EDITORIAL
MANAUS – A energia solar é a bola da vez, mas não é a primeira e nem a última promessa de benefício ao consumidor brasileiro que vai por água abaixo depois que o serviço começa a ser usado por parcela mais significativa da população.
Foi assim com o etanol ou álcool combustível; foi assim com o gás natural e, agora, a novela da energia solar começa a seguir o mesmo roteiro.
Em resumo, o governo brasileiro criou, em 1975, o Proálcool (Programa Nacional do Álcool) e injetou recursos públicos para incentivar a produção de álcool combustível com o discurso de enfrentar a alta de preços do petróleo no mercado internacional, em uma época em que a maior parte do petróleo consumido no mercado interno era importado.
Aliado ao incentivo à produção, o governo central também incentivou a indústria automobilística a produzir carros movidos a álcool, o que gerou uma corrido dos consumidores para adquirir esse tipo de veículo. Duas coisas contribuíram para isso: o baixo preço do etanol e os incentivos fiscais (redução de impostos) na compra de carros a álcool.
Entre o final da década de 1980 e meados de 1990, os preços do petróleo no mercado internacional despencaram, o que levou o programa de álcool combustível brasileiro à bancarrota. A produção e venda de carros a álcool foi a quase zero e o governo, no final da década de 1990, deixou de incentivar o setor.
Mais tarde, no início dos anos 2000, o governo jogou a conta do etanol para todos os brasileiros, quando obrigou a mistura do álcool à gasolina, que atualmente é de 27%. Essa mistura ajuda a elevar o preço da gasolina comprada na bomba. A indústria automobilística, por sua vez, resolveu o problema dela com a criação do carro flex (movido a álcool, gasolina ou a mistura dos dois combustíveis).
Hoje, o etanol, como todos sabem, custa mais caro ao consumidor do que a gasolina – apesar de mais barato, os carros consomem mais álcool para rodar. Não há mais qualquer vantagem no uso do álcool, mas a indústria sucroalcooleira não sofre nenhum abalo, porque tem garantida a venda do produto, com a adição obrigatória à gasolina.
Depois do álcool/etanol, veio a promessa do gás natural veicular como a grande sacada brasileira para beneficiar o consumidor. No Amazonas, a descoberta do gás natural nos campos de Urucu (município de Coari) foi “vendida” como a maior mina de ouro para o Estado e para seus habitantes: gás para as usinas termelétricas baixaria o custo da energia; e nos tanques dos carros, um combustível com baixo preço.
O governo federal torrou R$ 5 bilhões na construção do gasoduto Coari-Manaus, mas passados mais de 12 anos nenhuma coisa nem outra aconteceu. O custo da energia elétrica nunca baixou, pelo contrário. E o gás natural veicular serve apenas meia dúzia de taxistas.
De quebra, a venda do gás para a indústria e termelétricas, principais clientes da Cigás (Companhia de Gás do Amazonas), deixam um valor ínfimo ao Estado. Dos lucros e dividendos da companhia, 83% vão para seus investidores privados e o estado fica com 17%.
Com a energia solar, adotou-se o mesmo enredo: primeiro, a promessa de que os altos investimentos em um sistema de geração seriam compensados rapidamente com a queda brusca da conta de luz. Isso ocorreu, mas agora as concessionárias de distribuição de energia elétrica pressionam o governo e o Congresso Nacional para taxar os consumidores.
No início a promessa era bem diferente: como cada consumidor que montasse um sistema de geração fotovoltaica passaria à condição de gerador de energia, poderia ganhar dinheiro vendendo o excedente às distribuidoras.
Agora, a situação começa a se inverter: as concessionárias alegam que a energia excedente gerada pelas placas fotovoltaicas é armazenada na rede e os consumidores precisam pagar por esse armazenamento.
No fim das contas, tudo poderá voltar à estaca zero, ou seja, o consumidor poderá, num futuro próximo, amargar o mesmo destino do álcool combustível: não haverá qualquer vantagem fazer um investimento para ter energia solar em casa.