O art. 144 da Constituição Federal/1988 elencou os órgãos encarregados pela segurança pública no país, reduzindo-os às forças policias, manifestando com isso uma concepção predominantemente repressiva, embora faça alusão ao corpo de bombeiros e às guardas municipais.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I – polícia federal;
II – polícia rodoviária federal;
III – polícia ferroviária federal;
IV – polícias civis;
V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.
(…)
§ 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
Todas as polícias têm atuação relevante e essencial à ordem social e à segurança pública, sendo mais frequente o contato diário da população nos estados e municípios brasileiros com as polícias civil e militar.
Os traços que marcam as especificidades entre a polícia civil e a polícia militar estão assentados na própria Constituição Federal e desdobrados no Código de Processo Penal, em especial quando trata de atribuições da polícia judiciária e da autoridade policial (delegado de polícia).
Incumbe, nos estados, à polícia civil, dirigida por delegado de polícia, exercer as funções de polícia judiciária, auxiliando o judiciário e o sistema de justiça criminal no que for solicitada, nos limites sempre da legalidade. Importa ressaltar que todo pedido e proceder devam ser lícitos, isto é, estejam de acordo com a lei.
A polícia militar é força policial formada e treinada para preservar de modo ostensivo a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio, incumbida legalmente da defesa social do cidadão.
A polícia civil tem atuação de natureza investigativa enquanto a polícia militar, preventiva. Os policiais civis, encarregados de investigar e instruir o inquérito policial, não usam uniformes, identificando-se por meio de distintivos e carteiras funcionais. Os policiais militares usam uniforme, a farda da corporação militar, na qual deve haver algum tipo de identificação adequada. A polícia militar visa evitar, inibir e coibir a prática de delitos.
Distintamente da polícia militar, a polícia civil age, em regra, a partir da ocorrência do ilícito criminal ou após a prática da infração penal, investigando a materialidade e autoria do crime. Para tanto, a polícia judiciária adota procedimentos (ouve testemunhas, levanta e verifica provas, realiza campanas etc.), requisita providências das autoridades judiciárias (escutas, interceptações, medidas protetivas, prisões temporárias e preventivas), além de solicitar medidas técnicas e periciais (exames diversos) para elucidar o delito. Por essas razões, o código de processo penal reconhece apenas o delegado de polícia como autoridade de polícia judiciária.
Exigir vantagem econômica (concussão), prestar falso testemunho, agir com abuso de poder, associar-se ao tráfico ou grupo/organização para prática de delitos, dentre outros, constitui crime e, de pronto, no caso de servidores policiais, motivo para instauração de procedimentos disciplinares, além do respectivo procedimento de persecução penal. Aliás, tratando-se de policial, seja civil seja militar seja federal, a mera associação a determinadas pessoas, eventos ou atividades pode passar a ser considerada algo suspeito. É como têm previsto as leis que regulam a conduta disciplinar dos policiais, atribuindo às corregedorias a tarefa de apurar e responsabilizar os mesmos por condutas que resultem em transgressões disciplinares.
Contribui grandemente para que o policial evite problemas de natureza disciplinar, além de estar em dia com seus deveres funcionais, estar continuamente se qualificando quanto à moralidade, ao direito, a procedimentos técnicos e à justiça, renovando dia-a-dia seu compromisso com o relevante serviço que presta à sociedade.
A consciência ética do policial deve estar num nível de clareza e de discernimento acima da média quanto ao que lhe convém e o que não lhe convém fazer, de maneira que o permita enfrentar situações “limites” e evitar cair em alguma falta, seja leve, média ou grave. O policial defronta-se constantemente com extremos e deve a todo custo evitar se corromper, deixar-se subornar ou cair em qualquer outra armadilha oriunda da atividade ilícita ou criminosa. Essa lucidez ética e jurídica é o que o diferencia do homem médio e principalmente do criminoso ao lidar com o crime, permitindo ao policial combater a criminalidade sem cruzar a tênue fronteira que leva ao delito.
Evitar a corrupção no tratamento da criminalidade e optar pelo que é lícito, com discernimento ético, torna o policial um efetivo agente da justiça, da cidadania e da dignidade humana. Por isso, cumpre à administração oportunizar frequentemente formação ética e técnica ao policial, com vistas ao aprimoramento do compromisso quanto à moralidade, ao direito, à liberdade e à justiça no exercício de sua relevante função social.
Outro aspecto comum às polícias é o risco inerente à atividade policial. A polícia brasileira é conhecida como a polícia que mais mata e que mais morre no mundo. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública do FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), em 2018, foram assassinados 343 policiais (civis e militares) e foram mortas 6.220 pessoas decorrentes de intervenções policiais (17 pessoas por dia).
Muito frequentemente as polícias são usadas como “bucha de canhão” para arrefecer tensões sociais em áreas de criminalidade (zonas vermelhas), em protestos de rua, para conter situações de ameaça e de violência, inclusive em áreas ou regiões nas quais são as únicas instituições que lembram a existência do Estado. A omissão, a incompetência, o descaso, a truculência, a corrupção e inaptidão dos governos quase sempre se convertem em problemas de polícia.
Ao ingressar na carreira, o policial, seja civil seja militar, deve-se estar ciente de tudo isso, o que não desobriga o Estado a ter políticas mais eficazes de seguro para o profissional da segurança pública. A mera seguridade social não constitui política de seguro. Importa aos entes estatais aprimorarem as condições de seguro de vida e de saúde oferecidas a seus servidores policiais.
Há ainda outras importantes questões relativas às polícias. Discute-se no atual contexto a unificação delas, a valorização da carreira, a autonomia da polícia civil em relação ao executivo, a desmilitarização das polícias ostensivas nos estados membros, a revisão do modelo de polícia judiciária vigente, a recomposição dos efetivos policiais que tiveram seus quadros reduzidos por diversas razões, dentre outros assuntos bastante polêmicos.
Enfim, vários temas de relevante impacto ao ofício dos profissionais dos distintivos e das fardas, que afetam os diferentes serviços na área de prevenção e combate à insegurança pública.
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