Por Carolina Moraes, da Folhapress
BRASÍLIA – A gestão de Mario Frias na Secretaria Especial de Cultura foi marcada por apoiar publicamente projetos culturais sobre armas e chegou a prometer bilhões da Lei Rouanet para produções sobre armamentos.
Agora, o ex-secretário da pasta e outros dois funcionários do alto escalão de sua gestão são apoiados pelo maior grupo armamentista do Brasil em suas candidaturas para o Legislativo.
Além do ex-“Malhação”, estão entre os 80 candidatos apoiados pelo Proarmas nesta eleição André Porciuncula, que comandava a secretaria de fomento da pasta, e Felipe Carmona, ex-secretário da área de direitos autorais do governo.
Frias é candidato a deputado federal por São Paulo enquanto Carmona tenta uma vaga na Assembleia Legislativa paulista. Já Porciuncula tenta sair como deputado federal pela Bahia.
Frias e Porciúncula inclusive chegaram a se tornar alvo de representações junto à Procuradoria-Geral da República, a PGR, e ao Tribunal de Contas da União, o TCU, após defenderem a utilização da Rouanet para financiar conteúdos pró-armas.
A deputada federal Talíria Petrone, do PSOL do Rio de Janeiro, acusou ambos de usarem seus antigos cargos para divulgar opiniões de caráter pessoal e de fazer uso de recursos públicos em benefício de grupos que poderão favorecê-los eleitoralmente.
Como mostrou levantamento feito pela Folha de S.Paulo, o Proarmas apoia 80 candidatos nesta eleição, entre os quais policiais que respondem a acusações de homicídio e violência contra a mulher, entre outros crimes. Em comum, todos os candidatos são favoráveis à reeleição de Jair Bolsonaro, do PL, também entusiasta do armamento da população.
Porciuncula, que é ex-policial militar, anunciou que a secretaria estava lançando dois grandes eventos nos quais a “princesa é a arma de fogo” quando ainda comandava o fomento.
“Pela primeira vez vamos colocar dinheiro da Rouanet em um evento de arma de fogo, vai ser super bacana isso”, afirmou ele, num evento de março deste ano. Porciuncula ainda sugeriu que a população se armasse contra o Estado, que chamou de criminoso, citando as restrições adotadas por governadores durante a pandemia como exemplo de crime.
Essa gestão ainda assentiu que um projeto sobre a história das armas no Brasil captasse recursos pela Lei Rouanet. A única apoiadora da produção do livro “Armas & Defesa: A História das Armas no Brasil” foi a fabricante de armas Taurus, que destinou R$ 336 mil ao projeto. A aprovação e apoio ao projeto foram revelados pela agência Pública.
Este foi o primeiro projeto pró-armas que a Taurus apoiou e o quarto a que mais destinou verba na Rouanet. Entre as sete iniciativas que a empresa financiou estão atividades para um memorial do Holocausto no Rio de Janeiro e um projeto de oficinas de música e artes visuais para pessoas em situação de vulnerabilidade social.
De acordo com dados da secretaria, o livro terá tiragem de 3.000 exemplares e também uma edição eletrônica gratuita e aborda os marcos da história armamentista no país, dos povos indígenas até o século 21, apresentando artefatos e objetos utilizados como armas de defesa e caça.
E não foi só esse órgão que defendeu projetos armamentistas dentro da cultura no governo Bolsonaro. O Iphan, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, criou um grupo de trabalho para estabelecer o valor cultural das armas de fogo.
O grupo de trabalho deveria desenvolver uma proposta com “critérios de avaliação de armas de valor cultural, com vistas a emissão de parecer referente ao valor cultural de material bélico” em geral. A partir dessa avaliação, os objetos seriam então destinados a acervos de museus ou descartados, de acordo com a portaria.
O documento foi assinado por Leonardo Barreto, diretor do Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização, um dos cargos mais importantes da gestão patrimonial nacional, sediado em Brasília.