EDITORIAL
MANAUS – O CBA (Centro de Biotecnologia do Amazonas) foi pensado na gestão de Fernando Henrique Cardoso, e o prédio, no Distrito Industrial em Manaus, foi concluído em 2002, último ano do segundo mandato do tucano. Já completou 20 anos e o elefante branco no centro da Amazônia brasileira jamais moveu uma pata.
Na sexta-feira passada, dia 24, o vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, anunciou que o governo central espera para os próximos dias formalizar um contrato com uma organização social que vai gerir o CBA.
O anúncio foi comemorado pela classe política, mas quem conhece a história do CBA sabe que essa não é a primeira vez que se faz a mesma promessa, nem a primeira vez que se destina um gestor para substituir a Suframa (Superintendência da Zona Franca de Manaus), que geriu o centro de biotecnologia na maior parte de sua existência.
Outro aspecto que a classe política finge não enxergar na fala de Alckmin é a supressão do tema central que preocupa e ameaça a economia do Amazonas, qual seja, a manutenção dos incentivos fiscais e o futuro da indústria instalada no Polo Industrial de Manaus.
Alckmin citou en passant a palavra Zona Franca, quando falou dos parceiros que a OS contratada para gerir o CBA terá: a UEA (Universidade do Estado do Amazonas), a Fapeam (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas) e o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo).
Segundo o vice-presidente e ministro, a Zona Franca será “de Manau e do Brasil, porque vai repercutir positivamente no Brasil inteiro”, com a criação de produtos da floresta.
O CBA, na visão de Alckmin, será o grande motor do desenvolvimento da região. Foi com esse objetivo que ele foi criado, mas também foi pensado não para somar-se à indústria da Zona Franca de Manaus, mas como substituto dela.
Gestado no governo tucano, do qual Alckmin fazia parte, o CBA foi abandonado no nascedouro. Durante o governo Lula, a Suframa, sem recursos nem expertise, tentou levar o projeto adiante, enquanto se travava uma batalha inglória entre três ministérios para ver quem seria o “pai da criança”.
Nesse período, sem personalidade jurídica, o CBA viveu no limbo, jogado de um lado para o outro pelos ministérios do Desenvolvimento Industria e Comércio Exterior (ao qual está submetida a Suframa), do Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia. A disputa de egos não permitiu que o CBA caminhasse.
No Governo Dilma, em 2015 o CBA, finalmente, passou a ser administrado conjuntamente pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Suframa e o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia).
Os três entes firmaram um Termo de Execução Descentralizada através do qual a Suframa passou a transferir créditos para o Inmetro. Qualquer pessoa sensata sabia que a iniciativa seria um fracasso, como o foi, pela completa falta de expertise do Inmetro com o tema biotecnologia.
O objetivo era pomposo: “Consolidar o CBA como uma infraestrutura de alta capacitação tecnológica e conduzir a transição do CBA para estabelecê-lo como canalizador no processo de construção de um polo global de bioeconomia, assegurando o papel de destaque da região amazônica na conquista da competitividade econômica num setor dinâmico e relevante para o país.”
O convênio com o Inmetro foi uma saída para a pior crise enfrentada pelo CBA, no primeiro semestre de 2015, quando os poucos pesquisadores que ali trabalhavam decidiram fazer greve por falta de pagamento dos salários.
O governo Temer manteve o convênio Suframa-Inmetro, mas as iniciativas foram pífias e não houve avanços. As portas não só não foram fechadas porque uns poucos pesquisadores resistiram bravamente.
No governo passado, de Jair Bolsonaro, novas promessas e novas ações foram feitas. A primeira ação foi desfazer um imbróglio do fim do governo Temer que quis jogar a gestão do CBA no colo Aliança ABio (Aliança para a Bioeconomia da Amazônia), entidada formada a partir de um arranho com interesses puramente comerciais.
Feito isso, o Ministério da Economia atribuiu novamente à Suframa a responsabilidade de governança do centro, e lhe pediu uma proposta de gestão. Sem qualquer discussão com atores ligados às instituições de pesquisa, a Suframa apresentou uma proposta, que prontamente foi aprovada pelo ministério comandado por Paulo Guedes.
Para gerir a CBA, o então superintendente da Suframa, Alfredo Menezes, anunciou, em agosto de 2019, o economista Fábio Calderaro.
A promessa era a mesma de Alckmin: transformar o CBA no motor da economia verde, com o desenvolvimento de pesquisas que transformassem os produtos da floresta em matéria prima para uma nova indústria.
O objetivo de Paulo Guedes todos ficaram conhecendo: com algumas canetadas, ele e o então presidente Jair Bolsonaro retiraram as vantagens da Zona Franca de Manaus, que foi salva por decisão judicial do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).
Alckmin, como Guedes, em momentos pretéritos, deixou clara a contrariedade com os incentivos fiscais concedidos às indústrias instaladas no Polo Industrial de Manaus.
Agora, ele precisa provar que mudou de opinião e que deseja mesmo manter a Zona Franca de Manaus forte e com garantias de segurança jurídica para atrair novos investidores.
Não é exigir demais que o Amazonas queira novas matrizes econômicas conjugadas com a Zona Franca de Manaus.
No entanto, não haverá nova matriz econômica sem investimento de recursos em pesquisa e nem sem o envovimento de todos os agentes produtores de conhecimento sobre a Amazônia para transformar o sonho do desenvolvimento sustentável em realidade.