Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – A DPE (Defensoria Pública do Estado do Amazonas) apresentou recurso, na quinta-feira, 4, na Justiça estadual para obrigar o Governo do Amazonas e a Prefeitura de Manaus a comprar doses de vacinas contra a Covid-19 em número suficiente para imunizar os 2,4 milhões de integrantes dos grupos prioritários.
Para o defensor Rafael Barbosa, as vacinas destinadas ao Amazonas pelo Ministério da Saúde são insuficientes para alcançar as pessoas com prioridade na fila. Ele cita que até o momento foram disponibilizadas 282.320 doses e que o plano estadual de vacinação prevê que será necessário 2.424.458 para imunizar todo o grupo prioritário do Amazonas.
O recurso é contra uma decisão da juíza Etelvina Braga, da 3ª Vara da Fazenda Pública da Capital, proferida na segunda-feira, 1, que negou o pedido da DPE sob alegação de que o estado e a prefeitura “não vêm sendo omissos nem agindo de forma ilegal”. Segundo a magistrada, o plano nacional de imunização estabelece que compete ao governo federal comprar as vacinas.
Na Ação Civil Pública, Barbosa cita uma decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski na ADPF n.º 770/DF que autorizou os governos estaduais e as prefeituras a comprarem os imunizantes diretamente dos laboratórios caso ficasse comprovada a omissão do governo federal.
Barbosa afirma que as declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre a vacina e a falta de investimento maior em convênios internacionais para pesquisa e fabricação de imunizantes comprovam a omissão da União. Segundo ele, o PNI (Programa Nacional de Imunização) não funciona porque “não há o insumo mais importante que é a vacina”.
“Na minha opinião, está mais do que caracterizada a omissão federal. Nesse caso, abre a porta para o estado e prefeitura negociarem essas vacinas. É um outro problema se eles vão conseguir adquirir, mas é importante que eles se movimentem e conquistem uma certa prioridade quando houver a abertura dos laboratórios”, disse Barbosa.
De acordo com a FVS (Fundação de Vigilância em Saúde), 85.775 doses foram aplicadas em todo o estado até quinta-feira, 4. A primeira fase de vacinação alcança povos indígenas vivendo em terras indígenas; trabalhadores de saúde; pessoas de 80 anos ou mais; pessoas de 75 a 79 anos; pessoas com 60 anos ou mais institucionalizadas.
Terceira onda
Ao citar a explosão de novos casos em Manaus em dezembro de 2020 e janeiro de 2021, Barbosa afirma que os decretos governamentais impondo medidas restritivas, como o toque de recolher, não são suficientes para controlar o vírus. Segundo ele, a única forma de controle efetivo do vírus seria através da vacinação de toda a população do Amazonas.
“Está mais do que claro que não há uma adesão ao lockdown (restrição de circulação de pessoas). E a única saída que a população tem hoje farmacológica é a vacina. Sem a vacinação em massa dos manauaras, amazonenses, a tendência é ter uma terceira onda daqui a seis meses ou um pouquinho menos”, alertou Barbosa.
O defensor disse que enviou ofício ao governo estadual para buscar informações sobre a compra de vacinas, mas a Secretaria de Saúde informou que utilizará somente as vacinas disponibilizadas pelo governo federal, ou seja, que não pretende negociar diretamente com nenhum país ou laboratório internacional.
O defensor também cita a aprovação de emenda coletiva à Lei Orçamentária Anual de 2021, na qual se propôs a destinação de R$ 50 milhões para compra de imunizantes contra a Covid-19 pelo estado. A execução do recurso é obrigatória e o governo deverá considerar a origem da vacina e o valor cobrado pelos laboratórios.
Violação de poderes
Ao se manifestar contra a DPE, o promotor de Justiça Jorge Alberto Veloso Pereira alegou que o pedido indica “violação à separação dos Poderes”. “Não se visualiza inércia/omissão ilegal e abusiva nas ações dos réus em não adotarem providências concretas para adquirirem vacinas”, escreveu o promotor.
Pereira afirmou que a negociação direta com os laboratórios que produzem as vacinas já aprovadas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) atualmente “mostra-se dificultoso ante a falta de insumos (IFA), a alta demanda global e a preferência da União na aquisição em relação aos demais entes políticos (contrato de exclusividade)”.
O promotor alerta para obrigação de decisão que não se possa cumprir. “Assim, receia-se que, acaso deferida a tutela de urgência, os réus não consigam cumprir a determinação judicial (tanto mais na quantia desejada), por fatores totalmente alheios às suas vontades, e tenham contra si pesadas multas”, afirmou Pereira.
As alegações do MP-AM foram acolhidas pela juíza Etelvina Braga, que sustentou que a produção mundial de vacinas “ainda não é suficiente para satisfazer de forma satisfatória todos os países do mundo, posto que a demanda é extremamente elevada e existem relativamente poucos laboratórios fabricantes”.
Braga também citou o sofrimento da população amazonense com as perdas de amigos e entes queridos e afirmou que mesmo que seja “tentador” deferir uma liminar e determinar que o governo estadual e a prefeitura comprem as vacinas, “é necessário agir com a razão e não com a emoção”.