Da Agência Brasil
BRASÍLIA – Pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), do Complexo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (CHC-UFPR) e do Instituto Carlos Chagas da Fundação Instituto Oswaldo Cruz (ICC/Fiocruz Paraná) iniciaram uma pesquisa pioneira que usa células-tronco no tratamento de pacientes com a Covid-19.
Paulo Brofman, coordenador do Núcleo de Tecnologia Celular da PUCPR, um dos líderes do projeto, disse nesta segunda-feira, 22, em entrevista à Agência Brasil, que a doença se apresenta de maneira muito diversificada nos pacientes, envolvendo desde sintomas leves até situação pulmonar bastante grave, que leva à necessidade de intubação e apoio de prótese artificial ou de respirador.
“Um grande problema desses pacientes que evoluem de maneira mais grave é que ocorre uma alteração que a gente chama de ‘tempestade de citocinas’ e leva a uma inflamação respiratória muito grande que vai ocupar boa parte da estrutura pulmonar, fazendo com que a área de troca do CO2 pelo oxigênio diminua muito”, explica Brofman.
O Núcleo de Tecnologia Celular da PUCPR já tem vasta experiência com o uso de células tronco mesenquimais (CTMs), derivadas do tecido do cordão umbilical, para doenças pulmonares, desde pesquisa básica, pesquisa clínica e até em pesquisa clínica experimental.
“E elas se mostraram muito próprias para isso, porque têm uma importante ação anti-inflamatória. Isso vai fazer com que a diminuição dessa carga viral de citocinas que estão produzindo essa reação inflamatória diminua de maneira significativa, fazendo com que as células que possam ir ao pulmão e complicar a situação dele, não façam esse caminho”, diz Paulo Brofman acrescentando que a expectativa é muito promissora, no sentido de tratar os pacientes já gravemente comprometidos.
Injeção de células
Nesse estudo piloto serão envolvidos 15 pacientes. Nesta segunda-feira, 22, está sendo incluído o paciente número quatro. Em até duas semanas, deverão ser incluídos todos os 15 pacientes selecionados, já internados na UTI de Covid-19 do Hospital das Clínicas da UFPR.
O objetivo, diz Brofman, é utilizar células derivadas do cordão umbilical, que são isoladas e expandidas e, depois de feito o controle de qualidade, elas são injetadas nos pacientes por via endovenosa.
“O nosso protocolo corresponde a 500 mil células injetadas a cada dia por três dosagens, ou seja, por quilo de peso. Um paciente recebe, aproximadamente, 1,5 milhão de células por quilo de peso”. A infusão intravenosa terá intervalos de 24 horas e será realizada em conjunto com o tratamento convencional, explica.
Brofman informa que já há comprovação de que essas células vão para o pulmão, onde exercem a função importante de imunomodeladora e anti-inflamatória que elas já produzem.
“E a gente tem esperança que isso possa diminuir muito essa reação inflamatória, encurtando o tempo de necessidade de intubação e do uso do respirador, e impedindo que a lesão que fica instalada no pulmão, após a agressão por essas citocinas inflamatórias, não deixe cicatriz muito grande”.
Brofman explicou que esse é um problema grande, porque mesmo os pacientes que estão sobrevivendo à Covid-19 estão apresentando algum grau de sequela. A expectativa dos pesquisadores é que as células tronco possam reduzir também esse grau de lesão.
As células tronco mesenquimais são produzidas na PUCPR, enquanto a Fiocruz Paraná vai mensurar as citoquinas inflamatórias. A ideia é que os primeiros resultados desse estudo piloto, envolvendo os 15 pacientes do Hospital das Clínicas da UFPR, tempo de intubação e de hospitalização, possam ser obtidos até o final de julho. Os pacientes serão acompanhados durante quatro meses. A ideia é avaliar a segurança do método utilizado, isto é, verificar que não causa dano ao paciente.
Segundo estudo
A utilização de células mesenquimais vem sendo usada para outras doenças pulmonares e síndromes da angústia respiratória em endemias passadas, mostrando também recuperação bastante adequada para os pacientes, salientou Brofman. Ele afirma que estudos na China, em dez doentes, mostram evolução positiva para os pacientes que receberam células.
O coordenador afirma que os pesquisadores aguardam aprovação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e a liberação de financiamento pelo Ministério da Saúde e o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) para um segundo estudo, multicêntrico, englobando pacientes do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Bahia e Paraná.
O projeto já tem aprovação da Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa). Serão abordados 60 pacientes no total. A perspectiva é que a pesquisa seja realizada ainda este ano, começando até dois meses após a aprovação pela Anvisa e o término do ensaio piloto.
O coordenador do Núcleo de Tecnologia Celular da PUCPR esclarece, entretanto, que mesmo que a resposta seja positiva com esses novos 60 pacientes, o tratamento não poderá ser estendido para tratamento da Covid-19. “O problema é que nós temos milhares de pacientes da Covid e não vamos ter, provavelmente, células para essa quantidade enorme de pacientes que estão internados em UTIs”.
Diz porém que o estudo trará conhecimento na utilização de outros tipos de medicamento baseados nos princípios que a célula mesenquimal ensinará no controle da Covid nesses pacientes. Brofman sustentou ainda que essas células têm grande potencial imunomodulador e um efeito antimicrobiano, reparam o tecido e, além disso, têm uma característica própria: elas são imunoprivilegiadas. Isso significa que a Covid-19 não penetra nessas células.
Outros ensaios
A terapia celular para o tratamento do coronavírus já está sendo testada em ensaios clínicos nos Estados Unidos, China, Colômbia, França e Jordânia. São utilizadas CTMs, que atuam na modulação da resposta imunológica e na proteção de tecidos danificados. O efeito tem sido positivo na recuperação dos pacientes e está relatado repetidamente em vários desses ensaios, mesmo em pacientes idosos em estágio avançado da doença.
Paulo Brofman informou que nos Estados Unidos, por exemplo, os testes com célula tronco já têm aprovação da Food and Drug Administration, agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos, equivalente à Anvisa, no Brasil.