Neste domingo, 26, os mesmos “militantes” que organizaram manifestações em 2015 e 2016 pedindo “Fora Dilma e Fora PT” voltaram às ruas, mas com um estranho discurso: apoio à Operação Lava Jato e fim do foro privilegiado para julgamento de políticos. Eu meio a uma enxurrada de denúncias contra políticos do PMDB no âmbito da Lava Jato, os manifestantes se comportaram como se nada estivesse acontecendo no Brasil.
Agora que o PT e Dilma estão fora do poder central de Brasília, os filhotes da velha e desgastada direita ficaram sem discurso e não agregam mais apoio às suas reivindicações. As manifestações foram um fiasco. A Avenida Paulista, símbolo das manifestações anti-Dilma, tinha um quarteirão ocupado com pessoas dispersas. Em algumas capitais, o público não chegou a mil pessoas.
Mas vamos aos motivos das manifestações. Se há interesse em barrar a Operação Lava Jato, os maiores interessados são os acuados políticos do PMDB, que passaram nos últimos meses ao centro do furação. Michel Temer, ao contrário de Dilma, já foi citado diversas vezes por delatores como negociador de esquemas espúrios com empreiteiras. Os principais ministros de seu governo caíram após denúncias no âmbito da Lava Jato; outros estão pendurados. Nunca se viu tantos ministros envolvidos. Mas nenhum grito de “Fora Temer” foi ouvido no domingo.
Quanto a outro ponto reivindicado, o fim do foro privilegiado, ou há uma avaliação ingênua do tema ou os manifestantes estão ali para prestar apoio aos maus políticos. Quem conhece a engrenagem da Justiça brasileira sabe que qualquer político gostaria que o foro para julgamento de ações contra ele fosse o dos tribunais locais.
Qualquer político torce para que as investigações contra si caiam nas mãos do Ministério Público de seu estado. É ali que ele sabe se relacionar melhor com promotores e procuradores. No Amazonas, temos exemplos recentes: uma série de denúncias e suspeitas de falcatruas estão dormindo nas gavetas do MP-AM.
Recentemente, o Tribunal de Justiça do Amazonas fez mudança na composição do TRE-AM (Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas), logo depois da cassação do governador José Melo, em 2016. Meses depois, em outro julgamento com denúncias semelhantes às do primeiro processo, os novos julgadores do TRE absolveram o governador.
Os novos membros do TRE-AM não enxergaram os mesmos problemas encontrados pelos julgadores do primeiro processo. Portanto, basta uma mudança desse tipo para livrar um político, uma vez que o juiz julga de acordo com sua consciência.
Mas não é só isso. Pelo grau de amizade na esfera estadual entre gestores e julgadores, os processos às vezes passam de mão em mão porque o magistrado se julga suspeito.
Com o foro privilegiado, o governador e os membros do Tribunal de Justiça só podem ser julgados no STJ (Superior Tribunal de Justiça); deputados e senadores (a maioria ex-governadores) só podem ser julgados no STF (Supremo Tribunal Federal), onde os interesses são mais difusos e onde dificilmente se encontrará motivo para impedimentos dos julgadores.
O que precisa ser feito é dar celeridade aos julgamentos de políticos. E isso nada tem a ver com o foro privilegiado, mas com a decência dos julgadores. Não dá para aceitar que um ministro do governo de plantão, como foi o caso de Alexandre de Moraes, se transforme de uma hora para outra em ministro do STF, que está abarrotado de processos contra seus amigos mais chegados.
Contra isso, nada se ouviu nas manifestações de domingo.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
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