Ainda sobre a relação dialética do poder existente entre aquele que domina e o dominado, cabe indagar sobre empecilhos que impedem a superação desse confronto, ou do movimento de negação sob outra negação que afirma uma realidade.
Trazendo para a realidade tupiniquim, surgiu em nossa história uma grife política – que talvez seja inigualável em termos de importância política – chamada PT. Para compreender com propriedade o que foram tais governos baseados no chamado “lulismo” é preciso transcender essa discussão estéril dos supostos crimes realizados – não é objeto em questão reificar cortes judiciais – e entendê-los além do crivo da moralidade. Importa aqui observar as práticas comuns pertencentes a uma certa configuração conjuntural, como por exemplo o presidencialismo de coalizão.
Para entender um dos pilares do lulismo, recordemos o “pacto” de classes, com a recorrência de atender demandas latentes com o aumento relativo do poder de consumo da camada mais pobre e incremento do poder e do lucro da burguesia entreguista brasileira. O resultado prático foi o enfraquecimento do poder político dos trabalhadores, enquanto protagonistas da busca de sua própria liberdade, como uma condição dessa própria colaboração burguesa.
Isto é, o Partidos dos Trabalhadores deixou de ser um real partido dos trabalhadores, que não governava pelos trabalhadores e muito menos com os trabalhadores. Por essas e milhares de outras razões é que uma possível eleição de Lula – caso o “juíz acima da lei” de Curitiba/Washington não assine a sentença que já fora dada pela mídia corporativa – seria, não só, um fracasso para a nação, mas sim, sobretudo, uma enorme tragédia (à grega) para os planos da esquerda e de todos os guardiões da efetiva mudança.
Diferente das manifestações de 2013, e principalmente das de 2015-16, as manifestações deste ano caracterizam, pelo menos até agora, uma crescente volta da esquerda às ruas – de onde ela jamais deveria de ter saído. No último dia 15, 200 mil pessoas se encontraram na paulista para protestar contra as contrarreformas de Temer – com o infortúnio do maior símbolo político que lá presenciava era justamente Lula, e as organizações pelegas que acompanham esse petismo tardio.
Há hoje na esquerda, depois de algum tempo, um consenso de oposição a Temer e os avanços da direita, contudo não se tem ainda nenhum tipo de unidade de pensamento, sólida e madura, no que diz respeito a qual projeto de país queremos. Com isso, é preciso dizer quantas vezes for possível que Lula não deve ser uma das opções razoáveis.
Para elucidar o tamanho do oportunismo do ex-operário: num momento de seu discurso na manifestação, Lula criticava a reforma da previdência, dizendo que com ele no governo isso jamais aconteceria, citando o nome de Temer e Meirelles (hoje ministro da fazenda de Temer, e Presidente do Banco Central durante o governo Lula) como se quisesse que estes ouvissem-no numa espécie de “eu faria diferente”. O curioso – e profundamente verdadeiro – foi a resposta do banqueiro, dizendo que com certeza com Lula a medida seria aprovada também, justamente pelo caráter conciliador e moderado. Piada.
No caso das manifestações desse mês de março, o que se evidenciou não fora um agrupamento de organizações políticas e membros de uma classe média minimamente esclarecida, o que se via ali, era sobretudo aqueles quem não devem deixar de fazer política nunca, os trabalhadores. Também vale dizer que o motivo não era – felizmente – um apoio a candidatura do petista, era para afirmar o protesto. E isso marca o início de um possível ciclo de maturidade política que aflora das cinzas. É preciso saber que, o verdadeiro poder popular não está no voto – por mais que este tenha sua utilidade – mas que está sobretudo na capacidade de parar a produção e de se auto organizar como as únicas maneiras de se oporem à conjuntura.
Precisa-se agora estabelecer outro tipo de conciliação: a do poder popular com o poder intelectual. De ideias novas estamos cheios, de gente querendo fazer acontecer também. Precisamos escolher um novo projeto emancipador da nação, um projeto que coloque o Brasil num posto que combine com o tamanho da sua potencialidade. Mas um projeto que seja feita com o povo, pelo povo e pro povo.
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