tipo em 76 terras indígenas. Somente de janeiro a setembro de 2019, o número pulou para 160 invasões em 153 terras indígenas.
Reação indígena
A Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) vai entrar na Justiça contra o presidente Jair Bolsonaro por crime de racismo. O anúncio foi feito na noite desta quinta-feira (23) pela líder indígena Sônia Guajajara, coordenadora executiva da organização.
“Nós, povos indígenas originários desta terra, exigimos respeito. Bolsonaro mais uma vez rasga a Constituição ao negar nossa existência enquanto seres humanos”, disse Sônia. “É preciso dar um basta a esse perverso”, completou.
Sônia Guajajara foi uma das lideranças indígenas reunidas pelo cacique Raoni na semana passada em encontro no Mato Grosso que condenou as políticas de governo de Bolsonaro para os indígenas e rechaçou projeto de lei que permite mineração em terras protegidas. Durante cinco dias, 600 indígenas de 45 etnias defenderam a união do movimento indígena contra o governo.
A manifestação do presidente no vídeo provocou outras reações, como a do deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ). Para ele, a fala do presidente é típica de um nazista.
O racismo de Bolsonaro foi criticado também pelo senador Fabiano Comparato (Rede-ES), que considerou o comentário inaceitável. “Estimula a invasão de terras. O que mais falta ele falar ou fazer? Temos de rejeitar, veementemente, essas agressões”, reagiu. O senador disse ainda que o presidente tem obrigação de oferecer a proteção do Estado aos indígenas.
Para a deputada federal Erika Kokay (PT-DF), a visão que o presidente tem dos indígenas é colonialista e medieval. “Esse conceito atrasado é o que justifica o genocídio e o epistemicídio indígena”, disse.
Outro parlamentar que reagiu foi Túlio Gadelha (PDT-PE). Para ele, racismo não é apenas crime e sim “o analfabetismo da alma”.