MANAUS – O superintendente interino da Suframa, Gustavo Igrejas, não conseguiu explicar, na reunião da Comissão de Indústria e Comércio Exterior da Assembleia Legislativa do Estado, na manhã desta segunda-feira, 11, o destino das verbas de pesquisa e desenvolvimento que são captadas a partir de taxas cobradas das empresas de informática da Zona Franca de Manaus. A polêmica foi iniciada na semana passada, quando o deputado Dermilson Chagas (PDT) pediu ao Ministério Público Federal que rastreasse o destino de cerca de R$ 992,2 milhões que teriam ido para o programa do governo federal Ciência Sem Fronteiras.
Nesta segunda-feira, atendendo ao convite da Comissão de Indústria e Comércio Exterior, Igrejas fez uma explanação sobre o destino dos recursos, mas os dados foram contestados por deputados e por técnicos que participaram do encontro a convite dos parlamentares. Um dos pontos questionados foi sobre o percentual dos recursos recolhidos das indústrias que são destinados ao Fundo Setorial CT-Amazônia. De acordo com o superintendente da Suframa, as empresas contribuem com 5% do faturamento, mas apenas 0,5% vai para o CT-Amazônia.
Não é verdade, segundo os técnicos. O Decreto 6008/2006, que regulamentou a destinação dos recursos diz que as empresas que produzem bens de informática na Zona Franca de Manaus devem investir, anualmente, em atividades de pesquisa e desenvolvimento a serem realizadas na Amazônia, no mínimo, 5% do seu faturamento bruto no mercado interno. Desse montante, 2,3% serão aplicados da seguinte forma: no mínimo 1% nos centros ou institutos de pesquisa ou entidades brasileiras de ensino com sede na Amazônia Ocidental, mediante convênio; e percentual não inferior a 0,5%, na forma de recursos financeiros, serão depositados trimestralmente no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Esse fundo nacional é formado por outros 16 fundos, inclusive o CT-Amazônia.
Os outros 2,7% são destinados ao Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Setor de Tecnologia da Informação na Amazônia, cuja gestão é do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, por meio da Suframa, com a assessoria do Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento da Amazônia (CAPDA). Diz o decreto que dos 2,7%, até dois terços devem ser aplicados no programa acima mencionado. Para isso, serão depositados no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, na categoria de programação específica destinada ao CT-Amazônia em suas respectivas ações, devendo ser mantidos em separado os recursos referidos em cada dispositivo. Portanto, o Fundo Nacional recebe recursos da Suframa de duas formas, mas não está claro qual o volume de dinheiro que vai parar nesse fundo, de onde sai verba para custear o Programa Ciência Sem Fronteiras.
Contestado, o superintendente da Suframa demonstrou desconhecer o assunto a fundo. Os técnicos da Suframa que acompanhavam Gustavo Igrejas também não souberam responder os questionamentos calçados nas informações contidas no Decreto 6008/2006. Sem saber explicar o valor arrecadado e a destinação dos recursos, Igrejas prometeu pediu informações dos dois ministérios que são responsáveis pela aplicação dos recursos: o de Ciência, Tecnologia e Inovação e o de Desenvolvimento Industria e Comércio Exterior.
Desvio, não
Gustavo Igrejas contestou a forma como as informações chegaram à opinião pública. “Quando se fala em desvio parece que o gestor tirou o dinheiro de lá e colocou no bolso. Eu não tenho nada no meu histórico profissional que me desabone. Tenho 28 anos de Suframa, nunca tive problemas com órgão de controle. Estou lá para prestar um serviço que foi me pedido do ministro e estou aguardo a definição do novo superintendente”, disse. Os deputados explicaram que não havia suspeita de desvio de conduta do superintendente, mas de desvio de finalidade na aplicação dos recursos.
Em seguida, Igrejas assumiu que houve erro nas notas da Suframa sobre o assunto e afirmou que poderá acionar os dois ministérios para tentar esclarecer o destino da verba. “A questão do fundo, nós erramos na primeira nota. Agora, desculpa, nunca ninguém aqui errou nada? Eu estou assumindo meu erro e vindo a público dizer que houve o erro e por isso saiu a segunda nota. Agora eu posso, com a equipe técnica, oficiar o MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação) e o Mdic ( Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) para que efetivamente venham a público trazer a notícia se saiu ou não saiu recurso do CT Amazônia para o Ciência sem Fronteiras”, afirmou.
