
Por Teófilo Benarrós de Mesquita, do ATUAL
MANAUS – A seca dos rios muda a rotina de moradores e a economia em municípios do Amazonas. Tefé, na região central do estado e a 532 quilômetros de Manaus, é um dos mais afetados. A água desapareceu da orla e de bairros com acesso pelo rio, como Abial, Colônia Ventura, Beira Rio, Santa Rosa e Centro, na área histórica conhecida como Muralha. Aulas foram suspensas e o abastecimento de alimentos é precário.
Na aldeia Porto Praia, na ilha do Tarará, no igarapé Xidarini e no lago de Tefé o que restou de água é apenas um fio de córrego. Uma extensa faixa de areia predomina na paisagem. Municípios vizinhos, como Alvarães e Uarini, também sentem os efeitos da vazante.
Em vídeo institucional nas redes sociais da Prefeitura de Tefé, o coordenador da Defesa Civil, Edvilson Braga, expõe as dificuldades enfrentadas pelos moradores.
“Este cenário vem ocasionando dificuldades ao acesso às cidades banhadas pelo rio Solimões e também às comunidades. São 70% das comunidades sem acesso a insumos, água potável e interrupção do acesso dos alunos à escola”, diz Braga.
Anildo Silva, cacique da aldeia Porto Praia, área atingida pela seca, também relata obstáculos impostos pela escassez de água. “Estamos passando por dificuldades devido [a demora] ao transporte até chegar na nossa comunidade. A gente não tem mais água”.

Professor de Geografia na rede pública de Tefé, Ricardo Meza disse que a a economia da região foi impactada pela seca e a população sente a alta de preços de alguns produtos, principalmente alimentos.
“A economia de Tefé e cidades vizinhas sentiu os efeitos da seca. As embarcações não conseguem chegar às cidades. Em razão disso a cobrança dos valores para cobrir o trajeto e dos gêneros alimentícios estão mais caros”, diz o professor. Meza afirma que esta seca superou a de 2010, a maior até então no município.
A cidade de Tefé exerce influência econômica sobre municípios vizinhos como Alvarães, Uarini, Fonte Boa, Maraã, Jutaí, Carauari, Eirunepé, São Paulo de Olivença, Santo Antônio do Içá e Tabatinga.
Comércio e aulas

Em Uarini, distante 56 quilômetros de Tefé em linha reta, há dificuldade de deslocamento entre a cidade e o porto. “O pessoal tem que caminhar mais de 3,5 quilômetros. Mesmo usando moto ou carro” entre as embarcações e a terra firme”, diz Francenildo Mamédio dos Santos Lopes, professor da Escola Municipal Santiago Canayo Peres.
“Isso quando não chove. Aí fica intrafegável devido a lama que se transforma”, completa Francenildo. “Se continuar essa seca corremos o risco de ficar sem alimentos devido à dificuldade dos barcos entrarem no município”, alerta.

“Uma outra dificuldade que estamos enfrentando é o deslocamento dos alunos até a cidade e o seu retorno à sua comunidade”, diz o professor.
Aumento de preços
Em Alvarães, a 14 quilômetros de Tefé, o deslocamento também está prejudicado.
“O percurso Nogueira/Tefé/Nogueira, comunidade mais próxima de Tefé, que durava 15 minutos e custava R$ 30, agora demora uma hora e dez minutos e custa R$ 80”, afirma um funcionário público e morador da cidade, que pediu para não ter o nome revelado.
“Não tem como chegar [com facilidade] a Alvarães, que fornece tudo a todas as comunidades”, diz.
Em Tefé, a prefeitura decretou Situação de Emergência, conforme decreto nº 0132, de 11 de outubro de 2022.


La Niña
A estiagem severa que ocorre principalmente no oeste do Amazonas está relacionada ao fenômeno La Niña (variabilidade climática ligado ao resfriamento das águas do Oceano Pacífico Tropical), explica o geólogo Naziano Pantoja Filizola Júnior, especialista em Hidrologia da Amazônia e professor do Departamento de Geologia da Ufam (Universidade Federal do Amazonas).
Segundo Naziano, o fenômeno ocorre desde a primavera de 2020. “Portanto, o período de 2020-2022 está sendo caracterizado por três ocorrências de La Niña consecutivas. Em geral, e muitos trabalhos científicos dão conta disso, a ocorrência de eventos climáticos desse tipo estão relacionadas a uma tendência de estiagem na porção mais a oeste da Amazônia e às vezes no sudoeste também”, afirmou.
Não é possível estimar a duração da estiagem, mas a tendência é que moradores de áreas afetadas vão ficar muito tempo sem ver água nos lagos e paranás.