Em meados de 2011, a então consulesa da Venezuela em Manaus, Carmen Nava, começou a articular as organizações de mulheres da Amazônia em torno da discussão da questão afroameríndia e caribenha com o objetivo de dar visibilidade às lutas e conquistas das mulheres, ampliar e fortalecer as organizações de mulheres negras e indígenas da Pan-Amazônia.
Pouco tempo depois, criou-se em Manaus, com a participação de diversos seguimentos das organizações sociais, o Fórum Internacional de Mulheres Afroameríndias e Caribenhas. Tratava-se de uma importante articulação dos movimentos de mulheres negras e indígenas na região, além da ampliação de uma articulação que já vinha ocorrendo em outros países da América Latina.
O dia Internacional das Mulheres Afroameríndias e Caribenhas, pautado na condição de desigualdade e étnico-racial em que vivem estas mulheres, foi criado em 25 de julho de 1992, durante o I Encontro de Mulheres Afrolatinoamericanas e Afrocaribenhas, em Santo Domingo, República Dominicana. Nessa ocasião estipulou-se que este dia seria o marco internacional da luta e da resistência das mulheres negras e indígenas.
Desde então, o Dia 25 de julho passou a ser um dia dedicado ao fortalecimento da identidade das mulheres negras e indígenas da América Latina e do Caribe. O Fórum Internacional das Mulheres Afroameríndias e Caribenhas se pauta na luta contra as desigualdades de gênero com o objetivo de ampliar e fortalecer as organizações de mulheres negras e indígenas construindo estratégias de enfrentamento ao racismo, sexismo, discriminação, preconceitos étnico-raciais e as desigualdades sociais.
A base epistêmica do seguimento afroameríndio é o ecofeminismo que, por sua vez, trata-se de um ramo do chamado feminismo subalterno ou pós-colonial surgido na década de 1970. Uma das fundadoras do ecofeminismo é Vandana Shiva, uma indiana formada em física nuclear e doutora em física quântica que definiu o ecofeminismo como “uma corrente política sincrética que busca o fim de todas as formas de opressão, através do convívio sem nenhuma forma de dominação ou subjugação, onde há complementação e nunca exploração”.
O ecofeminismo pensado por Vandana Shiva coloca a vida no centro da organização social, política e econômica das sociedades e o papel da mulher nessa centralidade é decisivo. Na raiz do ecofeminismo está o cuidado com a natureza e com a vida do planeta. Uma dimensão imprescindível nesse cuidado é a proteção das sementes que germinam novas vidas e garante a diversidade das espécies.
Uma das lutas do ecofeminismo tem sido a proteção das sementes, hoje apropriadas pelo agronegócio, numa realidade marcada pela mercantilização das sementes controladas pelo mercado dos transgênicos. Garantir a diversidade das sementes, das florestas, da agricultura e da vida, recebidas da natureza, representa um grande desafio assumido pelo ecofeminismo que entende que a mulher tem uma afinidade com as sementes por causa da gestação.
Para o ecofeminismo existe uma estreita relação entre a exploração e a submissão da natureza e a subjugação das mulheres e dos povos das florestas pelo poder capitalista patriarcal que se utiliza também da condição da classe social e do pertencimento étnico para estabelecer a dominação das mulheres.
Tendo como base os princípios do ecofeminismo, o Fórum Internacional de Mulheres Afroameríndias e Caribenhas vem, ao longo do tempo, trabalhando para romper com todas as formas de dominação, racismo, sexismo, discriminação, preconceitos étnico-raciais e desigualdades sociais impostas às mulheres negras e indígenas.
Através de encontros de estudos, cine-debates e conferências, e, de maneira especial de seminários temáticos, o Fórum Internacional de Mulheres Afroameríndias e Caribenhas vem conseguindo aproximar os diversos movimentos sociais de mulheres com as instâncias políticas da sociedade e com as universidades. Tem se configurado como um espaço importante de debate das mulheres em torno das questões das religiões, da política, do ensino, da pesquisa provocando novos estudos e abordagens relacionando gênero, classe e etnia para discutir a participação das mulheres negras e indígenas nos espaços de poder, de luta, de proteção e cuidado com a vida de todos os seres e do planeta.
Dito isso, aguarda-se ansiosamente pela realização do 4º Encontro do Fórum Internacional de Mulheres Afroameríndias e Caribenhas no próximo 25 de julho de 2017 e que não se perca a oportunidade de seguir aprofundando esta temática imprescindível para se pensar o lugar e os espaços de luta das mulheres na Amazônia, na América Latina e Caribe.
Marcia Oliveira é doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia (UFAM), com pós-doutorado em Sociedade e Fronteiras (UFRR); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia, mestre em Gênero, Identidade e Cidadania (Universidad de Huelva - Espanha); Cientista Social, Licenciada em Sociologia (UFAM); pesquisadora do Grupo de Estudos Migratórios da Amazônia (UFAM); Pesquisadora do Grupo de Estudo Interdisciplinar sobre Fronteiras: Processos Sociais e Simbólicos (UFRR); Professora da Universidade Federal de Roraima (UFRR); pesquisadora do Observatório das Migrações em Rondônia (OBMIRO/UNIR). Assessora da Rede Eclesial Pan-Amazônica - REPAM/CNBB e da Cáritas Brasileira.
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