
No último dia 01 de outubro, o Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental – SARES – realizou uma mesa de discussão sobre a atual tendência brasileira de privatizar os bens públicos, em especial a água. O evento foi transmitido pelas redes sociais da instituição, tendo a cobertura de outros meios de comunicação, como a Rádio Rio Mar, ligada à Arquidiocese de Manaus.
A mesa foi diversificada, sendo composta pelos especialistas Ademir Ramos e Eduardo Colmanetti, além de lideranças indígenas, como Helen Greice e Domingos Vieira, representantes da Comunidade Indígena Nova Vida e da Comunidade Povo Indígena do Sol Nascente, situadas em Manaus. Todos eles repudiaram a agressão à natureza e à população expressa no projeto de construção do Porto das Lajes e na gestão privada do saneamento na cidade.
O antropólogo Ademir Ramos, professor da Universidade Federal do Amazonas, destacou que o projeto de construção do Porto das Lajes no frontal do Encontro das Águas representa uma agressão à Amazônia, pois este espaço é o cartão postal da região, que mostra a nossa riqueza paisagística, histórica, arqueológica, cultural e natural. O prof. enalteceu o tombamento do Encontro das Águas, que se deu graças a mobilização da sociedade civil, religiosos e muitos personalidades locais, como Thiago de Melo, Milton Hatoum, Márcio Souza, Tenório Teles e outros.
Mesmo sendo tombado como patrimônio cultural, o Ademir enfatizou a necessidade de que o Encontro das Águas seja tombado como patrimônio da humanidade para acentuar a sua importância, uma vez que grupos poderosos de empresários, apoiados pelo governo do Estado, querem flexibilizar as regras ambientais para viabilizar a construção do porto de Porto das Lajes, ocasionando a destruição do magnífico Encontro das Águas. O Professor reforçou a postura assumida pelo SARES e o Fórum das Águas, repudiando qualquer negociação que favoreça a nefasta construção do porto das Lajes.
A fala de Eduardo Colmanetti, ativista e assessor do Fórum das Águas, concentrou-se na denúncia da privatização do saneamento na cidade de Manaus, que ganha reforço atualmente no governo federal. A denúncia de Comanetti focalizou a experiência da concessão privada dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário de Manaus, mostrando a inconsistência dos argumentos que justificaram a privatização no ano 2000.
O ativista enfatizou a inviabilidade da privatização do saneamento nos tempos atuais, uma vez que o preço das tarifas de água ultrapassou as possibilidades de pagamento de uma população que sofre com o desemprego, com as más condições de habitação e com a pobreza crescente. Essa realidade já é percebida em Manaus, cuja empresa está interessada prioritariamente em gerar lucros às custas do sofrimento da população.
Colmanetti destacou que a política de privatização já não encontra respaldo em vários países do mundo, que chagaram a remunicipalizar os serviços pelo baixo desempenho das empresas do mercado da água, que abandonaram os interesses públicos e priorizaram os interesses particulares e empresariais. Essa situação está evidente em Manaus, precisando ser refletida e equacionada urgentemente com a remunicipalização e democratização do acesso à água.
Os dois palestrantes sublinharam a importância dos jesuítas na Amazônia, chamando a atenção atualmente para a ação dos SARES, que juntos ao Fórum das Águas, têm atuado pela defesa e proteção do meio ambiente, dos povos indígenas e do direito à água e ao saneamento.
As lideranças indígenas Helen Greice e Domingos Vieira denunciaram o abandona que suas comunidades de pertença sofrem por parte do poder público, deixando-as sem escola, saúde e saneamento básico. Para estas lideranças, os processos de privatização têm sido desfavoráveis para os povos indígenas, pois os bens públicos são apropriados pelas empresas privadas, que não respeitam os direitos à moradia e ao território destes povos.
As duas comunidades representadas são formadas por diversas etnias, vivendo uma interessante experiência multiétnica. As lideranças enfatizam a necessidade de o Estado e toda a sociedade se empenharem na defesa dos direitos humanos e coletivos, uma vez que estes têm sido constantemente esquecidos e negligenciados.
A live levantou vários problemas experimentados em Manaus, sobretudo, os processos de privatização que destroem os bens comuns, entregando-os à iniciativa privada que prioriza a lucratividade em detrimento dos serviços às comunidades. A transmissão veio destacar que a água é pública, não podendo ser apropriada pelos empresários, que deixam a população sem os direitos básicos e devastam o meio ambiente através de construções nefastas.
*Sandoval Alves Rocha é doutor em Ciências Sociais pela PUC-Rio, mestre em Ciências Sociais pela Unisinos/RS, bacharel em Teologia e bacharel em Filosofia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (MG). Membro da Companhia de Jesus (Jesuíta), atualmente é professor da Unisinos e colabora no Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (Sares), sediado em Manaus/AM.
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