Do Estadão Conteúdo
SÃO PAULO – Aidan Della Monica, de 7 anos, mantém os olhos fixos na tela do tablet enquanto aprende um novo jogo. Com os dedos, controla os movimentos de um personagem animado e, então, escuta atentamente um diálogo em inglês no fone de ouvido. É preciso responder corretamente a uma série de perguntas sobre a conversa para marcar pontos, até ser premiado com itens que vão mobiliar a casa do seu avatar no mundo digital. Concentrado, ele completa a atividade da aula sem dificuldade.
A plataforma, que está há uma semana no ar, é a mais nova aposta da escola de idiomas onde Aidan estuda. De qualquer smartphone, tablet ou computador, os alunos podem acessar o jogo e cumprir desafios em vídeos, áudios e textos. O conteúdo é direcionado para cada turma, de acordo com as lições que são passadas em sala.
Para se adaptar a uma geração de alunos que cresce sob influência da cultura youtuber e dos jogos virtuais na internet, colégios e escolas especializadas mudaram a estratégia de ensino de inglês e usam cada vez mais a tecnologia como ferramenta de aprendizado. As novidades vão desde a publicação em canais de vídeo, criados e editados pelos próprios alunos, até aulas a distância com escolas no exterior.
“A gente não queria apenas pegar o conteúdo do livro e colocar em uma plataforma digital, e sim oferecer a oportunidade para eles praticarem pensamento crítico, formulação de hipóteses e resolução de problemas”, diz Júlia Abrão, coordenadora de programas educacionais digitais na escola de inglês Red Balloon, sobre o jogo.
Batizada de Digiworld, a plataforma está disponível em 130 unidades da rede no País, para alunos de até 17 anos. “Sentíamos essa necessidade de acompanhar nossos alunos, de ter algum tipo de interação digital com eles.”
Conferência
No Colégio Internacional Ítalo Brasileiro, em Moema, zona sul de São Paulo, com frequência as aulas de Língua Inglesa do 5.º ano do ensino fundamental contam com convidados do outro hemisfério. São alunos da Sherman Elementary School, de Nova York, nos Estados Unidos, que participam de atividades conjuntas por meio de videoconferências.
Os encontros virtuais ocorrem desde 2016, sempre com as mesmas turmas. Estudantes das duas escolas preparam perguntas que são respondidas pelos colegas do outro lado. As dúvidas têm como base apenas a curiosidade das crianças, de 10 a 11 anos, mas envolvem temas como Geografia, História, e aspectos da cultura local. Todos conversam em inglês. “O objetivo era fazer com que eles aprendessem inglês fora do papel, fora da sala de aula”, diz a professora Flavia Cotomacci.
Já na escola bilíngue Stance Dual, na Bela Vista, no centro, os alunos do 7.º ano do ensino fundamental aprendem a filmar e editar e publicam vídeos em inglês no canal da escola na internet. O projeto começou neste ano, em uma integração das disciplinas de Linguagem, Tecnologia e Estudos Sociais. Na turma não falta familiaridade com o YouTube.
“Tenho uma média de, pelo menos, um aluno por sala que tem seu próprio canal”, conta a coordenadora de Tecnologia Educacional da escola, Juliana Caetano. “É uma geração com muito acesso à internet, que é rica em coisas boas e ruins. O aluno está exposto a uma quantidade de informação que pode ser boa, profunda, segura e confiável ou o oposto disso.”
Vocabulário
A mudança no perfil dos alunos nos últimos anos fez com que o Colégio Ítaca, na zona oeste, atualizasse seus materiais didáticos para o ensino de inglês. A escola tem investido em ferramentas como exercícios online e até a identidade visual dos livros ficou mais “apelativa”, segundo a direção. A infinidade de referências, proporcionada pela internet, trouxe desafios para os professores.
“O vocabulário dos alunos é muito mais abrangente”, diz a coordenadora de Inglês da escola, Sônia Mange. “Um aluno pode ter esquecido, ou não saber, uma palavra muito corriqueira do cotidiano, mas, por causa dos games, saber outras palavras que o professor não imaginaria.”
Detalhes importantes:
1. Pedagogia – Nem todo o vídeo sobre ensino de inglês no YouTube é bom. “Alertamos nossos alunos para terem cuidado com conteúdos e com a didática de ensino”, explica o coordenador da área de inglês do Colégio Lourenço Castanho, Roberto Vicente.
2. Seleção – Escolas ajudam na curadoria dos conteúdos na internet. “O desafio é trazer o que está chamando atenção dos alunos, fazer uma análise e dizer prós e contras. Aí você cria um aluno crítico”, diz Juliana Caetano, da escola bilíngue Stance Dual.
3. Conversação – Interação continua sendo essencial para aprender uma nova língua. “O aprendizado fica mais natural quando o aluno conversa com o colega usando língua inglesa em um contexto cotidiano”, afirma a coordenadora do Colégio Ítaca, Sônia Mange.
Professor Hi-Tech
Dos aplicativos de celular à realidade virtual, o domínio da tecnologia deve ocupar espaço cada vez maior na formação de professores. Segundo especialistas e diretores de colégios, novas competências têm sido incorporadas à prática dos profissionais com rapidez e devem passar de diferenciais a exigências para quem ensina língua inglesa.
Entre as novas ferramentas estão apresentações interativas, formulários virtuais de avaliação e programas que permitem o uso do celular para exercícios de reconhecimento de voz. Exercícios que antes eram feitos com lápis e papel hoje podem ser aplicados a distância, com programas para smartphones.
“Sites ou aplicativos ficam na moda por um tempo e desaparecem quando chega outra coisa melhor”, diz Alberto Costa, coordenador da Cambridge English, que faz avaliação de proficiência em inglês e preparo de professores. “Quando se fala em desenvolver competências, isso significa realmente dar ao professor ferramentas para poder usar o que existe de maneira criativa e, ao mesmo tempo, com propósito pedagógico.”
Para o coordenador da área de Inglês do Colégio Lourenço Castanho, Roberto Vicente, os professores não devem apenas se adaptar às novidades tecnológicas que fazem sucesso entre os alunos, mas também apresentar novidades.
“É quase uma consequência inevitável que nós fiquemos atentos às tecnologias que fazem parte da vida dos alunos”, diz o coordenador. “Buscamos também nos apropriar de coisas que os alunos não conhecem para também apresentar a eles e mostrar caminhos interessantes, tentar estimular a criatividade.”
Treinamento
Especializada em certificados de proficiência, a Cambridge English mantém um site que reúne cursos gratuitos e um recurso de autoavaliação para professores, que mostra quais competências são mais deficientes. A instituição também promove encontros para treinar os profissionais.
“O professor precisa saber qual é o ponto de partida dele” diz Costa. “O primeiro passo é a autoavaliação.”