Na verdade, nas duas notas a Suframa repete o equívoco de que apenas 0,5% dos 5% do faturamento das empresas que contribuem para pesquisa na Amazônia vão para o Fundo CT-Amazônia. A única verdade nas notas é a contestação sobre o valor de R$ 992,2 milhões que seriam destinados ao Programa Ciência Sem Fronteiras. Esse é o volume de recursos que o Fundo Nacional recebe e destina ao programa e não verba exclusiva da Zona Franca de Manaus.
Sem saber sequer quanto é arrecadado, a Suframa não conseguiu esclarecer o destino do dinheiro. Parte dos recursos foi para o CT-Amazônia, mas há outro montante de recursos, que pode ser ainda maior que os destinados ao CT-Amazônia e sobre o qual a Suframa também não tinha dados para apresentar aos deputados.
Cieam contesta
O superintendente do Cieam (Centro da Indústria do Estado do Amazonas), Ronaldo Mota, afirmou que não ouviu em nenhum lugar declarações que desabonassem o caráter de Gustavo Igrejas e que os dados sobre o funcionamento do CAPDA e dos recursos do pesquisa e desenvolvimento apresentados por ele na exposição não eram exatamente uma novidade para a entidade. Ronaldo criticou a forma como o CAPDA funciona. “Os dados são esses, mas daí a achar que está tudo bem… Não podemos fechar os olhos e dizer que está tudo bem. O CAPDA se reuniu, no ano passado, uma única vez e não foi para aprovar projetos na Amazônia Ocidental”, declarou.
Para Ronado Mota, a confusão sobre as informações se devem à conduta do CAPDA, que repassou os dados sobre a transferência para o programa do Governo Federal Ciência Sem Fronteiras. “Essa confusão se deve ao anúncio que o CAPDA fez. Isso foi um erro de estratégia ou uma falta de assunto. Existe um entendimento geral de que as indústrias se instalam aqui e não deixam dinheiro. Não é verdade. É com incômodo que vemos uma região que precisa desses investimentos não aproveitar os recursos. Os contingenciamentos dessa verba e do TSA são uma vergonha”, declarou.
Audiência pública
Após reunião com Gustavo Igrejas e técnicos da Suframa, o deputado Dermilson Chagas defendeu a necessidade de uma audiência pública com a participação dos demais órgãos federais envolvidos no contingenciamento da verba. O parlamentar quer o rastreamento de todos os recursos que deveriam ter sido aplicados em pesquisa na Amazônia Ocidental e garantir sua aplicação na região.
Para o parlamentar, além do Decreto 6008/2006 vedar a aplicação dos recursos fora do âmbito da Amazônia Ocidental, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação (MEC) responsável pelo controle do Ciência Sem Fronteiras, informou, em nota, que não recebeu o recurso oriundos da Zona Franca de Manaus.
Também participaram da reunião os deputados Abdala Fraxe (PTN) e Bi Garcia (PSDB). Ambos concordaram que sobre a necessidade de ampliar o debate para que a sociedade compreenda que verba está deixando de ser aplicada na região. “O que se entende do debate é que a gente arrecada e o governo federal leva o dinheiro”, disse Bi Garcia. Abdala Fraxe, que presidiu a reunião, elogiou a atuação do deputado Dermilson em levantar o debate do assunto. “Vossa Excelência foi muito feliz em levantar essa tese. Precisamos saber mais do tema e gritar para não sermos engolidos. Podemos até ser engolidos, mas não sem gritar”, afirmou.
