Por Cleber Oliveira, da Redação
MANAUS – Sem consenso e ‘divisor de águas’, o projeto de lei ‘Escola sem Partido’, que proíbe professores de falar sobre política em sala de aula, perdeu a força no debate público porque saiu da visão científica para se limitar às diferenças políticas ideológicas. “Então, a conversa se transforma em um impasse, em que dois polos defendem suas posições. Mas qual seria esse o cerne da questão, que é exatamente o que importa para desenvolver uma discussão saudável?”, indaga o rabino Samy Pinto, que é economista e especialista em educação pela Universidade Bar-llan, de Israel.
Conforme Samy Pinto, o primeiro passo é entender do que se trata o projeto Escola Sem Partido, firmado na figura do advogado Miguel Nagib. “A proposta defende uma educação neutra, sem a interferência da posição política do professor, da instituição e muito menos do governo. Essa linha de pensamento já gera um espanto, pois não existe uma escola sem partido, a proposta e o projeto são utópicos”, disse Pinto, que é doutor em Letras e Filosofia pela USP (Universidade de São Paulo).
Samy diz que, ao entrar em sala de aula, o docente carrega consigo uma carga de conteúdo que, forçosamente, levará o juízo de valor do educador e sua forma de ver o mundo, podendo ocorrer um exagero por parte daquele que está lecionando, mas que é inevitável deixar do lado de fora da escola. “Existe uma politização, ainda mais quando um grupo de pessoas se reúne. E esse fator deve ser levado em consideração no debate em questão”, diz.
O educador diz que o histórico da educação brasileira levou a reação que se vê nos últimos anos, em que uma parte da camada social brasileira não quer que a visão de mundo da esquerda seja apresentada aos seus filhos e deseja que eles aprendam a partir de uma perspectiva liberal. E este é um assunto que não entre nas conversas sobre a Escola Sem Partido. “Este é um ponto chave para se tratar. É tarefa do governo fazer isso, ou não? Qual o papel da escola no século XXI? Somente ensinar as habilidades e competências de escrita, oralidade, matemática, ou também cabe à escola trazer esses debates sobre política, sociologia, filosofia e religião?”, questiona.
Essas questões, conforme Samy Pinto, demandam um debate, um grupo de estudo, mais afinado, que leve em consideração a realidade das salas de aula, que reproduzem a própria formação do professor. “Apenas colocar cartazes com os deveres do profissional é preocupante, e acaba por trazer uma imagem de policiamento e desconfiança sobre os professores, causando um ambiente de desrespeito e de indisciplina em sala de aula. O que acentua a importância de uma visão cientifica, e não só política, na discussão que aborda a educação brasileira”, disse.
O que não se pode dizer é que a escola é neutra, afirma o professor. “Porque os professores têm sim um posicionamento, possuem uma opinião política e social. A missão do professor ela tem que estar clara na relação com seu coordenador, seu diretor, e na própria missão da escola”, esclarece.
Cabe ao governo, diz Pinto, dar autonomia para as escolas se posicionarem de acordo com o seu nicho comunitário ou sua ideologia. Seria uma ideia saudável para todos. “Deixando claro, para os pais, responsáveis e alunos, qual a linha de pensamento da escola, seja liberal, direita, esquerda, cristã, e assim possibilitar que se crie uma equipe que tenha harmonia com a devida visão. O Brasil precisa ficar mais maduro para esse debate. Respeitando as outras opiniões e buscando uma solução com bases cientificas, e não apenas pelos interesses políticos dos envolvidos”.