Por Rosiene Carvalho, especial para o AMAZONAS AUTAL
MANAUS – Há menos de um mês do final do prazo de filiação aos possíveis candidatos das Eleições 2016 e sem partido definido, o ex-deputado estadual Marcelo Ramos acusa o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), e o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB), de agirem nos bastidores para impedir que o nome dele esteja nas urnas no ano que vem. “Há claramente um esforço do prefeito e do senador Eduardo Braga para que eu efetivamente não tenha partido. Ou que pelo menos não tenha um partido viável”, afirma.
Em entrevista ao AMAZONAS ATUAL, Marcelo Ramos estilhaça as vidraças do prefeito de Manaus, acusando a gestão dele de ineficiente e pautada por publicidade da imagem do ex-senador, que nega os problemas da cidade. Afirma ainda que os arroubos do prefeito só trouxeram prejuízos a Manaus. “A cidade está dizimada nos bairros da periferia. Usa a Dilma de bengala (…) Para onde o vento bate e tem alguém para tirar uma foto, ele (Artur Neto) vai”, avalia.
Quase um ano após a disputa eleitoral que lhe rendeu 174 mil votos em Manaus – um desempenho histórico de candidaturas alternativas, responsável por levar a disputa ao governo pela primeira vez ao segundo turno no Amazonas – Marcelo Ramos está isolado. Rede e PSB, que ampararam sua candidatura no ano passado, estão distantes das articulações políticas necessárias à nova disputa. Rede porque não deve se viabilizar a tempo e oferece resistências internas ao nome de Ramos. PSB por erros políticos que o próprio Marcelo assume ter cometido.
Mesmo diante deste cenário, o ex-deputado afirma que está tranquilo e que até final do mês deve anunciar filiação a um partido, mas já abriu mão de parâmetros importantes a uma candidatura como tempo de TV. Nos trechos da entrevista abaixo, Marcelo evita confrontos e avaliações do governo Melo, mas nega qualquer submissão a tentativas de cooptação pelo grupo do governador. Disse que a única coisa que não pode transigir é de seu histórico de oposição e militância ao grupo que se reveza no poder. “Não vou fazer atalhos”.
AMAZONAS ATUAL – Como o senhor está? Como se sustenta sem o mandato?
MARCELO RAMOS – Mantenho o meu blog, estou ativo politicamente, conversando, articulando. No campo profissional, faço consultoria jurídica e legislativa. Dou aula de Direito Constitucional em cursinho e na Unip. Fora isso, cuido da família. Faz muito bem. Todo político deveria ficar sem mandato, sem ninguém para pagar a gasolina, sem assessor para tudo que ele precisa fazer. Precisa ter uma vida como um cidadão. Uma das coisas que os políticos no Brasil precisam dar é sinais de austeridade para a população.
ATUAL – Os representantes das instituições estão vindo a público dizer que estão fazendo o dever de casa, mas em meio a isso há notícias de desperdícios.
RAMOS – Nesse momento de crise, a política está dizendo para a sociedade: aperta o cinto que as coisas estão difíceis. Aí quando aperta o cinto na ALE-AM (Assembleia Legislativa do Estado), desliga-se o elevador e o expediente se encerra às 14h. E coisas supérfluas não são cortadas.
ATUAL – O senhor considera o presidente da ALE-AM um mau gestor?
RAMOS – Não vou julgar o presidente da ALE-AM. Mas vou dizer o fundamento da minha crítica. A ALE tem mais recursos do que precisa. Não tem cabimento ter uma piscina aquecida, quadra, academia. O parlamento não é para isso. A ALE tem um orçamento que é mais que o dobro da Defensoria Pública e, com 24 deputados e sede apenas em Manaus, tem quase o mesmo orçamento do Ministério Público, que está em 61 municípios. Tem gente com recurso demais em detrimento de gente que está com recurso de menos. A ALE e o TCE são exemplos disso.