Confira as notas divulgadas pela Suframa na semana passada, quando o assunto veio à tona:
Primeira nota da Suframa, em 6 de maio de 2015
Nota de esclarecimento
A Superintendência da Zona Franca de Manaus vem a público esclarecer que são infundadas as informações veiculadas na imprensa amazonense, nesta quarta-feira (6), sobre supostas irregularidades na destinação de R$ 992,2 milhões em verbas de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) da Zona Franca de Manaus. Com relação a essas informações, a SUFRAMA tem o seguinte a declarar:
1) Os recursos captados junto às empresas que produzem Bens de Informática na ZFM, como contrapartida dos incentivos fiscais ofertados e em cumprimento à Lei de Informática, integram o fundo setorial CT-Amazônia, cuja gestão é exercida pelo Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento da Amazônia (Capda). O CT-Amazônia é um dos 15 fundos integrantes do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), este gerido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
2) Os recursos totais captados pelo fundo CT-Amazônia, nos últimos 12 anos (período de 2003 a 2014), equivalem a um montante de R$ 325,719 milhões. Logo, é impossível falar que houve destinação de R$ 992,2 milhões em verbas de P&D da Zona Franca de Manaus ao programa “Ciência sem Fronteiras”, uma vez que o valor arrecadado em doze anos não equivale a nem um terço desse total.
3) O valor de R$ 992,2 milhões tem a ver, na realidade, com o repasse total que foi solicitado pelo Governo Federal, em 2014, para ser realocado do FNDCT (logo, com contribuições de todos seus fundos integrantes) ao orçamento do programa “Ciência sem Fronteiras”. O CT-Amazônia, um dos fundos que compõem o FNDCT, contribuiu com menos de 0,5% desse total.
Segunda nota da Suframa, em 7 de maio de 2015
NOTA | Em virtude da continuidade de circulação de notícias inverídicas nas redes sociais e em alguns órgãos de imprensa, relacionadas aos investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) no Polo Industrial de Manaus (PIM), a SUFRAMA vem novamente a público esclarecer os fatos.
Primeiramente é importante destacar que as empresas que produzem bens de informática no PIM tem de aplicar, anualmente, 5% de seu faturamento bruto em P&D, conforme determina a Lei nº 8387, de 30 de dezembro de 1991.
Destes 5% a serem aplicados, 0,5% deve ser depositado diretamente no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), em uma conta específica denominada CT-Amazônia.
A destinação destes recursos é aprovada pelo Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento na Amazônia (CAPDA), formado pelos seguintes representantes: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI), SUFRAMA, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Banco da Amazônia (BASA), Governo do Estado do Amazonas, Classe empresarial do Polo Industrial de Manaus e a Comunidade Científica da Amazônia Ocidental.
Nos últimos 12 anos (2003-2014), o montante total depositado pelas empresas fabricantes de bens de informática do PIM no CT-Amazônia foi de cerca de R$ 325 milhões, sendo que deste montante, R$ 87 milhões foram efetivamente destinados ao pagamento de projetos contratados pela FINEP, depois de aprovados pelo CAPDA. O restante dos recursos permanece aplicado no CT-Amazônia para financiamento dos próprios projetos em andamento (o pagamento é efetuado por etapas, a partir do estágio de execução das pesquisas) e para novos projetos, selecionados mediante editais publicados pela FINEP. Os dados referentes aos projetos financiados estão disponíveis nos sítios da FINEP e da SUFRAMA na INTERNET.
O valor divulgado de R$ 992,2 milhões diz respeito ao montante total que seria transferido do FNDCT – que é composto por diversos fundos setoriais, além do CT-Amazônia – para o programa Ciência sem Fronteira do Governo Federal. Porém, é sobremodo importante elucidar que a própria Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação do Ministério da Educação (MEC), divulgou nota no dia 24 de abril de 2015 informando que o referido programa não recebeu recursos de P&D da Zona Franca de Manaus.
Portanto, face ao exposto, claramente não houve “desvio de recursos” , uma vez que os valores depositados pelas empresas fabricantes de bens de informática do PIM permanecem aplicados no CT-Amazônia, bem como o assunto é tratado de forma transparente, uma vez que os dados referentes aos projetos financiados pela FINEP, depois de aprovados pelo CAPDA, estão disponíveis na página da FINEP na INTERNET.
A SUFRAMA continua à disposição da sociedade para prestar quaisquer informações adicionais que se fizerem necessárias.