Por João Gabriel e Ranier Bragon, da Folhapress
BRASÍLIA – Em meio a pressão para que a minirreforma eleitoral tramite com celeridade no Senado, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), enviou o texto à Comissão de Constituição e Justiça, abrindo caminho para que o projeto avance com mais velocidade e de forma independente ao novo Código Eleitoral.
A reforma aprovada pela Câmara dos Deputados na semana passada altera uma série de dispositivos eleitorais que, na prática, enxugam os prazos de inelegibilidade, afrouxam a Lei da Ficha Limpa e reduzem instrumentos de transparência.
Para que as novas regras passem a valer já nas eleições de 2024, elas precisam ser aprovadas no Congresso e sancionadas ou promulgadas até o fim da primeira semana de outubro.
Por essa razão, depois de aprovar o texto com velocidade, a Câmara agora pressiona para que ele caminhe rapidamente também no Senado – caso sofra alterações, o pacote ainda precisará voltar aos deputados antes de ser enviado à Presidência da República.
A movimentação para a CCJ aconteceu nesta quarta-feira (20). Há uma ala da Casa que defende que a proposta seja apensada ao Código Eleitoral, isto é, que os dois textos caminhem conjuntamente, uma vez que tratam de temas correlatos.
Já quem defende uma tramitação mais rápida pede que eles andem separadamente, uma vez que o código, um texto de 900 artigos e de difícil consenso, já está desde 2021 em debate entre senadores, sem grandes avanços.
O envio do texto à CCJ não impede que a reforma seja apensada ao Código Eleitoral, relatado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), mas é um indicativo de que os dois textos devem tramitar separadamente.
Foi o próprio Pacheco que, na última semana, afirmou que não aceleraria o andamento do tema, que não havia como garantir que ele fosse aprovado em tempo para as eleições de 2024. Na ocasião, ele defendeu que os dois textos fossem apensados.
“É algo complexo, é um Código Eleitoral inteiro. Nós temos que avaliar se é possível fazer isso em duas semanas ou não. De qualquer forma, nós não podemos produzir uma legislação na pressa. Vamos identificar se o todo ou se parte pode ser discutido no mês de setembro”, disse.
“O que eu considero necessário é que entreguemos um projeto de lei amadurecido, bem refletido, bem discutido com a sociedade e os senadores. Se, por ventura, for possível conciliar o trabalho bem feito com a eleição de 2024, ótimo. Se não for possível, paciência. A prioridade é entregar um projeto de lei bem amadurecido”.
Pacheco tem afirmado a interlocutores que ainda não decidiu a melhor forma de o texto tramitar. O envio à CCJ, segundo senadores ouvidos sob reserva, é uma forma de adiar a decisão sobre o apensamento, ou não, sem travar o texto enquanto isso.
Para que as propostas sejam anexadas, precisa ser apresentado requerimento com esse pedido, o que, até a manhã desta quinta-feira (21), não havia acontecido.
Sob reserva, líderes do Senado afirmam que a intenção da maioria da Casa é de que a medida seja aprovada a tempo de valer para as eleições de 2024.
Também deputados trabalham, desde que a reforma estava em debate na Câmara, em diálogo com senadores para que isso aconteça.
A reforma faz parte de uma empreitada do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para alterar as regras eleitorais. O principal projeto deste pacote é a PEC da Anistia, que visa conceder o maior perdão da história a partidos políticos e também flexibiliza as cotas de mulheres e negros nas eleições.
A proposta teve sua votação adiada nesta quarta, na comissão especial de deputados que debate o tema. Se aprovada, como deve ser, ela ainda precisa passar pelo plenário, ir para o Senado e, se aprovada sem alterações, ser sancionada antes de passar a valer.
Para que já tenham efeito nas eleições de 2024, os trechos que reduzem o repasse de verbas para candidaturas negras e alteram as cotas femininas também precisam ser aprovados até a primeira semana de outubro.
Além do perdão bilionário a partidos políticos, a PEC da Anistia também reduz de 50% para 20% a parcela da verba eleitoral destinada a chapas de negros.
Se por um lado o texto cria uma reserva de 15% de cadeiras para mulheres nas casas legislativas de todo o país, por outro ele flexibiliza os atuais 30% de candidaturas que devem ser concedidos a mulheres.
Nesta quarta, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), disse que a aprovação da reforma eleitoral no prazo para as eleições de 2024 pode não acontecer.
“Apostaria dizer que não conseguiremos apreciar cumprindo o prazo”, afirmou.
A reforma enxuga os tempos de inelegibilidade para vários casos, fazendo com que eles sejam contados a partir da data da condenação, e não do fim do cumprimento da pena, como é atualmente.
Especialistas ouvidos pela reportagem veem aí uma brecha, inclusive, para um candidato estar apto a concorrer durante sua inelegibilidade.
Seria o caso, por exemplo, de um candidato que teve uma decisão de um tribunal regional determinando sua inelegibilidade, mas conseguiu um efeito suspensivo provisório em uma instância superior, como o TSE.
Portanto, a contagem dos oito anos de inelegibilidade já estaria correndo, mas ele poderia tentar se eleger enquanto seu recurso estiver vigente.
A proposta também define que é necessária comprovação de culpa para aplicação da Lei de Improbidade Administrativa.
Neste mesmo dispositivo, a proposta exclui do rol dos atos que podem levar à inelegibilidade aqueles que “contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade”, atingindo diretamente a última reforma da Lei da Ficha Limpa, de 2021.
Dentro dessa categoria, se encontram, dentre outros casos, as práticas de revelar segredo de Estado, frustrar licitação ou concurso público em benefício próprio, deixar de prestar contas, desrespeitar a Lei de Acesso à Informação, vazar informação privilegiada e até nomear familiares, mesmo que indiretos, para cargos de confiança.
A proposta aprovada também eleva a cláusula de barreira para as sobras eleitorais, em uma mudança que potencialmente pode dificultar o crescimento de partidos menores.
Finalmente, a oposição ao governo Lula (PT) conseguiu, na Câmara, reverter a regulamentação das candidaturas coletivas e aprovar uma emenda no texto que, na verdade, veda esse tipo de aliança.