ATUAL – O senhor considera que os deputados da atual legislatura estão exercendo um bom mandato?
RAMOS – As pessoas são diferentes e tem produções diferentes. O Serafim (Corrêa-PSB) tem um excelente mandato. Diferente do meu estilo, mas mais eficiente nessa pauta da Zona Franca. Eu era muito mais combativo.
ATUAL – O candidato que o senhor votou está no parlamento?
RAMOS – Não. Eu votei no João Victor, que era meu advogado.
ATUAL – O senhor é o único candidato da eleição passada que claramente se mantém no palanque. É uma estratégia para manter a fidelidade do eleitorado?
RAMOS – Eu voltei a ser o que eu era antes. Tenho histórico de militante. Depois da eleição de 2014, o que eu falo repercute um pouco mais que antes. Isso não me envaidece.
ATUAL – Não me refiro à sua vaidade. Nada nesse contexto está livre de lhe trazer efeitos políticos positivos ou negativos. Acha que assim vai manter os votos? Avalia efeitos negativos?
RAMOS – Primeiro, eu não sou candidato. Sou um militante político que opina sobre as questões da cidade. Mas se alguém me perguntar se eu vou ser candidato em 2016, é natural que alguém que teve 174 mil votos em Manaus seja candidato. Mas não sou dono dos votos. Eu era uma alternativa que as pessoas enxergaram. Vou apresentar o que penso e as pessoas vão me avaliar, como me avaliaram em 2014.
ATUAL – Durante a campanha de 2014 circulou a informação de que o ex-governador Omar Aziz (PSD) era um entusiasta da sua candidatura. O senhor foi abordado pelo grupo durante o pleito, considerando que a sua participação no primeiro turno ajudou a levar a disputa para o segundo turno?
RAMOS – Vou ser pontual. Primeira coisa: ninguém fez tanta oposição ao governo do Omar quanto eu. Segunda coisa: se existiu alguém entusiasta da minha campanha foram os militantes da Rede, Marina, Eduardo Campos e Serafim, que, num gesto de grandeza, abriu mão do projeto de ser deputado federal para que nós déssemos uma alternativa ao povo do Amazonas. Pau que dá em Chico também dá em Francisco. Lembro que durante a eleição, o Melo me perguntou, no último debate, o que eu faria sobre pedofilia. E eu disse: uma das coisas que eu não faria é o que você faz, que é andar ao lado de gente como Adail Pinheiro… É óbvio que no segundo turno eu tive diálogo e manifestei meu voto ao Melo pelos motivos que falei lá atrás. Agora, não tenho nenhum vínculo político com eles.
ATUAL – Como o senhor avalia esses primeiros meses do governo Melo?
RAMOS – Eles estão pagando uma conta que eles mesmos fizeram, acumulada do governo Eduardo e Omar. Aí junta esse déficit com a crise econômica tremenda, em que cai a arrecadação. Isso inviabiliza qualquer governo. O governo está num exercício de fazer um esforço fiscal, de reduzir gastos. Mas eu não posso elogiar porque quem cometeu a irresponsabilidade foram eles mesmos.
ATUAL – O senhor citou o deputado estadual Serafim Corrêa como colaborador da construção dessa sua caminhada política. Acha que ele o considera um ingrato?
RAMOS – Se pegarmos minha história com Serafim verificamos que há momentos de solidariedade de ambos os lados. Depois da eleição, tivemos uma diminuição no diálogo.
ATUAL – Durante a campanha, o material de eleição e agendas de vocês eram diferentes.
RAMOS – Isso foi do dia a dia da eleição. Eu nutro pelo PSB um sentimento de gratidão. Foi o partido que me acolheu. Foi quem mais me ajudou no meu mandato. Durante a eleição tivemos problemas, depois da eleição julgo que eu cometi erros de avaliação.
ATUAL – Quais?
