Por Alessandra Taveira, da Redação
MANAUS – Três anos após o início da vinda em massa de venezuelanos para Manaus, muitos imigrantes ainda ocupam as ruas na capital amazonense por falta de vagas em abrigos, segundo a Sejusc (Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania). Eles vendem banana, balas, água e pedem dinheiro em semáforos ou ruas de acesso a supermercados.
A secretária de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania, Caroline Braz, disse que não há espaço para todos os refugiados em Manaus. “A gente não consegue dar conta de toda essa demanda que cada vez aumenta mais. Por isso, a Operação Acolhida está fazendo o processo de interiorização. O intuito é não deixar nossa cidade inchar”, disse Braz.
Ainda segundo a secretária, foram abertas 50 vagas nos abrigos, resultantes do processo de transferência para outros estados em dezembro de 2019. “A operação é importante porque quando a gente manda os refugiados para outros estados, novas vagas se abrem e diminui a quantidade de pessoas nas ruas”, disse Braz. Questionada sobre a permanência de venezuelanos nas ruas, a secretária diz que a “demanda é muito grande e não há vagas para atender todas essas pessoas”.
Atualmente, segundo a Sejusc, há 20 mil imigrantes no Amazonas. Em Manaus estão cerca de 5,7 mil e outros 2 mil pedidos de refúgio já foram feitos ao governo.
Entre os imigrantes estão 407 crianças abrigadas em espaços coordenados pela Acnur – agência da ONU para refugiados. Conforme a Seduc (Secretaria de Estado de Educação), outras 1.991 crianças estão matriculadas em escolas de ensino básico regular. Neste cenário de refúgio estão também as mulheres imigrantes, que somam 213 nos abrigos da capital amazonense.
Os órgãos públicos não sabem mensurar a quantidade de venezuelanos nas ruas de Manaus. Um deles é Jarvie Cuence, 32, que sobrevive com a venda de água no semáforo da Avenida das Torres, próximo a saída para a Avenida Ephigênio Sales.
“Eu tô aqui porque não tenho onde trabalhar. Preciso me manter de alguma forma. Quando surgir uma oportunidade, eu paro de vir e trazer meu filho para a rua”, disse Jarvie. “Não tenho ajuda do governo. Só venho pra cá trabalhar e garantir o pouco que consigo vendendo água”, completou. Do dinheiro que arrecada, ela paga a conta do aluguel, alimenta o filho, Diego Cuence, 10, e compra roupas, mas a maior parte do vestuário é proveniente de doação.
Jarvie disse que tentou uma vaga nessas instalações, mas lhe foi dito que não havia vaga. Depois, ela foi renovar seus documentos e “eles me pediram para agendar um atendimento, mas eu não tenho dinheiro, nem condições de me deslocar duas, três, quatro, cinco vezes na semana”, disse.
A venezuelana tem familiares na Paraíba, e já tentou a mudança pela interiorização, mas não conseguiu. “O que dificulta é a burocracia que eles colocam para a interiorização. Eles pedem que eu tenha um trabalho fixo, um comprovante de pagamento regular de aluguel e uma conta bancária”, disse.
Para Jarvie, é angustiante criar o filho nessas condições. “Fico apreensiva de ver meu filho pedindo dinheiro de quem passa por aqui, mas tem muita gente que ajuda”, disse. Sobre a permanência dele nas ruas, ela diz que pretende matricular o filho em uma escola pública para garantir a segurança do menino. “Estou correndo atrás da matrícula dele neste ano”. “Quero muito jogar bola e ir para a escola”, disse Diego, segurando o braço da mãe.
Segurança
A segurança de mulheres venezuelanas desabrigadas ainda não é monitorada pela SSP (Secretaria de Segurança Pública do Amazonas). O órgão não possui banco de dados sobre ocorrências de violência contra as mulheres imigrantes.
“Nós não temos denúncias de mulheres venezuelanas em abrigos, nem desabrigadas, que tenham sido violentadas. Não sei dizer se é uma opção delas de se abster da denúncia ou se realmente não há casos. Quando elas vêm, já não estão mais em situação de vulnerabilidade”, disse a delegada Débora Mafra, da Delegacia da Mulher.
Questionada sobre o uso dessas estatísticas para fins de pesquisa e sistematização da segurança pública no Estado, Mafra afirma que quem garante a segurança dessas pessoas é a Sejusc. “Nós (da Polícia Civil) só podemos atuar depois que o crime acontece. Se meninas estão suscetíveis à violência é porque querem. Quem tem que cuidar da menor, são os pais. E são eles mesmos que acabam colocando essas crianças na rua”, disse.
De acordo com Mafra, na secretaria não há esse controle de saber se a pessoa denunciante é brasileira ou não. “Na verdade, nossa estatística precisa ser melhorada ainda. Não há banco de dados”, disse. “Como o Brasil não estava preparado para essa imigração, nosso sistema não foi feito pra isso”, justifica Mafra.