MANAUS – A novela para definir quem administra o município de Coari teve mais um capítulo nesta segunda-feira, 13, quando foi adiado pela quarta vez o julgamento do processo que suspendeu a posse de Raimundo Magalhães (PRB), o segundo colocado nas eleições de 2012, e que substituiria Adail Pinheiro, cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral em dezembro do ano passado. O julgamento desse processo, no entanto, aponta para um desfecho que poderá colocar o filho de Adail Pinheiro, Adail José Figueiredo, na Prefeitura de Coari para concluir o mandato do pai.
Para entender esse processo, é preciso compreender os detalhes do que está sendo julgado no Tribunal Regional Eleitoral. Seguem os principais pontos:
1) O processo em julgamento e que já teve três pedidos de vista (dos juízes Ricardo Sales, Affimar Cabo Verde Filho e Marco Antônio Pinto da Costa) é a Ação Cautelar 85-44, impetrada pela defesa da coligação de Adail Pinheiro (PRP, PTB, PSD, PMDB e PHS) para suspender a diplomação de Raimundo Magalhães, que ocorreria no dia 24 de março deste ano. Essa ação cautelar impede a posse do segundo colocado até o julgamento do Recurso Eleitoral Nº 3-57.2013.6.04.0008, que trata do “pedido de anulação de eleição”, feito em 2013 pela mesma coligação, e que foi extinto sem julgamento do mérito pelo Juíz da 8ª Zona Eleitoral em Coari.
2) A coligação recorreu da decisão do juiz da 8ª Zona Eleitoral e o processo no TRE-AM foi distribuído para o advogado-juiz Délcio Luís Santos. Como relator do processo, Délcio decidiu, em 2013, aguardar a decisão do TSE no julgamento do processo que resultou na cassação do prefeito Adail Pinheiro, decisão tomada em dezembro de 2014 e que só foi homologada no mês passado.
3) O Recurso Eleitoral Nº 3-57.2013.6.04.0008 tem o objetivo de anular os votos do terceiro colocado na disputa pela prefeitura de Coari, em 2012, Arnaldo Mitouso (PMN), que obteve 10.071 votos. A defesa da coligação de Adail alega que Mitouso estava inelegível na eleição e, portanto, os votos recebidos por ele devem ser anulados.
4) Mitouso teve o registro de candidatura impugnado pelo Ministério Público Eleitoral (MPE), sob a alegação de que ele estava condenado em um processo no Tribunal de Justiça do Amazonas por homicídio. Ele era prefeito de Coari e concorria à reeleição. O pedido do MPE foi negado pelo juiz da 8ª Zona Eleitoral, porque havia um recurso de Mitouso no TJAM, que ainda estava pendente de julgamento. O MPE recorreu da decisão, e no TRE-AM, novamente Mitouso conseguiu manter o registro de candidatura para disputar a eleição; o MPE, então, recorreu ao TSE, que também não conseguiu barrar a candidatura.
5) No TRE-AM, o processo de impugnação da candidatura de Mitouso foi relatado pelo juiz Marco Antônio Pinto da Costa. Na decisão, ele deixou uma condicionante para a inelegibilidade do candidato: caso fosse publicado o Acórdão dos Embargos de Declaração do julgamento do processo no TJAM, Mitouso estaria inelegível, o que ocorreu no dia 2 de outubro de 2012, antes da eleição ocorrida em 5 de outubro daquele ano.
6) Ao julgar o Ação Cautelar, o juiz Délcio Santos considerou que diante desse fato, que ocorreu depois do julgamento dos processos que poderiam tornar Mitouso inelegível, ele teria ficado inelegível pela condenação por homicídio. E, portanto, os votos deveriam ser anulados.
7) No TSE, o ministro Dias Toffoli julgou que o recurso do MPE pedindo a suspensão do registro de candidatura de Arnaldo Mitouso havia perdido o objeto, uma vez que ele ficou como terceiro colocado na disputa de 2012. Toffoli não considerou que a anulação dos votos do terceiro colocado poderia alterar o resultado do pleito, com a futura cassação de Adail Pinheiro.
8) Diante da decisão do TSE para que o juiz da 8ª Zona Eleitoral desse posse ao segundo colocado, depois de confirmada a cassação de Adail, a defesa da coligação dele ingressou com a Ação Cautelar pedindo a suspensão da posse até o julgamento do processo que pede a anulação da eleição, em função da anulação dos votos de Mitouso. Como os votos de Adail também foram anulados, restam os votos de Raimundo Magalhães (10.135 votos) e do quarto colocado na disputa Miguel de Moura Ribeiro (31 votos). Com isso, os votos que sobraram representam menos de 50% do total de votantes nas eleições de 2012, o que tornaria o processo nulo e obrigaria a Justiça Eleitoral a realizar nova eleição.
9) A etapa atual, de julgamento da Ação Cautelar, ainda não encerra o processo, mas apenas define se Raimundo Magalhães toma posse ou se a situação em Coari permanece a mesma até o julgamento do Recurso Eleitoral Nº 3-57.2013.6.04.0008, cujo relator é Délcio Santos.
10) Confirmando a anulação dos votos de Mitouso e a realização de nova eleição, o grupo de Adail Pinheiro já está articulado para lançar como candidato o filho do ex-prefeito, Adail José Figueiredo.
O que diz a defesa de Magalhães
A defesa do segundo colocado Raimundo Magalhães não descarta que os julgamentos da Ação Cautelar e do Recurso Eleitoral resultem em uma nova eleição, apesar de achar a hipótese absurda. Para a advogada Maria Benigno, apenas duas situações podem anular a eleição: uma é eliminando o registro de candidatura, o que não foi feito no tempo hábil; outra, em uma ação de compra de votos ou de abuso do poder econômico ou do poder político. Neste segundo caso, não há qualquer ação neste sentido, afirma a advogada.
“A liminar [que impediu a posse de Magalhães] é absurda, mas vai completar um mês sem que a Ação Cautelar seja julgada”, disse Benigno, a respeito do que pode ocorrer no TRE-AM.
Sobre o argumento usado por Délcio Santos para conceder a liminar, segundo o qual a decisão do juiz que concedeu o registro de candidatura a Arnaldo Mitouso condicionava a inelegibilidade dele à publicação da decisão da condenação dele pelo Tribunal de Justiça do Amazonas, Maria Benigno afirma que essa decisão por si só não tornaria nula a eleição.
“Neste caso, o Ministério Público teria que informar o TRE sobre a condenação para que a Justiça Eleitoral confirmasse a condição de inelegível, mas isso não foi feito no prazo. Só cinco meses depois das eleições, quando o processo do Adail Pinheiro já estava no TSE foi que a coligação se deu conta de que poderia se beneficiar com a anulação dos votos do Mitouso”, explicou a advogada.
Segundo Maria Benigno, no mérito, os argumentos da defesa de Adail e do juiz Délcio Santos fazem sentido, mas não há abrigo na legislação eleitoral para a instrução processual, porque não existe Ação de Anulação e de Retotalização dos Votos Majoritários, como foi ajuizada.
Sobre isso, o juiz Délcio Santos diz, na liminar que suspendeu a diplomação de Magalhães, que a intenção da coligação que ingressou com o Recurso Eleitoral era anular os votos de Mitouso e não anular a eleição. Na prática, anular a primeira significa anular a segunda.