Frente ao atual contexto de profunda crise econômica e institucional, sobretudo o viciamento da mediação política, é bastante compreensível que a sociedade nacional se pergunte: que Estado queremos? Um Estado para a Democracia ou um Estado que dela apenas se apropria? Estado para qual Democracia?
Após o processo de reabertura política, que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988, foi-se desacelerando e gradativamente restringindo o processo de aprimoramento das instituições de mediação política no país. Esse aprimoramento “político-institucional” estacionou nalguns plebiscitos e produziu parcas inovações, tendo sido talvez a lei de responsabilidade fiscal e lei da “ficha limpa” as mais expressivas. Efetivamente, quase nada se fez em relação ao aprimoramento da democracia intra e extra partidária, como também em relação ao financiamento de campanhas eleitorais. Ao longo do tempo, restou acumulado, portanto, uma espécie de déficit de aprimoramento da qualidade dos poderes e das instituições políticas, bem como do sistema eleitoral e de certos procedimentos de legitimação política.
É natural que, nesse tempo de “poço sem fundo” na economia e de abismo ético dos poderes e das instituições de mediação política, a sociedade se interrogue acerca de questões de fundo, tais como: Que democracia queremos? Que tipo de Estado viabilizaria esse projeto de democracia a que almejamos? Poderemos revisar nosso modelo federativo ou teremos mesmo de refundá-lo? Como retomar a perspectiva republicana nas instituições e poderes vigentes ou ter-se-á de reinventar essas estruturas de poder? Quais seriam as alternativas ao presidencialismo de coalização? parlamentarismo? semipresidencialimo? Tais repostas são fundamentais ao projeto de democracia almejado, sob quaisquer enfoques, e podem redefinir os rumos da sociedade e o perfil do Estado brasileiro.
Levar essas questões às pessoas, ao imaginário político do cidadão comum já é, de certo modo, algo novo que resulta dessa crise atual. As pessoas gradualmente começam a ver a democracia de modo diferente da que estavam acostumadas nas últimas décadas. Passam a identificar os principais problemas que as afetam e a reivindicar as soluções adequadas. Começam a fazer uma ideia mais clara do que o patrimonialismo, o clientelismo, a plutocracia, a corrupção e a cleptocracia fizeram e ainda fazem ao país. E demandam um processo de superação das crises nas quais se afundou o Estado e a sociedade nacional.
Busca-se um novo modelo político para o país que amplie e aprofunde a experiência democrática. Contudo, há riscos de má condução desse processo, sobretudo quando se abrem espaços a perspectivas autoritárias, egocratas, retrógradas e novas ilusões de regimes de força… Infelizmente, a nostalgia de certos segmentos pela ditadura e pelo militarismo ocorre num momento da vida nacional em que parcela mais jovem da sociedade brasileira ainda está tomando ciência do esgotamento do modelo de Democracia e de Estado em vigor. A sociedade nacional já consegue perceber que tais modelos são estrutural e funcionalmente incapazes de dar respostas a crônicos e graves problemas que enfrenta enquanto a perdulária elite política caminha a passos muito lentos na direção de uma efetiva reinvenção das instituições e dos poderes no país. O discurso da democracia continua útil para sujeitar a sociedade a serviço do Estado e não o inverso.
Por isso, talvez essa crise deixe de herança, dentre seus impactantes legados à sociedade, algumas sementes para a formação de um novo modelo de Estado, mais efetivamente comprometido com a Democracia almejada. Não mais apenas uma Democracia para uso e apropriação pelo Estado, mas um Estado que fomente e promova um modelo mais justo, mais ético e mais responsável de Democracia. Afinal, a grande maioria dos cidadãos busca construir uma resposta concreta a seguinte questão: que modelo de Estado poderia viabilizar uma nova e mais efetiva Democracia no país, afastando o risco de decadência em governos autoritários, corruptos, socialmente injustos e ainda mais onerosos ao contribuinte?
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