A Amazônia está bem representada na 13ª edição do Women’s Worlds Congress, o Congresso Mundos de Mulheres que acontece pela primeira vez na América do Sul. Trata-se do maior e mais importante evento de estudos e intercâmbio de experiências de organização social e atuação política das mulheres em toda parte do mundo. Nos últimos anos o Congresso Mundos de Mulheres foi realizado em Israel, Holanda, Irlanda, Estados Unidos, Costa Rica, Austrália, Noruega, Uganda, Coreia, Espanha, Canadá e Índia.
Este ano foi a vez do Brasil reunir mais 8.500 participantes, a maioria mulheres, para conferências, simpósios, apresentação e debate de estudos, mesas redondas, rodas de conversas e as mais diversificadas formas de participação para debater os problemas que afetam as mulheres do mundo inteiro e socializar experiências bem sucedidas de políticas públicas para mulheres e o enfrentamento à violência sexual e doméstica, ao feminicídio e aos atentados contra os direitos humanos.
O 13º Congresso Mundos de Mulheres realiza-se no formato de congresso internacional sediado no Instituto de Estudos de Gênero da Universidade Federal de Santa Catarina, na cidade de Florianópolis, de 30 de julho a 4 de agosto e conta com a participação ativa e efetiva de diversos setores dos estudos feministas para aprofundar as teorias das relações de gênero e o papel das mulheres nas sociedades.
Representantes do mundo inteiro estão presentes e reafirmam que a luta feminista é cotidiana e repleta de desafios, e se atualiza nas discussões promovidas em cada encontro, nas trocas de experiências, propostas de ação e no aprofundamento de situações locais. Neste ano, a temática central do Congresso Mundos de Mulheres é a questão das “Transformações, Conexões, Deslocamentos”.
O 13º Mundo de Mulheres converte-se num espaço de diálogo e trocas de experiências com participação de mulheres de todos os seguimentos da sociedade, com presença expressiva de negras e indígenas que tem imprimido ao evento um caráter multicultural promovendo a troca de conhecimentos e valorizando saberes ancestrais guardados e reproduzidos pelas mulheres dos mais diversos países com suas mais variadas experiências de conhecimento acadêmico-científico e tradicionais.
O congresso tem sido também um espaço importante de reafirmação do papel do ativismo das mulheres nos diversos movimentos sociais e organizações populares do mundo inteiro. Um espaço ímpar para se conhecer melhor os desafios e perspectivas das mulheres nos cinco continentes.
O evento transcorre simultaneamente com o 11º Seminário Internacional Fazendo Gênero que se tornou uma referência dos estudos de gênero no Brasil. Dentre as diversas atividades, a Marcha Mundial das Mulheres é um dos grandes destaques e mobiliza participação de mulheres que não estão participando do evento, mas, de alguma maneira, estão na luta e na campanha permanente “contra a pobreza e a violência sexista” fazendo uma crítica contundente ao sistema capitalista e seu modelo de exploração do trabalho e da dignidade das mulheres e de toda sociedade.
O evento vem destacando alguns compromissos com destaque especial para a garantia dos direitos das mulheres imigrantes, negras e indígenas, valorizando a luta e o protagonismo destas mulheres articuladas em redes de apoio e na dinâmica da economia solidária realizada por mulheres urbanas e rurais reafirmando que as “mulheres são sujeitos ativos e protagonistas na luta pela transformação de suas vidas vinculada à necessidade de superar o sistema capitalista patriarcal, racista, homofóbico e destruidor do meio ambiente”.
Diversos movimentos de mulheres e diversos grupos de pesquisas de estudos de gênero definem a presença da Amazônia no evento através de Simpósios Temáticos, Fóruns de Debate, Minicursos, Oficinas, Pôsteres (para estudantes de graduação e PIBIC/EM), Mostra Audiovisual, Exposição Arte e Gênero, Mostra de Fotografias, dentre outras modalidades que provocam importantes debates acerca dos desafios das migrações transfronteiriças, intersecções de gênero, identidade e cidadania, questões indígenas, negras e camponesas.
Por fim, destacamos alguns trechos do manifesto do Congresso Mundos de Mulheres:
“Nós, sujeitas marginalizadas ao longo da história, de todos os continentes, reunidas no 13º Congresso Mundos de Mulheres e Seminário Internacional Fazendo Gênero 11, estamos nas ruas de Florianópolis, neste 2 de agosto de 2017, para chamarmos a atenção do mundo para a luta cotidiana dos movimentos de mulheres, LGTTTQI, com deficiência, gordas, negras, indígenas e feministas. Lutamos contra este sistema patriarcal, racista, capitalista, ultraliberal, fundamentalista religioso, que nos subjuga, oprime, violenta e mata.
Nossa luta é pela vida de todas as pessoas oprimidas em todas as partes do mundo! […] seja nos territórios quilombolas, indígenas, seja no campo ou na cidade, nas águas e nas florestas, nas escolas e nas universidades, estamos juntas!
Seguimos marchando e construindo uma sociedade justa, com igualdade e equidade de direitos para todas/es/os. […] Para denunciar as múltiplas violências, opressões e assédios, físicos e psicológicos, que sofremos diariamente nas ruas, nos ônibus, nas escolas, nos espaços de lazer, na mídia e dentro de nossas casas, no campo e na cidade; o feminicídio, realidade em um mundo que naturaliza e banaliza o ódio e o assassinato de mulheres pelo fato de serem mulheres; as violações das nossas vidas provocadas por um modelo de Estado patriarcal e capitalista presente em todos os continentes, que se fundamenta na conformação dos nossos corpos em objetos e mercadorias; a omissão dos governos, a inexistência de políticas públicas e de estrutura para o enfrentamento efetivo das violências contra as mulheres em diferentes partes do mundo; a ausência de mulheres em espaços importantes de poder e decisão como reflexo do modelo de política e representação patriarcal vigente no mundo, onde as mulheres ainda são discriminadas e boicotadas; a cultura do estupro, que ‘culpabiliza’ as vítimas, mantém os estupradores impunes e naturaliza a violência sexual; […] o racismo que estrutura a sociedade, produz e reforça as desigualdades sociais; a discriminação racial que violenta e mata principalmente as pessoas negras e indígenas com as armas do Estado e do capital; a expropriação violenta de terras, sementes e recursos ambientais das mulheres do campo e das florestas pelo agronegócio; a expropriação dos filhos de mulheres quilombolas, indígenas e de camadas populares como recurso para atingir e fragilizar essas comunidades […].
O texto do manifesto na íntegra pode ser lido no link:
Marcia Oliveira é doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia (UFAM), com pós-doutorado em Sociedade e Fronteiras (UFRR); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia, mestre em Gênero, Identidade e Cidadania (Universidad de Huelva - Espanha); Cientista Social, Licenciada em Sociologia (UFAM); pesquisadora do Grupo de Estudos Migratórios da Amazônia (UFAM); Pesquisadora do Grupo de Estudo Interdisciplinar sobre Fronteiras: Processos Sociais e Simbólicos (UFRR); Professora da Universidade Federal de Roraima (UFRR); pesquisadora do Observatório das Migrações em Rondônia (OBMIRO/UNIR). Assessora da Rede Eclesial Pan-Amazônica - REPAM/CNBB e da Cáritas Brasileira.
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