
MANAUS – No dia 07 de dezembro, organizações da sociedade civil realizaram uma manifestação na Praça Heliodoro Balbi (Centro de Manaus) comemorando a promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que ocorreu no dia 10 de dezembro de 1948. Diversas lideranças se manifestaram ao público presente, destacando a importância dos direitos humanos para as sociedades e trazendo à tona inúmeras situações em que a dignidade humana é agredida na Amazônia, no Brasil e em vários países.
Promoveram o evento as seguintes organizações: o Fórum das Águas do Amazonas, o Serviço de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental, o Serviço Jesuíta a Migrantes e Refugiados, o Conselho Indigenista Missionário, a Comissão Pastoral da Terra e a Federação Amazonense de Apoio a Terceira Idade. Ademais, o evento foi dinamizado pela participação do Fórum Permanente das Mulheres de Manaus, a Rede um Grito pela Vida, a Associação de Mulheres do Amazonas, a Equipe Itinerante, a Associação dos Movimentos Ambientais, o Movimento de Trabalhadores e Trabalhadores por Direito, o Magis Amazônia e outras organizações.
As atrocidades realizadas na Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) acordaram as lideranças mundiais para os males que podemos fazer quando estamos dominados pelo ódio. Por isso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos indica que somente construiremos sociedades livres, justas e pacíficas se fundamentarmos as nossas instituições no valor inestimável da dignidade humana inerente a todos os membros da família humana e nos seus direitos iguais e inalienáveis, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
É importante que o documento, nos seus primeiros artigos, destaque o direito de todo ser humano à vida, à liberdade e a segurança pessoal. Daí a necessidade de focarmos a nossa atenção em situações de vulnerabilidade que colocam em risco a dignidade e vida humanas, pois quanto mais vulnerável a pessoa se encontra mais sujeita ela fica às agressões. Os direitos humanos são constantemente ampliados, abrangendo as esferas civis, políticas, sociais e culturais. Mas tomamos cada vez mais consciência de que a proteção da vida humana implica o cuidado pela Natureza, reconhecendo a sua dignidade e o seu direito de existência.
A Natureza constitui um dos sujeitos mais vulneráveis perante a ganância do ser humano e o seu élan ilimitado para a aquisição de lucro estimulado e potencializado pelas sociedades capitalistas. Este desequilíbrio tem levado o homem à devastação irracional do Meio Ambiente através de projetos que primam pelo desenvolvimento econômico, ignorando a importância da manutenção das condições ecossistêmicas necessárias para a continuidade da vida no planeta.
Como era de esperar, este modus operandi da sociedade capitalista conduz a humanidade para o colapso, colocando em risco várias espécies e afetando de forma especial as populações humanas mais vulneráveis.
O Brasil possui uma obscura história de violação dos direitos humanos. Não conseguimos ainda ser uma boa referência no que tange à implantação destas prerrogativas. Tal situação tem sido reforçada nos últimos anos, chegando a culminar numa tentativa de golpe de Estado, em janeiro de 2023, figurando uma brutal ofensa ao Estado de Direito Brasileiro e à nossa frágil democracia, que foi restabelecida à duras penas.
As experiências autoritárias no Brasil produziram desastrosas consequências em todas as esferas da sociedade: institucional, política, econômica, social, cultural e ambiental. É bom lembrar que neste contexto desfavorável, a luta pela conquista e implantação dos direitos foi e continua sendo o maior desafio da história brasileira.
O papel de ativistas e movimentos sociais é imprescindível para que direitos e garantias fundamentais sejam respeitados. No entanto, ser um defensor de direitos humanos no Brasil significa correr riscos. Levantamento das organizações Terra de Direito e Justiça Global mostrou que, de 2019 a 2022, o Brasil registou 1.171 casos de violências contra defensores de direitos humanos, com 169 pessoas assassinadas. Uma marca que coloca o Brasil entre os países mais perigosos do mundo para quem defende os direitos humanos.
O Caderno de Conflitos no Campo produzido pela Comissão Pastoral da Terra (2023) indica que houve um aumento progressivo dos conflitos ao longo dos últimos 10 anos. Em 2014, a série histórica iniciou com 1.399 conflitos enquanto no último ano a organização registrou 2.203 ocorrências, mostrando o alarmante crescimento da violência no campo.
A CPT também informa que os atores que mais praticam essas agressões são fazendeiros, empresários e grileiros. Entre os atores estaduais os mais violentos são o governo federal (1º lugar), o governo Estadual (2º lugar) e o municipal (3º lugar). As populações que mais sofreram essas agressões são os indígenas, os posseiros, os sem terra e os quilombolas.
A CPT também mostra o extraordinário aumento do trabalho escravo no campo, registrando o maior número de resgatados nos últimos 10 anos: 2.663 pessoas. As ocorrências mostram como a violação dos direitos humanos está fortemente arraigada no território nacional. Quanto aos conflitos por água, o Caderno também identifica intensa elevação, registrando um total de 225, em 2023. No campo, os fazendeiros, empresários e mineradoras são os principais violadores do direito à água. Já os principais prejudicados são os indígenas, os pescadores, os ribeirinhos e os quilombolas.
A Tribuna dos Direitos Humanos buscou socializar tais informações realizando um protesto contra a violação dos direitos humanos no campo, na cidade e nas florestas. A maioria das vítimas pertence a populações vulneráveis, abrangendo mulheres, indígenas, negros, crianças e outros segmentos fragilizados.
Além de protestar contra tais violações, a iniciativa também visou sensibilizar a população e poderes públicos em relação à necessidade de criar uma cultura da paz, da justiça e da liberdade. Mostrou-se que a construção de uma sociedade fraterna e sustentável semente será possível através do respeito aos direitos humanos e o cuidado com a casa comum, que implica reconhecer a importância de todas as formas de vida.
Sandoval Alves Rocha Fez doutorado em ciências sociais pela PUC-RIO. Participa da coordenação do Fórum das Águas do Amazonas e associado ao Observatório Nacional dos Direitos a água e ao saneamento (ONDAS). É membro da Companhia de Jesus, trabalha no Intituto Amazonizar da PUC-Rio, sediado em Manaus.
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