Da Redação
MANAUS – A DPE-AM (Defensoria Pública do Estado) vai instaurar um Procedimento Administrativo de Apuração de Dano Coletivo (PADAC) para investigar casos em série de violência obstétrica nas maternidades e hospitais públicos e privados no Amazonas. A iniciativa ocorre em função do volume de casos semelhantes recebidos e acompanhados pela Defensoria, incluindo as mortes de uma mulher de 35 anos e um bebê durante o parto, na Maternidade Balbina Mestrinho, no último sábado, 16, em Manaus.
Ao todo, 35 ações envolvendo exclusivamente casos de violência obstétrica foram ajuizadas pela Defensoria de 2009 a 2018, na esfera cível. Destes, 12 envolvem mortes de gestantes ou bebês. Outros casos estão em fase de análise e reunião de documentação para serem ajuizados. Nas ações, a Defensoria Pública do Estado pede indenização por danos morais e materiais.
Entre os processos de violência obstétrica que tramitam na Justiça estão casos de constrangimento, humilhação, sequelas nas gestantes e crianças, morte de nascituro dentro da barriga de gestantes e ausência de equipamentos para a realização de procedimentos necessários. Também há registros da falta de exames, violência na retirada do bebê resultando em sequelas, parto normal forçado e em situação não recomendada, gestante erroneamente diagnosticada com HIV, entre outros. Com base nos processos, é possível identificar que a maioria dos casos em que houve demora no atendimento resultaram em morte do nascituro dentro da barriga da gestante.
“Há dezenas de casos similares, com a morte da mãe e da criança. A Defensoria já entrou com diversas ações individuais, buscando a responsabilidade civil e a condenação do Estado, para que as famílias que sofreram essa perda sejam indenizadas. Agora, como casos similares prosseguem, vamos fazer uma apuração aprofundada, de tutela coletiva, para entender o que está ocorrendo nessas maternidades e o que contribui para que essas mães sofram violência obstétrica, que muitas vezes acarretam em morte”, explicou a defensora pública Caroline Souza, titular da 13ª Defensoria Forense Cível da DPE e Coordenadora da Área Cível da DPE-AM.
Segundo o defensor público Thiago Rosas, designado para a Defensoria Pública Especializada de Atendimento de Interesses Coletivos, a investigação deve reunir elementos sobre a responsabilidade das mortes e atuar nas causas de erros de atendimento, negligência e irregularidades de ordem administrativa e médica.
“A Defensoria vem fazendo acompanhamento das demandas individuais que envolvem violência obstétrica desde 2017. Existem levantamentos feitos acerca desse tema e uma comissão de trabalho que atua nessa área dando conta de vários casos de violência obstétrica, incluindo mortes. Por conta disso, e dos casos recentes que envolvem essa questão sensível à sociedade, a Defensoria Pública de Direitos Coletivos vai abrir um procedimento no qual serão investigadas as responsabilidades e, paralelamente, atacar as causas dos problemas seja de ordem administrativa ou médica”, disse.
Ainda segundo o defensor Thiago Rosas, a partir do PADAC poderão ser feitas visitas técnicas nas maternidades e solicitação de documentos com o objetivo de apurar denúncias e levantar elementos de instrução para instrumentalização do procedimento de dano coletivo, a fim de possibilitar a adoção de eventuais medidas. A DPE-AM também pedirá informações específicas sobre o caso mais recente, que culminou na morte de mãe e filha.
Ações Judiciais
“Os relatos nos processos judiciais são muito similares. Na grande maioria, as mães, as parturientes, afirmam que procuram atendimento e que ouvem que ainda não está ‘no momento’ da criança nascer, e lhes é dito que voltem para casa. Quando retornam à maternidade, há uma demora no atendimento e, infelizmente, conforme temos acompanhado – são dezenas de processos – há sofrimento fetal por parte das crianças”, diz a defensora pública Caroline Souza.
“Muitos desses bebês ficam com sequelas neurológicas permanentes. Há outros casos de falecimento de mães e, normalmente, a mãe morre por dois motivos nesse processo, o que também chama a atenção: hemorragia e septicemia, depois da cirurgia. Infelizmente não é um processo isolado esse fato. É algo que se tornou corriqueiro”, lamenta.
Serviço
Mulheres vítimas de violência obstétrica podem procurar a Defensoria Pública na Casa da Cidadania, localizada na rua 2, casa 7, no conjunto Celetramazon, bairro Adrianópolis e nos telefones 3642-0183 e 3611-2030, e também na sede administrativa da DPE-AM, na rua Maceió, n° 307, bairro Nossa Senhora das Graças, caso queriam entrar com ação reparatória (indenizatória).
Se for o caso de uma “violência” em curso, por exemplo, se a mulher não estiver conseguindo uma cirurgia, estiver em trabalho de parto e tiver qualquer obstáculo para conseguir internação, os familiares podem procurar a unidade de Saúde da Defensoria, na rua 24 de Maio, n° 321, no Centro de Manaus, e no telefone 3622-6966. O plantão cível na Defensoria Criminal, na avenida Umberto Calderaro Filho, em frente ao hotel Blue Tree, também está à disposição para casos do tipo.
Comitê
A Defensoria Pública também faz parte do Comitê de Combate à Violência Obstétrica e vem atuando desde 2017 no tema. O Comitê foi criado em 2017, a partir de termo de cooperação de iniciativa do MPF (Ministério Público Federal) no Amazonas. O grupo conta ainda com representantes da Susam (Secretaria de Estado da Saúde), do MP-AM (Ministério Público do Estado do Amazonas), da Semsa (Secretaria Municipal de Saúde), da Sejusc (Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania), da SSP (Secretaria de Estado de Segurança Pública), da Ufam (Universidade Federal do Amazonas), da UEA (Universidade do Estado do Amazonas), das DPU (Defensorias Públicas da União), do Coren-AM (Conselho Regional de Enfermagem do Amazonas) e do Cedim (Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do Amazonas).