O Brasil ultrapassa a linha das 150 mil mortes e 5 milhões de casos de Covid-19 registrados. No que diz respeito ao número de casos, somos o terceiro mais afetado do mundo, perdendo somente para os Estados Unidos e a Índia. No sinistro ranking de mortes somos o vice-líder, perdendo somente para os Estados Unidos da América. Com as informações disponibilizadas, é possível também calcular uma média diária de 499 mortes na última semana no Brasil.
O Estado do Amazonas contabiliza um total acumulado de quase 150 mil casos de Covid-19, que gerou cerca de 4.254 mortes. Manaus, a primeira capital a colapsar o sistema de saúde, registra 57 mil casos e ultrapassa as 2.680 mortes. Já o número de recuperados da doença no Amazonas é de 125.982. Entre os outros municípios amazonenses mais afetados estão Coari, Parintins, São Gabriel da Cachoeira e Manacapuru.
A Folha de São Paulo divulgou nesta semana uma pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com o Instituto Francês de Pesquisa e Desenvolvimento (IRD), revelando variadas tendências e descobertas na crise sanitária do Brasil. A pesquisa mostra que o indicador de pobreza é um fator de risco. De acordo com o estudo, um aumento de 10 pontos percentuais no total de pobres em cada cidade leva ao aumento nos óbitos em 73% – ou 167 a mais por milhão de habitantes. O total de casos tem um acréscimo de 52%, ou 5.667 novos contaminados.
Outra descoberta da pesquisa afirma que cidades com quantidade de trabalhadores informais foram as mais afetas pela pandemia de Covid-19. O estudo constatou que para cada 10 pontos percentuais de trabalhadores informais a mais na população, a taxa de contágio aumenta em 29% e a taxa de mortalidade pela doença cresce, em média, 38%. O trabalhador informal fica mais exposto aos riscos da Covid-19, pois a natureza da atividade exige contato com o público, locomoção constante e convívio com áreas que têm condições sanitárias piores. Portanto, a falta de seguridade social e a necessidade de se deslocar no exercício de seu trabalho contribuem para essa especificidade daqueles que estão na informalidade.
Os estudos também confirmaram as suspeitas sobre a atitude do presidente Bolsonaro, que minimiza a gravidade da Covid-19, apesar da sua inerente letalidade. A pesquisa constatou o “efeito Bolsonaro” na propagação da pandemia, revelando que há correlação entre a preferência pelo presidente nas eleições de 2018 e a expansão da Covid-19. Concluiu-se que o coronavírus causa mais estragos nos municípios mais favoráveis ao presidente Bolsonaro.
Segundo a pesquisa, para cada 10 pontos percentuais a mais de votos para Bolsonaro há um acréscimo de 11% no número de casos e de 12% no número de mortos. O estudo mostra que o discurso ambíguo do presidente induz seus partidários a adotarem com mais frequência comportamentos de risco (menos respeito às instruções de confinamento e uso da máscara) e a sofrer consequências. A influência de Bolsonaro na expansão dos casos de Covid-19 confirma outras pesquisas já realizadas, como é o caso dos trabalhos da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de São Paulo (USP).
Para os pesquisadores, trata-se de um efeito da própria postura do presidente, que minimizou o uso de máscara e a doença, chamando-a de gripezinha. O Estudo concluiu que em praticamente todas as ocasiões em que o presidente minimizou a pandemia, a taxa de isolamento social no Brasil diminuiu – e mais pessoas se contaminaram e morreram, proporcionalmente, nos municípios em que Bolsonaro obteve uma melhor votação na eleição de 2018.
A crise da pandemia nos fala sobre a necessidade de a sociedade brasileira realizar uma inflexão política e humanitária, reforçando os laços de solidariedade e empatia. Há múltiplas provas de que o sistema capitalista e a sua obsessão pelo lucro nos leva para caminhos trágicos, tornando insustentável a convivência social. É imprescindível rompermos o paradigma da desigualdade, alimentando a esperança de uma civilização mais democrática e igualitária. Da mesma forma, não há dúvida de que precisamos rever a nossa relação com a natureza, considerando-a parceira e não inimiga de morte.
As posturas inadequadas que expandem a pandemia, promovendo o sofrimento e a morte de milhares de pessoas, mostram a irresponsabilidade do governo federal perante as suas obrigações de defesa da vida. Ao contrário destas posturas é necessário retomar uma política de consolidação dos serviços públicos essenciais, como a saúde, o saneamento básico, a educação e a moraria. É necessário percebermos que a saúde não é brincadeira.
Sandoval Alves Rocha Fez doutorado em ciências sociais pela PUC-RIO. Participa da coordenação do Fórum das Águas do Amazonas e associado ao Observatório Nacional dos Direitos a água e ao saneamento (ONDAS). É membro da Companhia de Jesus, trabalha no Intituto Amazonizar da PUC-Rio, sediado em Manaus.
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