Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Apesar de ter assinado contrato com a Petrobras para comprar a Refinaria Isaac Sabba (Reman), em Manaus, em agosto deste ano, o Grupo Atem informou que não começou a operação na unidade porque ainda não se tornou real proprietário dela. Conforme a companhia, a expectativa é que o processo de transferência seja concluído até março de 2022.
O grupo empresarial está comprando a refinaria e seus ativos logísticos associados pelo valor de US$ 189,5 milhões (equivalente a R$ 994,15 milhões). A operação, no entanto, depende de aprovações regulatórias e aval do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), autarquia vinculada ao Ministério da Justiça.
De acordo com a companhia, até o fim deste ciclo a refinaria permanece sob controle da Petrobras. “Outros passos ainda devem ser observados antes de a Atem assumir o ativo. As partes ainda precisam atender a certas condições precedentes, nomeadamente as aprovações regulatórias e a aprovação da operação pelo Cade”, informou o Grupo Atem.
A manifestação da companhia ocorreu após a reportagem do ATUAL questioná-la se o refino de petróleo pode ter custos menores com a privatização da Reman e, com isso reduzir, preço dos combustíveis no estado. O grupo empresarial respondeu que a Petrobras continuará operando a refinaria por meio de um contrato de prestação de serviços por período transitório.
Em agosto deste ano, Miquéias Atem, acionista e um dos fundadores do Grupo Atem, afirmou que a venda da refinaria irá estimular a competição no setor. “A aquisição da refinaria permitirá aprimorar o suprimento de combustíveis e derivados de petróleo e gás para a região de influência da Refinaria”, disse.
Preços
O trabalho na refinaria compõe um longo processo de produção dos combustíveis até chegar na bomba. Depois de ser extraído em águas profundas, a até 7 mil metros de profundidade, o petróleo é enviado para as refinarias, onde passam por processos químicos e físicos. Depois, são vendidos para as distribuidoras, que revendem aos consumidores em postos de distribuição.
De acordo com a Petrobras, o preço da gasolina cobrado na bomba tem cinco componentes: a realização da Petrobras corresponde a R$ 2,12; a distribuição, revenda e etanol anidro, R$ 1,97; os impostos federais (CIDE e PIS/PASEP e COFINS), R$ 0,69; e o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) – imposto estadual, R$ 1,53.
Quando o Grupo Atem começar a operar a Reman, ficará responsável pelos processos químicos e físicos. Nessa fase, as moléculas pesadas são purificadas e quebradas em partes menores, dando origem a diversos produtos, como gasolina, óleo diesel e gás liquefeito de petróleo.
Resistência
A privatização da Reman, no entanto, sofre resistência de trabalhadores do setor de transporte de Manaus, como os taxistas e mototaxistas, e do ramo petrolífero. Em maio deste ano, três sindicatos que representam esses setores apresentaram uma ação civil pública na Justiça Federal do Amazonas para barrar a venda da refinaria.
Os sindicatos alegam que a privatização acarretaria sérios prejuízos ao mercado interno e à ordem econômica do Amazonas. Eles pedem a apresentação de um estudo sobre o impacto socioeconômico para a economia amazonense e a realização de uma audiência pública para exposição à população dos efeitos da venda da Reman.
Ainda de acordo com os sindicatos, a produção, o refino e o transporte de petróleo e derivados não podem ser tratados como simples negócios privados, pois o “eventual comprador da Reman terá que implantar toda uma nova estrutura de compra, transporte, comercialização e recursos humanos, entre outras atividades”.
Para os trabalhadores, a nova estrutura terá um custo que também será repassado para os consumidores. “Considerando a necessidade de negociação de acesso à infraestrutura associada à refinaria, pode haver elevação dos custos de movimentação de produtos no estado do Amazonas”, diz trecho da ação.
Os sindicatos sustentam ainda como um “risco” em relação à competitividade o fato de que o comprador é um distribuidor já dominante no mercado. “É provável que a venda da Reman fique limitada a troca de agente econômico, sem benefícios de aumento de competitividade na comercialização de óleo diesel e gasolina neste mercado”, completam os sindicatos.
A ação estava sendo analisada pelo juiz Diego Leonardo Andrade de Oliveira, da 9ª Vara Federal do Amazonas. Entretanto, em junho deste ano, o magistrado entendeu que o caso deveria ser julgado pela Justiça Federal do Rio de Janeiro e, por esse motivo, determinou o envio do processo para o estado fluminense, onde outra ação já estava tramitando desde 2019.
No dia 14 de setembro, o juiz Júlio Abranches Mansur, da 14ª Vara Federal do Rio de Janeiro, negou o pedido dos sindicatos para suspender o processo de venda da refinaria. O magistrado recorreu a os mesmos argumentos que usou para rejeitar, em agosto de 2020, pedido similar feito por outras entidades em relação à Refinaria Alberto Pasqualini, no Rio Grande do Sul.
Naquela ocasião, Mansur sustentou que a Constituição Federal e a Lei Federal nº 9.478/1997 estabelecem que a União poderá contratar empresas para a refinação do petróleo. Além disso, a Resolução nº 16/2010, da ANP, não prevê a necessidade de realização de qualquer consulta pública, bastando que a compradora preencha os requisitos previstos naquela resolução.
A reportagem questionou o Grupo Atem sobre a ação judicial manejada pelos sindicatos. A companhia disse que ofereceu o melhor preço dentro do “processo competitivo amplo e transparente, promovido pela Petrobras” e que a venda respeitou os “mais rigorosos parâmetros legais e melhores práticas do mercado”.
“O processo competitivo ocorreu dentro dos mais rigorosos parâmetros legais e melhores práticas de mercado, contando com a participação de múltiplos interessados, foi conduzido por renomados assessores jurídicos e financeiros e chancelado por diversos órgãos de controle internos e da Administração Pública”, informou o Grupo Atem.
A Petrobras disse que não se manifesta sobre processos judiciais em andamento.