RAMOS – Considerar que o PSB estava alinhado com a prefeitura. E tem dado reiteradas demonstrações que não está e que mantém sua posição de independência. Então, eu cometi alguns erros. Paciência. No calor da luta política você erra. Mas eu mantinha uma relação pessoal com o Serafim. Ele era meu amigo. Espero, muito menos politicamente e mais pessoalmente, que a minha caminhada se reencontre com Serafim.
ATUAL – Isso favorece o grupo que se reveza no poder?
RAMOS – Claro. A quem interessa que nós estejamos momentaneamente separados? A quem não quer uma nova alternativa na política. Os políticos mais jovens são muito apressados. Sempre preferem o atalho à dura caminhada. Surge e é cooptado pelo projeto dos caras. Nós precisamos insistir na dura caminhada. Tomara que a gente tenha capacidade de conversar e se reencontrar. Atalhos não me interessam. Eu vou seguir procurando fazer a dura caminhada.
ATUAL – O senhor não pretende “hissalizar” como definiu Henrique Oliveira?
RAMOS – O que é hissalizar?
ATUAL – Quando o AMAZONAS ATUAL entrevistou o vice-governador, ele conceituou algumas condutas que o deputado Hissa assumiu no passado como o verbo “hissalizar”.
RAMOS – Eu não quero julgar as decisões que o Hissa e o Henrique tomaram. Não quero fulanizar o debate. Acho que todo mundo tem sua contribuição. As pessoas entendem mal às vezes quando digo “Essa turma dos mesmos de sempre”. Eles deram a sua contribuição, mas não são para esse tempo. Há um descompasso de uma sociedade com a complexidade do século 21, economia, e um poder público que parou com a cabeça no século 20 e os pés no 19. Olha, o tempo de reclamar que não tem dinheiro para tudo, já passou. O cara quando é candidato sabe que não tem dinheiro. Nem síndico de prédio tem essa desculpa.
ATUAL – O senhor se refere ao prefeito Arthur Virgílio Neto?
RAMOS – A Prefeitura de Manaus precisa ser indutora de negócios e hoje atrapalha. O município não consegue se afastar da burocracia. O atual prefeito, que foi prefeito em 1988, governa com a mesma cabeça e métodos que usava em 1988. Isso não tem como dar certo!
ATUAL – O senhor acha que ele pensa que a cidade tem o mesmo tamanho de 1988?
RAMOS – É isso. Aí é muita ineficiência. Se não tem eficiência, o dinheiro que já é pouco, não dá mesmo.
ATUAL – Como o senhor define a gestão Arthur?
RAMOS – A gestão do prefeito Arthur tem muita política, muita propaganda e pouca gestão. Se tem pouca gestão, é ineficiente e ruim para a população. Na ausência de serviços de qualidade, entra a firula, o jogo de cena, a propaganda, o misancene.
ATUAL – Quais os principais gargalos da cidade, do seu ponto de vista?
RAMOS – Não tem obra. Mas isso é o que menos preocupa. Se não tivesse obra e ao final de quatro anos tivesse melhorado os índices de educação e saúde. Não tem isso também. Ele foi incapaz de executar as creches que estavam licitadas e com dinheiro na conta. Quer prova maior de ineficiência que essa? A cidade está dizimada nos bairros da periferia. Ele cuida do Centro como se a cidade fosse só o Centro. Não que não deva ser cuidado, mas não é só isso. Na mobilidade não tem dinheiro, mas também não tem plano nenhum. Não sabe o que fazer porque não tem qualidade na gestão. A vida das pessoas não se resolve na política, na propaganda da TV, com a presença em eventos.
ATUAL – O senhor acha que o prefeito vai conseguir convencer as pessoas que votaram nele na eleição passada que tudo que deixou de fazer é culpa do governo federal?
