Devido ao vocabulário muitas vezes entediante, e também pela educação precária que não prepara a população para uma capacitação mais crítica, o debate econômico pode se distanciar de tal maneira da percepção da dinâmica social, que a economia parece não mais fazer parte dos condicionantes que determinam a realidade. Da mais individual, até a mais histórica e macroscópica.
Um fato que parece passar despercebido diante das notícias das últimas semanas, pelo menos para alguma parte do público, é que a chamada crise da segurança pública – que implicou semana passada numa ação claramente populista por parte do presidente Michel Temer – tem sua gênese muito associada à crise econômica da conjuntura, ou melhor, mais do que isso, sua gênese é histórica, e é absolutamente indissociável da desigualdade social e do subdesenvolvimento.
Longe de aderência popular, mas extremamente assíduo nos telejornais e manuais de economia ortodoxa, existe uma aparente unanimidade técnica sobre o que fazer para curar o sistemático problema das contas públicas brasileiras. O “ajuste fiscal”, que corresponde a uma política de austeridade, não é capaz de solucionar – ou mesmo encaminhar uma solução – para o desenvolvimento. Porém além disso, é preciso questionar duramente se este é capaz, de fato, de ser a terapêutica necessária para o Brasil nesse momento.
Dentro da filosofia, o termo “austeridade” é uma grande virtude do ponto de vista moral. Se atribui essa característica a alguém sóbrio e parcimonioso. Contudo, na economia, por mais que o sentido empregado tente ser o mesmo, é bastante discutível que consiga ser dessa maneira.
Na academia, essa ideia – como toda a ortodoxia – é financiada pelas elites econômicas, claro. Muito por isso detém certa estabilidade nesse meio, mas também, cada vez mais acumula críticos pelo mundo, que tentam reverter essa hegemonia. Isto é, longe de ser apenas um embate intelectual, certas correntes de pensamento são mais ou menos patrocinadas de acordo com os interesses dos poderosos. A luta de classes sempre está presente, movimentando a história.
Mas afinal, no que consiste tal medida? Para elucidar, é interessante pensar no contrário, e na mitologia que a cerca. O gasto público – ao contrário do que diz o mito que o compara ao gasto familiar – é algo capaz de, dependendo da maneira que é feito, criar receita. O Estado pode interferir na taxa de juros, câmbio, pode impactar na totalidade da demanda e da oferta, e tentar controlar a inflação, por exemplo. Tudo isso determina diretamente em sua receita. Enquanto isso, as famílias não possuem essa capacidade – ou pelo menos não a minha.
Diante das medidas desenvolvimentistas, que aumentam o poder de compra da população ao distribuir renda e riqueza, a austeridade tem o seu oposto. Nos fazendo conviver com o perigo iminente da aniquilação de serviços públicos, queda da arrecadação, e com a crescente precarização do emprego, como maneira de combater o desemprego.
Isto é, em linhas gerais, a ideia consiste que, em momentos de desaceleração econômica, aumento da dívida pública, e rebaixamento das notas de créditos, o cenário demanda um severo corte que reduza os gastos públicos, de forma a retomar a confiança dos investidores internacionais. Trazendo de volta o equilíbrio na economia, o crescimento econômico, e o manejo mais saudável da dívida pública.
O primeiro grande problema no ponto de vista da economia se dá pelo fato recorrente – como demonstra as experiências de austeridade – que a diminuição generalizada do gasto no orçamento público leva, quase que fatalmente, à diminuição de sua própria arrecadação. Continua…
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