Da Folhapress
SÃO PAULO – Oficialmente aposentado do voleibol desde o último fim de semana, o ex-líbero Serginho, 44, deixa as quadras como uma das principais referências do esporte no país e também como um fenômeno da sua posição.
A função exclusivamente de defesa foi oficializada pela FIVB (Federação Internacional de Vôlei) em 1998 e, de lá para cá, é quase unânime que ninguém atuou tão bem nela quanto o brasileiro de 1,84 m.
Com quatro medalhas olímpicas e dois títulos mundiais, Serginho saiu de cena sem um jogo oficial de despedida, após a Superliga ter sido encerrada em meio à pandemia de Covid-19.
A sua última partida foi no dia 7 de março, com a camisa do Vôlei Ribeirão. Ele já não defendia a camisa 10 da seleção brasileira desde o fim de 2016.
“Fico feliz de ter valorizado essa posição, e no momento em que o voleibol se tornou esporte de gigantes. Os caras estão cada vez mais altos, saltando mais. Vejo alguns jogadores, alguns líberos até fora do país com a camisa 10. São reconhecimentos, fico orgulhoso”, diz Serginho à reportagem.
Torcedor do Corinthians e fã de Neto, ex-camisa 10 do clube do Parque São Jorge, o agora ex-líbero escolheu o número de seu uniforme como forma de homenagear o ídolo.
Serginho tentou emplacar no futebol, mas não obteve o sucesso que viria a ter no vôlei. Disputou a sua primeira Superliga na temporada de 1998/1999, pelo time SOS Computadores, e estreou na seleção brasileira sob o comando de Bernardinho, em 2001.
“[Ele] Se transformou em um líder, inspirador, que pelo exemplo diário guiava seus companheiros”, escreveu o técnico em post de homenagem nas redes sociais.
Em 2016, Bernardinho, questionado por ter convocado o jogador, na época com 40 anos, para os Jogos do Rio, respondeu que, além da experiência, o impressionava a forma como o atleta cobrava a equipe e era respeitado pelos companheiros.
Pai de três filhos (Marlon, Matheus e Martin), Serginho afirma que o seu estilo de vida tranquilo fora de quadra o ajudou a se destacar.
“Logico que as qualidades, por ser rápido e habilidoso, ajudaram. Mas foi fundamental a forma como joguei o voleibol, me entreguei para o jogo e para a equipe”, afirma. “Minha personalidade como líder contribuiu muito para isso.”
Na seleção, o líbero conquistou duas medalhas olímpicas de ouro (Atenas-2004 e Rio-2016) e duas de prata (Pequim-2008 e Londres-2012). Também ganhou dois títulos mundiais (na Argentina, em 2002, e no Japão, em 2006), duas Copas do Mundo (ambas no Japão, em 2003 e 2007), sete Ligas Mundiais e uma medalha de ouro no Pan-Americano do Rio de Janeiro-2007.
Uma carreira, segundo ele, acima de qualquer expectativa. “Tudo valeu a pena, não me arrependo de nada e o vôlei só me deu amigos. Nem nos mais belos sonhos eu imaginaria que seria assim.”
A primeira medalha olímpica e o título da Superliga de 2009, na qual foi eleito o melhor da competição, foram especialmente simbólicos. Nada, porém, se compara à conquista na Olimpíada do Rio após a frustração vivida na decisão do ouro em Londres, quando o Brasil abriu 2 sets a 0 sobre a Rússia e sofreu a virada.
“Foi o pior momento, estávamos bem, e uma medalha de prata no Brasil é o sinônimo de derrota”, recorda. “Aquilo machucou, saí frustrado, esgotado psicologicamente.”
Apesar de ter deixado a seleção após aquele revés, com a iminência da Olimpíada no Brasil e o pedido do filho mais velho, Marlon, Serginho resolveu tentar mais uma vez e se colocou à disposição de Bernardinho.
A história terminou não apenas com o ouro -o Brasil bateu a Itália por 3 a 0 na final-, mas também com ele eleito o melhor da modalidade nos Jogos em casa. O jogador chorou copiosamente ao receber a medalha no Maracanãzinho e foi jogado ao alto pelos companheiros, enquanto o público gritava seu nome.
“Não tem como não lembrar da conquista no Rio de Janeiro, coroou uma geração que lutou muito”, afirma.
Depois da aposentadoria na seleção, Serginho continuou jogando na Superliga. Pôde vestir a camisa do Corinthians e nesta última temporada defendia o Vôlei Ribeirão -sua última partida foi uma vitória por 3 a 2 sobre o Minas.
O jogador, nascido em Diamante do Norte (PR) e criado no bairro de Pirituba, na zona norte de São Paulo, está no seu haras em Jarinu, no interior paulista.
O momento, segundo ele, é de aproveitar a família, além de continuar à frente da Instituto Serginho 10, que oferece aulas de reforço escolar e escolinha de vôlei e sua versão adaptada, em Guarulhos, para quase 400 pessoas -crianças, adolescentes e adultos acima de 50 anos.
“Muito cedo ainda para saber o que vou fazer, vamos esperar as coisas acontecerem e analisar convites. Quero, de alguma forma, transmitir o conhecimento que ganhei, seja dentro ou fora de quadra”, diz.
Diante da crise no vôlei, agora agravada pelo período da pandemia, Serginho demonstra preocupação com o futuro da modalidade no Brasil e considera inevitável a saída de atletas com proposta melhores para clubes europeus.
“Vamos perder muitos, e não só por conta da pandemia, isso já iria acontecer. Precisamos fazer no Brasil um movimento para o voleibol ser mais atrativo novamente”, afirma. “Essa situação poderá afetar, sim, a seleção à medida que os clubes vão perdendo força.”