Por Felipe Campinas, do ATUAL
MANAUS – As trocas de partido feitas nos últimos dias por políticos que pretendem disputar as eleições municipais deste ano revela que a conveniência eleitoral pesa mais que a ideologia partidária na escolha das siglas. A filiação às agremiações partidárias tem se tornado mera formalidade.
Para o professor e sociólogo Luiz Antônio Nascimento, da Ufam (Universidade Federal do Amazonas), a alternação é reflexo da estrutura partidária brasileira, que permite a existência de “partidos de aluguel”, e das regras para ocupação de vagas no parlamento, que exigem dos candidatos a busca por siglas com “puxadores de votos”, que são nomes que servem de “escada”.
Com o fim dos prazos para troca de partido sem perda de mandato e para a filiação partidária, na sexta-feira (5) e no sábado (6), 21 vereadores de Manaus mudaram de sigla. Políticos sem mandato, mas que estão em evidência também anunciaram onde ficarão abrigados para o pleito.
As mudanças de partido se mostram como movimentações de grupos políticos que disputarão a prefeitura e a Câmara neste ano. Eles estão posicionando as peças do jogo para a batalha eleitoral.
O uso dos partidos para esse fim é possível graças a estrutura partidária brasileira que, segundo Luiz Nascimento, “foi construída para não funcionar”.
“Você tem meia dúzia de partidos que tem alguma identidade ideológica e os outros são uma espécie de satélites, que são aquilo que a gente pode chamar de partidos de aluguel”, disse o professor. Esse partidos atuam conforme a conveniência eleitoral. A ideologia fica em segundo plano.
De acordo com o professor, os partidos se tornam abrigos para grupos corporativistas, que ele classifica como “grave” à democracia. É o caso de siglas criadas por igrejas neopentecostais que elegem pastores ou indicados por pastores para os parlamentos “não como representantes do conjunto da sociedade, mas como representantes de uma corporação”.
“Isso é proibido pela Constituição brasileira, pois viola os fundamentos da democracia brasileira. Parte desses partidos tem hospedado policiais militares que, junto com os neopentecostais, têm construído estruturas partidárias que violentam a ideia da representação da sociedade. Eles estão se configurando como representantes de fragmentos, de guetos, de corporações”, disse Luiz.
O professor lembra que, no passado, a participação nas siglas, de maneira geral, ocorria de forma democrática. “Sempre teve religiosos, católicos e não católicos, evangélicos e não evangélicos, militando em diferentes partidos políticos. O próprio Partido dos Trabalhadores nasce com um dos grupos fundantes do partido ligados à Igreja Católica e à igreja evangélica de matriz Batista”, disse Luiz.
“Essas forças, esses setores das igrejas que militavam, que estiveram presentes dentro do PMDB, dentro da Arena [Aliança Renovadora Nacional] e etc., eles tinham um comportamento, digamos assim, democrático dentro das estruturas partidárias. O que nós temos hoje, e é bastante preocupante, são as igrejas neopentecostais criando os seus próprios partidos”, disse Luiz.
Ideologias
De acordo com Luiz, os poucos partidos que ainda preservam suas ideologias são de esquerda, como o PCO, o PSTU, o PSOL, o PT e o PCdoB. “Esses partidos guardam historicamente uma identidade ideológica. Você senta com alguém numa mesa para conversar no Rio Grande do Sul, em Brasília ou em Manaus, com cinco minutos de conversa sobre processo político eleitoral, você identifica aquele sujeito como o PT, como o PSOL ou como o PSTU, por exemplo”, disse o professor.
Conforme Luiz, fora do campo da esquerda, a “identidade [partidária] desaparece quase que totalmente”. “No PSDB e no MDB, por exemplo, você vai ter uma identidade bastante acentuada do ponto de vista de valores democráticos. Ou encontrava. No MDB você ainda encontra bastante, no PSDB você encontra menos. Mas você tinha lá uma identidade democrática, mas não ideológica”, disse .
“Nos dois partidos você vai ter de nomes do campo da esquerda democrática até a direita democrática. Muito recentemente o PSDB passou a abrigar uma extrema direita, antidemocrática, racista, homofóbica, etc. Esse é um processo muito novo”, completou Luiz.
Reforma eleitoral
A minirreforma eleitoral de 2015, que incluiu regras para acabar com a eleição de políticos com votações inexpressivas, também estimula a “dança de cadeiras” nos partidos. Os políticos, agora, buscam siglas que viabilizem as candidaturas dele e isso faz com que a filiação a um partido se torne uma mera formalidade.
A Lei Federal nº 13.165, de 29 de setembro de 2015, criou regras para barrar a eleição de parlamentares com votação inexpressiva, como ocorreu na eleição de 2010 no estado de São Paulo. O humorista Francisco Everardo Tiririca Oliveira Silva, mais conhecido como Tiririca, recebeu 1,3 milhão de votos, se elegeu e arrastou mais três para a Câmara Federal.
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Com as novas regras, de olho nas eleições deste ano, políticos migram para partidos que tenham “puxadores de votos” para ter mais chance de serem eleitos. “Faz parte do jogo, mas isso são reflexos das mudanças eleitorais, que ao final e ao cabo, estão trazendo mais problemas do que soluções”, afirmou o professor Luiz.
“Isso implica em que os pré-candidatos tenham que fazer essa dança de cadeiras para encontrar partidos onde você tenha aquilo que a gente vai chamar de puxadores de voto. Eu preciso estar no partido A, B ou C, que tenha dois ou três nomes que puxem 15 mil, 20 mil, 30 mil votos, para me dar a chance de ser eleito se eu tiver os meus três, quatro, cinco mil votos”, disse Luiz.