Do ATUAL
MANAUS – O esquema de pirâmide financeira desmantelado pela Polícia Federal na Operação Fair Play em Manaus, Boa Vista (RR), Belém (PA) e Natal (RN), na manhã desta sexta-feira (14), envolvia a obtenção de empréstimo consignado de servidores públicos municipais, estaduais e federais. Só de servidores dos três níveis da gestão pública no Amazonas, o grupo movimentou R$ 25 milhões. Em um ano, nos quatro estados, foram R$ 156 milhões.
O golpe foi detalhado pelos delegados federais responsáveis pela investigação em entrevista coletiva nesta sexta. Foram expedidos sete mandados de prisão. Segundo o delegado Sávio Pinzon, três suspeitos foram presos em Manaus, um em Aracaju e três estão foragidos. Outros 19 mandados foram de busca e apreensão. Os nomes dos envolvidos e das empresas não foram revelados.
Modus operandi
O delegado Marcelo Uchoa, da Delegacia de Crimes Financeiros, disse que o grupo criou empresas financeiras fictícias para executar o esquema. A PF descobriu que as empresas não integravam a lista de instituições credenciadas no Banco Central. Também não apresentavam nenhum capital de investimento no negócio.
“O modus operandi consistia em aliciar servidores públicos como aposentados oferecendo rendimentos fixos sempre acima do mercado. O que mais atraiu as vítimas era que não precisava de capital próprio. Eles solicitavam que servidores fizessem empréstimo consignado, transferissem o dinheiro para as empresas do grupo, e a partir daí se comprometiam a fazer pagamento das parcelas [além do rendimento extra]”, explicou o delegado Eduardo Zózimo.
Segundo Zózimo, era firmado um contrato entre o servidor e a empresa, mas sem valor nenhum. Para dar caráter de legalidade, o contrato era registrado em cartório. O dinheiro ficava em posse dos golpistas por um ano.
No início, conforme o delegado, o grupo conseguia pagar as parcelas dos servidores, mas com a entrada de novas vítimas o compromisso se tornou inviável. “O consignado feito pelos servidores era uma forma de conseguir dinheiro legalizado”, disse Zózimo.
Marcelo Uchoa disse que havia bonificação ao servidor que angariasse novos funcionários públicos, ação típica da pirâmide financeira. “Eles iam a órgãos públicos e usavam redes sociais para aliciar os servidores”, disse.
Segundo o delegado, os envolvidos tentavam vincular a marca das empresas a artistas conhecidos e patrocinavam eventos em Manaus, bandas musicais e shows. “Era uma forma de se estabelecer no mercado como empresa que tinha credibilidade”, disse Uchoa.
Origem humilde
Eduardo Zózimo disse que há três anos nenhum dos sócios tinha empregos formais ou recebiam mais do que R$ 2 mil reais por mês. Em dois anos passaram a ter um patrimônio gigantesco. Os suspeitos tinham entre 24 e 26 anos.
Os sócios são de São Gonçalo (RJ) e tinham amizade desde a adolescência. Segundo o delegado, eles vieram para Manaus com a intenção de montar o esquema de pirâmide, que foi projetado apenas para aumentar o patrimônio dos sócios.
Influência social
No Amazonas, buscaram se aproximar de pessoas influentes como forma de ganhar notoriedade e confiança. “Eles criaram no mesmo dia e na mesma data quatro empresas para cada sócio como forma de lavar dinheiro”, disse Zózimo.
Grande volume do dinheiro desviado era utilizado para compra de bens e viagens internacionais pelos sócios do grupo. “Eles ostentavam nas redes sociais carros, festas e condomínios de luxo”, disse.
A investigação começou há um ano, em setembro de 2021. A PF não conseguiu identificar o número de vítimas, mas estima que foram 350 pessoas nos quatro estados. Todos os que foram presos tinham envolvimento direto no esquema, disse Uchoa.
O maior número de vítimas foram de servidores do Amazonas. “A gente conseguiu identificar que o maior fluxo era o Amazonas, inclusive unidades de Belém, Boa Vista tinham muitos clientes do Amazonas”, disse Zózimo.
Foram apreendidos três veículos de luxo. Nenhum dos carros está em nomes dos suspeitos, mas os delegados afirmaram ter provas de que pertencem aos integrantes do grupo. Também foi apreendida uma embarcação de luxo, avaliada em R$ 6 milhões, joias, duas armas de fogo e maconha.
A Justiça bloqueou bens imóveis e dinheiro de 27 investigados, divididos entre pessoas físicas e jurídicas.
Segundo o delegado Sávio Pinzon, para reaver o dinheiro perdido as vítimas terão que entrar com ação na Justiça.
(Colaboraram Iolanda Ventura e Murilo Rodrigues)