Por Cleo Guimarães, da Folhapress
RIO DE JANEIRO – Ah, as toalhas… A onipresença da exigência de muitas delas –dezenas, centenas, felpudas, brancas, pretas, de rosto ou de banho– nos bastidores dos grandes shows intriga até Ingrid Berger, 66. Ela cuida dos pedidos dos músicos do Rock in Rio há 20 edições do festival no Brasil e no exterior e também já desistiu de tentar entender o motivo de tanto fascínio. “Mas a verdade é que todo mundo pede mesmo”, diz a produtora, que já começa a preparar o terreno para as atrações do próximo megaevento.
O Rock in Rio de 2022 acontece a partir do dia 2 de setembro e Ingrid já vem recebendo as listas com os pedidos -“riders”, no jargão de quem é do showbusiness. Mais uma vez as toalhas estão em todas. O Guns N’ Roses, por exemplo, pede 200, sendo 40 delas pretas, de rosto. Curioso sim, mas tranquilo. Fácil de arrumar.
Difícil mesmo será conseguir a Jelly Belly Fish, bala americana estilo jujuba em formato de peixinho que o rapper Post Malone quer porque quer.
“Nunca tinha ouvido falar nisso, tive que dar um Google”, admite Ingrid. Na pesquisa, descobriu que nem a versão mais simples está à venda no Brasil, muito menos a que ele especificou em seu pedido. “Ele exigia a embalagem que tem uns peixinhos compridos, com uma espécie de rabo”.
E agora? Agora ela vai fazer como faz há mais de 30 anos: enviar um “contra-rider” e sugerir a troca por outro item equivalente. No caso, a jujuba em forma de ursinho, moleza de encontrar. “Se ele não aceitar, não tem como. Aí, só se trouxer de fora”.
O pedido de Malone surpreendeu não só pela especificidade, mas também porque a balinha de paladar e apresentação infantil contrasta com os pedidos heterotop do rapper. Ele quer charutos cubanos, uma mesa de beer pong (um “esporte” que parece saído dos filmes de universitários americanos, em que o objetivo é acertar bolinhas de ping pong em copos de papel), e bebida alcoólica. O que ele vai beber e em que quantidade ainda será definido numa outra lista.
A necessidade de trocar o seis importado e inacessível pelo meia dúzia made in Brazil costuma acontecer com outra obsessão dos artistas: a água de origem vulcânica Fiji. Muito comum no exterior, ela não é encontrada por aqui e desta vez já foi pedida por algumas bandas, entre elas a dos músicos italianos Maneskin, que abre para o Guns N’Roses.
Em breve os roqueiros de Roma receberão a contraproposta de Ingrid, que também já foi avisada que um integrante do grupo é alérgico a kiwi (“Isso é novidade para mim”, admite). Já a rapper Megan Thee Stalion mandou avisar que seu entourage tem VÁRIOS vegetarianos e veganos -escrito assim mesmo, em maiúsculas.
Neste caso, além do cuidado com o que será servido para comer, é preciso atenção a detalhes da decoração. “Mesmo que não digam nada, evito peças em couro e aposto nos tecidos”, conta a fluminense de Nova Friburgo, que teve sua primeira experiência no showbizz em 1985, na edição de estreia do Free Jazz Festival, em São Paulo.
De lá para cá já trabalhou com praticamente todos os grandes astros da música mundial. Foi para ela, por exemplo, que Madonna pediu 400 toalhas (olha elas aí de novo), há alguns anos. Ingrid também precisou medir cada uma das 32 rosas que decoravam o camarim de Elton John: ele exigia que elas tivessem 11 centímetros de cabo. Nem mais, nem menos.
Pelo menos por enquanto as coisas melhoraram para o seu lado. “Ainda não recebi nenhum pedido esdrúxulo”, conta. Do Iron Maiden, cujos integrantes já conhece há décadas, veio mais uma vez a solicitação de um massagista e de um jantar sentado, ali na antessala do Palco Mundo, com rechauds, louças e talheres bacanudos. “Eles gostam de mesa bonita”, diz. Uma cesta de frutas e bananas, muitas bananas, também faz parte dos pedidos, assim como rosas vermelhas e brancas na decoração -o talo das flores, ufa, pode ser de qualquer tamanho.
O Coldplay traz seu próprio chef, o que não é incomum entre as atrações do Rock in Rio -tanto é que uma cozinha profissional foi montada nos bastidores, pertinho da lavanderia e da despensa, onde ficam os ingredientes pedidos pelos cozinheiros para botar em prática as receitas pedidas pelos artistas.
Alguns deles não têm estrelismo algum, garante Ingrid. Demi Lovato, por exemplo, é “super easy”, e deve ficar feliz da vida com um espelho de maquiagem caprichado, daqueles com luzinhas na moldura.
Rita Ora também é modesta em suas exigências, que não vão muito além de um roupão felpudo, pantufas e umas garrafas de vinho para relaxar.
Já o rider de Justin Bieber…. Esse dá uma certa ansiedade. A lista ainda não chegou, e a produtora prevê que vem chumbo grosso por aí. “Ele tem uma comitiva enorme e costuma pedir umas coisas meio diferentes”, afirma.
Diferente ou não, fato é que Bieber exigiu que ninguém lhe dirigisse a palavra enquanto estivesse na área dos camarins em um de seus últimos shows no Brasil. A ver como se comportará agora.