Do Estadão Conteúdo
BRASÍLIA – Em decisão na qual mandou prender temporariamente e suspender os benefícios da delação dos executivos da JBS Ricardo Saud e Joesley Batista, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, negou o encarceramento do ex-procurador Marcelo Miller. No entanto, o magistrado disse ver “consistentes indícios de exploração de prestígio” por parte do advogado.
Marcelo é o pivô da investigação que pode culminar com a rescisão da delação da JBS, embasada em áudio enviado pela defesa dos colaboradores em anexo complementar sobre o senador Ciro Nogueira (PP). Ele integrou a força-tarefa da Operação Lava Jato e atuou nas delações do ex-senador Delcídio do Amaral e do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.
Após deixar o Ministério Público Federal, ele passou a integrar o escritório de advocacia Trench, Rossi e Watanabe, e integrou o time de advogados que negociaram o acordo de leniência da J&F.
O ex-procurador ainda fazia parte do Ministério Público quando começou a conversar com os executivos, no final de fevereiro. Ele pediu exoneração da Procuradoria no mesmo mês, mas a deixou de fato apenas em abril.
No áudio dos delatores, alvo de investigação, ele é mencionado por Joesley como um procurador da República que estaria atuando em benefício do grupo.
“Não é que não tem. Nós vamos, eu já falei pro Francisco: tem que resolver isso, nós vamos ajeitar. Fernandinha, você vai ajeitar o Marcelo, que nós já estamos ajeitando. Nós vamos conhecer o Janot, nós vamos conhecer não sei quem, e quem precisa do quê?”, afirmou o empresário.
A respeito do procurador, Fachin pondera que “ainda que sejam consistentes os indícios de que pode ter praticado o delito de exploração de prestígio e até mesmo de obstrução às investigações, não há, por ora, elemento indiciário com a consistência necessária à decretação da prisão temporária, de que tenha, tal qual sustentado pelo Procurador-Geral da República, sido cooptado pela organização criminosa”.
“O crime do art. 288 do Código Penal (associação criminosa que substituiu o delito de quadrilha ou bando), para sua configuração, exige estabilidade e permanência, elementos que, por ora, diante do que trouxe a este pedido o MPF, não se mostram presentes, para o fim de qualificar o auxílio prestado pelo então Procurador da República Marcello Miller aos colaboradores como pertinência a organização criminosa”, decidiu.
Acusações fantasiosas
O advogado Marcello Miller divulgou comunicado neste domingo, 10, no qual diz repudiar “veementemente o conteúdo fantasioso e ofensivo das menções ao seu nome nas gravações divulgadas na imprensa”. Ele ainda afirma que “jamais fez jogo duplo ou agiu contra a lei”.
No texto divulgado pela sua assessoria de imprensa, Miller cita uma série de evidências de que não favoreceu os executivos da J&F. Ao fim, conclui que sempre acreditou na Justiça e nas instituições e que está à disposição para prestar esclarecimentos e auxiliar nas investigações. Entre os argumentos a seu favor, afirma que não tinha contato com Janot e atuação na Operação Lava Jato desde outubro de 2016. Ele afirma ainda que nunca atuou na Operação Greenfield, que investigou irregularidades envolvendo a J&F, nem na Procuradoria da República em Brasília.
“Enquanto procurador, nunca atuou em investigações ou processos relativos ao Grupo J&F, nem buscou dados ou informações nos bancos de dados do Ministério Público Federal sobre essas pessoas e empresas. Pediu exoneração em 23/2/2017, tendo essa informação circulado imediatamente no MPF (Ministério Público Federal). Nunca obstruiu investigações de qualquer espécie, nem alegou ou sugeriu poder influenciar qualquer membro do MPF”, traz a nota.