RAMOS – Me parece que a Dilma virou uma bengala para o prefeito. Criticar a Dilma é a forma de ele se vitimizar. Só tem uma forma de combater ineficiência e corrupção: transparência, controle social e governo de metas. Um governo que sabe o que quer não será um governo que gasta mal e faz o que o prefeito Arthur fez. Aumentou a quantidade de alimento nas escolas, não aguentou financeiramente e tirou. Isso é fruto de um governo que age por impulso. Maquiavel na introdução de “O Príncipe”, fala do príncipe virtuoso e o contrário do virtuoso é o príncipe levado pelo vento. A prefeitura de Manaus é como um barco sem quilha. Para onde o vento bate e tem alguém para tirar uma foto, ele (Arthur) vai.
ATUAL – O prefeito não teve a capacidade de diálogo maior que a de brigar com o governo federal?
RAMOS – Exatamente. E de entender que o prefeito exerce uma função institucional. Ele não é prefeito dele. Do dia que ele senta na cadeira em diante é prefeito de todos. De quem ele gosta e de quem ele não gosta. Esses arroubos comprometem a cidade de Manaus e o povo que não tem nada a ver com a briga dele com a presidente Dilma sofre as consequências.
ATUAL – Há duas semanas quando lhe abordei para a entrevista, o senhor disse que agora já teria o nome do partido que iria se filiar.
RAMOS – É, mas ainda não tenho.
ATUAL – Nesses últimos meses o senhor foi atrás de alguns, outros atrás do senhor. Por que nenhum namoro foi para frente?
RAMOS – Eu escolhi um caminho e não vou desviar dele.
ATUAL – O senhor foge da cooptação?
RAMOS – Um pouco. Vamos lá, o PDT tem o Amazonino. Conversei com o PR, conversa bacana e fraterna. Mas o PR é um partido ligado umbilicalmente ao deputado Alfredo Nascimento.
ATUAL – Conversou com o PV e Psol.
RAMOS – Sim. Com o Psol tenho diálogos frequentes.
ATUAL – De todos qual o senhor esteve mais próximo da filiação?
RAMOS – Com o PRB, que é um partido novo e tem 21 deputados federais. É um partido historicamente ligado ao Braga. Disse que queria construir alternativa e se colocou na mesa a possibilidade de alinhamento com o Braga agora ou no futuro, eu disse: “muito obrigado, vou seguir minha caminhada” (…). Se o preço de eu não encontrar um caminho seguro e independente for eu não ter partido, eu não vou ter partido. Para mim, isso não é um jogo a qualquer custo. Passei de um projeto de militância de 1993 para cá, então passei 22 anos para ascender ao poder e ser igual a quem eu combati por 22 anos? Qual a lógica disso? Isso não tem uma lógica..
ATUAL – Há partidos que embora as conversas sejam bonitas funcionam muito mais como ratoeira do que como um abrigo verdadeiro?
RAMOS – Há claramente um esforço do prefeito e do senador Eduardo Braga para que eu efetivamente não tenha partido. Ou que pelo menos não tenha um partido viável.
ATUAL – O senhor consegue ver isso com clareza?
RAMOS – Não tenho dúvidas.
ATUAL – Eles lhe chamaram para conversar?
RAMOS – Nenhum dos dois.
ATUAL – Consciente dessas manobras, o senhor está mesmo tranquilo a um mês do prazo de filiação que pode inviabilizar seu projeto político?
RAMOS – Absolutamente tranquilo. A vida é feita de riscos. Só tenho uma certeza e essa certeza que me dá tranquilidade: não vou embarcar num projeto que negue a minha trajetória. Não posso entrar num partido que tenha Amazonino, Arthur ou Eduardo. Marina (Silva), quando faltavam 24 horas para o final do prazo e a Rede não saiu, foi questionada do mesmo jeito porque só faltavam 24 horas e ela respondeu: “Ainda faltam 24 horas”. Se ela não se desesperou com 24 horas, não sou eu que vou me desesperar com um mês. A solução vai surgir.