Nesta quinta-feira (10 de março), o Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental – Sares – realizou a aula inaugural do Curso de Extensão Direito Humano à Água e ao Saneamento na Amazônia. O curso tem o apoio da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos – e da Universidade Católica de Pernambuco – Unicap, recebendo a chancela da Unesco, através da Cátedra de Direitos Humanos e Violência, Governo e Governança e da Cátedra de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara.
O evento é oferecido no formato remoto (online) e teve, neste momento inaugural, a participação do professor Dr. Castor Mari Martin Bartolome Ruiz, docente da Unisinos, que proferiu a palestra intitulada “o direito humano à água e ao saneamento básico no contexto da crise do nosso modelo civilizatório: o antropoceno, a justiça ambiental e ecologia integral”. Na exposição, Castor caracterizou a crise civilizatória provocada pela ação humana, que coloca em perigo milhares de espécies e cria as condições para mais uma perigosa extinção em massa.
O pesquisador mostrou que a humanidade optou por um modelo de civilização equivocado, que prima pela produção ilimitada, sem respeitar os limites do planeta. Este modelo criou a cultura da descartabilidade, que transforma a alteridade em objeto desnecessário e é responsável pela produção de grandes quantidades de lixo e dejetos tóxicos, prejudicando o próprio homem e a natureza. Com o predomínio do sistema capitalista, é possível também perceber uma forte tendência à mercantilização das formas de vida, levando à destruição dos bens comuns e transformando tudo em produto de compra e venda.
Com a supervalorização da propriedade privada, a nossa civilização concebe como normal o direito do ser humano se apropriar, usar e abusar de tudo, desconsiderando a dignidade dos seres vivos e a importância do cuidado e da preservação do meio ambiente. Tal atitude, consequentemente incentiva a colonialidade e a colonização da vida à medida que se projeta como prática comum as relações de poder que levam à desfiguração do ser humano e à devastação do planeta. Assim, a natureza deixa de vista como vida e passa a ser considerada mera peça de museu, isolada e separada do homem.
Todas essas dinâmicas são materializadas em políticas, normas e condutas que ignoram a sacralidade da vida, tornando os bens comuns sujeitos à racionalidade da apropriação. Segundo o professor, a privatização da água ilustra muito bem estes dinamismos geradores de tragédias que colocam a vida em perigo. Desta forma, Castor endossa as resistências de grupos que rejeitam a entrada do mercado em setores fundamentais como o saneamento, uma vez que estes constituem bens essenciais para a existência.
O Curso de Extensão Direito Humano à água e ao saneamento pretende mostrar as contradições e conflitos provocados pelo modelo de civilização adotado na Amazônia, revelando as feridas que ele abriu ao longo da história. No entanto, busca também apresentar as potencialidades da região em construir a cidadania hídrica, não somente possibilitando o acesso da água e do saneamento a todos os cidadãos e cidadãs, mas também alimentando a esperança de que o homem possa conviver com a natureza sem agressão e destruição.
Sandoval Alves Rocha Fez doutorado em ciências sociais pela PUC-RIO. Participa da coordenação do Fórum das Águas do Amazonas e associado ao Observatório Nacional dos Direitos a água e ao saneamento (ONDAS). É membro da Companhia de Jesus, trabalha no Intituto Amazonizar da PUC-Rio, sediado em Manaus.
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