Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Após mentir para a Justiça do Amazonas no mês passado para não pagar custas processuais em uma ação movida contra a Águas de Manaus, o vereador Dione Carvalho (Patriota) usou a sessão da CMM (Câmara Municipal de Manaus) na manhã desta terça-feira (3) para proferir mais mentiras e atacar jornalistas.
Na última sexta-feira (30), o ATUAL publicou com exclusividade que o vereador alegou que é “pessoa sem poder aquisitivo, desempregado, sofrendo com a pandemia” e “trabalhando na condição de autônomo” em recurso apresentado em julho deste ano no TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) para não pagar as custas processuais no valor de R$ 2,9 mil.
A ação contra a concessionária Águas de Manaus foi ajuizada em 2020, ocasião em que Dione pediu gratuidade da Justiça. No mesmo ano, a juíza Ida Maria Costa de Andrade, da 15ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho, mandou ele apresentar comprovantes de renda, mas ele não apresentou. Em junho deste ano, a magistrada negou o pedido de isenção das taxas.
Na decisão proferida no dia 9 de junho de 2021, quando Dione já era vereador, a juíza mandou ele pagar as taxas no prazo de cinco dias, sob pena de extinção do processo. No entanto, em vez de pagar o valor, Dione apresentou recurso no dia 12 de julho deste ano, seis meses após tomar posse como vereador, alegando que está desempregado. Veja o trecho do documento.
Nesta terça-feira (3), na sessão ordinária da CMM, sem citar o ATUAL, que publicou o conteúdo com exclusividade na última sexta-feira (30), Dione chamou a matéria de “sem fundamento, maléfica, mentirosa e muito tendenciosa”. Ele também afirmou que o “próprio portal que veiculou isso” não quis ouvi-lo.
“Venho aqui nessa casa registrar o que eu considero ofensas. Na última sexta-feira, o portal publicou vinculando a minha imagem e os meus dados a uma matéria sem fundamento, maléfica, mentirosa e muito tendenciosa. Quero parabenizar os portais que me deram direito de resposta porque o próprio portal que veiculou isso não quis falar comigo”, disse Dione.
Dione foi ouvido pela reportagem
Na sexta-feira (30), a reportagem ligou para o vereador para questioná-lo sobre o pedido de isenção no recurso movido no dia 12 de julho. Em quatro minutos, Dione se contradisse. Primeiro, alegou que já havia pagado as custas processuais; depois disse que não tinha conhecimento do andamento do processo, e ameaçou reiteradas vezes processar o ATUAL.
“Eu tenho como provar que eu paguei as custas”, disse Dione. A reportagem questionou se ele tinha comprovante e o vereador afirmou: “Eu não vou te enviar porque não te conheço. Eu não sei nem se é você que está falando mesmo. Mas se vocês quiserem colocar o que vocês quiserem, podem colocar, mas tenha certeza que, se não for verdade, vocês serão processados”, disse.
Em seguida, a reportagem perguntou se ele havia pago as custas antes do dia 12 de julho e ele respondeu: “Pra te falar a verdade, Felipe, eu não tenho nem conhecimento do que está acontecendo neste processo. Eu não sei porque isso está com a minha assessoria jurídica, mas há muito tempo que eu não tenho ciência desse processo”, disse Dione.
A reportagem não manipulou dados
O vereador sugeriu que a reportagem manipulou dados ao afirmar que a matéria cita o processo aberto em 2020, quando ele não era vereador, e publica como se fosse um processo novo. Na verdade, a reportagem deixa claro que a ação inicial foi aberta no ano passado, mas o recurso contra a decisão da juíza com as alegações de dificuldades financeiras foi apresentado em julho deste ano.
“Em 2020, antes de ser vereador ou em pensar em concorrer a uma vaga na Câmara Municipal de Manaus, eu entrei com uma ação contra a Águas de Manaus, no período de pandemia, simplesmente porque chegou pra mim uma conta no valor de R$ 108 mil, abusiva. O meu advogado fez pra mim um termo de gratuidade, justiça gratuita”, disse Dione.
“No momento eu estava sem condições de pagar e desempregado. Esse processo foi dado entrada em 2020. Esse portal pegou esse processo, atualizou colocando que eu sou vereador, alegando que eu não tenho como pagar. E isso é uma coisa mentirosa. Todos sabem que nós somos vereadores e que eu tenho condições de pagar hoje”, completou o vereador.
Ao afirmar que a alegação de hipossuficiência é “mentirosa”, Dione contesta a própria afirmação dele no recurso.
O recurso de Dione foi assinado pelo advogado dele, José da Rocha Freire, no dia 12 de julho de 2021, conforme trecho do documento que o ATUAL teve acesso. Até então, o parlamentar já havia recebido da CMM (Câmara Municipal de Manaus) R$ 65 mil líquidos, conforme o Portal da Transparência da Casa Legislativa.
Vereador não comprovou pagamento
Como mostrado anteriormente, Dione não quis enviar comprovante de pagamento das custas processuais, apesar de alegar que havia quitado as taxas. Na sessão da CMM desta terça-feira, o vereador voltou a afirmar que pagou e mostrou um documento, mas não o disponibilizou para que se verificasse a veracidade do mesmo.
“Eu procurei um dos meus advogados que fez a petição contra a Águas de Manaus e eu falei pra ele que queria pagar. E ele imprimiu e eu paguei. Está aqui. Isso aqui prova que os portais maliciosos que estão colocando isso são mentirosos. Está aqui a taxa. Eu paguei. O processo foi peticionado no ano passado, eu não era vereador”, disse Dione.
Além disso, no último dia 13 de julho, a desembargadora Maria das Graças Figueiredo, do TJAM, acatou o recurso do vereador e o dispensou de pagar as custas processuais sob argumento de que, para a concessão, “a lei disciplina ser necessária apenas a simples declaração de pobreza”. A magistrada disse que não havia provas de que Dione poderia arcar com as despesas da justiça.
Dione ameaçou os jornalistas com um projeto de lei
O vereador Dione Carvalho afirmou na sessão da CMM que existe uma lei que pune aqueles que publicarem “algo que venha prejudicar qualquer um cidadão” e ameaçou recorrer a ela contra os responsáveis pela matéria.
Mas ele citou o Projeto de Lei nº 2.630/2020, do Senado Federal, mais conhecido como “PL das Fake News”. Diferente do que alegou o vereador, a matéria citada não é uma lei, mas uma proposta que ainda está sendo discutida na Câmara Federal.
“Quero dizer aos portais que falam mentira, que publicam uma coisa que não é verdadeira, que existe hoje uma lei, a PL 2.630/2020, ela foi criada para ter a responsabilidade de transparência (sic). Essa lei pune portais, blogs e meios de comunicação que colocarem algo que venha a prejudicar qualquer um cidadão, seja ele quem for”, afirmou Dione.