A revista The Economist desta semana fez uma densa reportagem com respeito à Amazônia: ‘Relógio da morte para a Amazônia’. Nos dois longos textos que detalham a capa há uma cuidadosa e bem escrita análise dos dilemas que envolvem a região. Também há um podcast no qual a editora da revista debate o texto com um de seus autores. É uma linha de análise típica do periódico inglês e menos atrelada a “lados”, como costumam ser os nossos jornais.
Há no texto uma preocupação sobre o risco de se chegar em breve a um ponto irreversível para a destruição da floresta. Nela também estão muito números maiúsculos, como os 800 mil km2 de florestas subtraídos do Brasil desde os anos 1970 e a volta do crescimento do desmatamento de 2013 para cá, após uma queda nas taxas entre 2004 e 2012. Há uma discussão sobre as secas e o aumento de temperatura, ou seja, vai-se muito além das curtas análises feitas pela mídia nacional (inclusive quando se registra a reportagem). Apenas pelos dados e informações compiladas, o texto já é interessante.
Faz-se necessário ir além das análises sobre os governos recentes, entre 2013 e o presente, para que não caiamos na armadilha típica de quem reflete pensando em apontar culpados. A análise sistêmica deve ir além das pessoas, mas com a ação sobre o todo, pois só assim será possível interferir verdadeiramente na realidade, pois, como destaca a reportagem, o Novo Código Florestal (2012) foi o ponto de inversão na tendência, agravado por ato de 2017 sobre privatização de áreas públicas. Entre julho/2017 e julho/2018 a floresta teria perdido quase um bilhão de árvores, em 7.900km2.
Como moradores da região, deveríamos ser os maiores interessados em conduzir estes debates, passos e reflexões. Entretanto, preferimos concordar ou discordar do que outros dizem ao nosso respeito. Já passou da hora do Amazonas, Pará e demais Estados que compõem a Amazônia liderarem este debate global sobre como fazer. Chega de debates sobre como não fazer.
Além das medidas legais, existiu uma virada na condição de desenvolvimento do Brasil. Saímos de um dos voos de galinha do país, em um ciclo de prosperidade, para um ciclo de dificuldades e, em minha leitura dos dados, entendo que somado aos atos legais é que construiu esta inversão de tendência. É tão óbvio que a destruição pela destruição não interessa que chega a assustar quando há indícios de líderes que justificam: se outros destruíram em outros lugares, nós também podemos fazer. Como disse, um dos autores do texto: se outros erraram, não precisamos cometer o mesmo erro.
Está na hora de nos levantarmos em direção ao uso responsável dos recursos da região, para que a destruição não seja a única saída para os moradores daqui. Empreender responsavelmente é papel de empresários e não do setor público. Faz-se necessário um conjunto expressivo de infraestruturas para viabilizar este jogo. Faz-se necessário parar de apontar para dados científicos e chamar de mentiras. Há uma luta, onde cientistas (ou seriam pseudocientistas?) querem um isolamento do mundo empresarial e o governo chamando resultados de pesquisas de mentiras.
Precisamos dar os próximos passos e sair deste relacionamento primitivo, recheados de repúdios. Não temos nenhum Prêmio Nobel no país. Quando faremos a atração de interação de pesquisadores de ponta, que estejam associados com inovações tecnológicas e empresas? Tal qual nos anos 1970, quando fizemos uma política de substituição de importação de eletroeletrônicos, talvez tenha chegado a hora de fazermos uma ampla política de junção das mãos dos cientistas com os empresários, com o tempero de muito recurso de capital de risco (e não dinheiro público, como muitos apregoam). Precisamos de bastante liberdade para fazer isso. De outras formas, teremos o risco de criar milhares de quilômetros de cartórios e será muito mais simples matar a mata. As atitudes precisam ser mudadas urgentemente, antes que seja realmente tarde e as previsões alarmistas se confirmem.
Augusto César Barreto Rocha é doutor em Engenharia de Transportes (COPPE/UFRJ), professor da UFAM (Universidade Federal do Amazonas), diretor adjunto da FIEAM, onde é responsável pelas Coordenadorias de Infraestrutura, Transporte e Logística.
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