
Neste dia em que se comemora o Dia Internacional do Migrante, apresentamos uma retrospectiva das migrações na Amazônia neste ano de 2019. No mês de setembro, foram divulgadas pela ONU (Organização das Nações Unidas) as novas estimativas migratórias mundiais. A quantidade de pessoas deslocadas ao redor do mundo é a maior de todos os tempos. Atualmente temos mais migrantes circulando pelo mundo do que nos períodos das grandes guerras mundiais.
De acordo com dados divulgados pela Divisão de População do Departamento de Economia e Assuntos Sociais (DESA/ONU), o número de migrantes internacionais alcançou 272 milhões de pessoas em 2019, um aumento de 51 milhões em relação a 2010. Isso significa que atualmente 3,5% da população global encontra-se em situação de migração.
Os dados oficiais das agências ligadas à ONU que atuam com migrantes na Amazônia, especialmente o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Organização Internacional para as Migrações (OIM) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), informam que entre 2015 e maio de 2019, foram registradas mais de 178 mil solicitações de refúgio e de residência temporária. A maioria dos migrantes são venezuelanos e entram no País por Roraima, e se concentram nos municípios de Pacaraima e Boa Vista, capital do Estado. De acordo com as agências internacionais, mais de 6,3 mil pessoas, das quais 2,5 mil são crianças e adolescentes, vivem em abrigos temporários para migrantes na Amazônia, cerca de 32 mil venezuelanos morem em Boa Vista e mais de 1,5 mil venezuelanos vivem em situação de rua na capital roraimense, dos quais, quase a metade são crianças e adolescentes.
Os migrantes haitianos e cubanos também se somam às redes migratórias internacionais na Amazônia. De acordo com informes do setor de migrações da Polícia Federal de Roraima, até novembro deste ano, mais de 13 mil imigrantes vindos do Haiti entraram no país pela fronteira da Guiana, em Bonfim (RR). Nesta mesma fronteira adentraram a Amazônia brasileira mais 31 mil migrantes cubanos nos últimos dois anos.
Estas cifras revelam que a Amazônia encontra-se profundamente marcada pela Mobilidade Humana, e tem sido desafiada a acolher, compartilhar, cuidar e integrar os migrantes e refugiados que atualmente alcançam cifras inimagináveis e representam um “lixo humano que nem as empresas, nem os sistemas políticos, nem os grandes líderes econômicos estão interessados em reciclar” (Papa Francisco: Campanha Compartilha a viagem, 2017).
As migrações tem sido produzidas, em larga escala, pelo sistema capitalista que reproduz relações desiguais, injustas e opressoras. Entretanto, os migrantes são as verdadeiras vítimas deste sistema de exclusão. A criminalização dos migrantes leva a sociedade e não compreender que as migrações são produzidas em larga escala, de forma estrutural e sistemática, por um sistema econômico baseado na exclusão e nas desigualdades sociais.
Na Amazônia, as migrações internas caracterizadas pelos deslocamentos compulsórios de camponeses, ribeirinhos e indígenas, resultam da intervenção dos grandes projetos economicistas baseados na ganância e no acúmulo de riquezas às custas da exploração desmedida dos recursos naturais, especialmente das grandes mineradoras, dos garimpos clandestinos, das hidroelétricas, das madeireiras e do agronegócio que expulsa os povos de seus territórios e promovem grande devastação, contaminação da terra, do ar e das águas.
Expulsos de seus territórios, muitos são obrigados a ultrapassar as fronteiras de seus próprios para garantir a própria sobrevivência e de suas famílias. Nas sociedades de acolhida, longe de serem um problema, os migrantes representam oportunidades de se fazer circular culturas, tecnologias, línguas, conhecimentos, trocas sociais e culturais que enriquecem a sociedade.
No contexto migratório internacional, uma característica marcante é a feminização das migrações que coloca muitas mulheres vulneráveis ao tráfico humano, uma das piores formas de violência contra as mulheres e uma das mais perversas violações aos direitos humanos. Outras modalidades de tráfico humano também desafiam as redes de enfrentamento como é o caso do tráfico de órgãos e de crianças e o trabalho escravo.
Os deslocamentos forçados de grupos indígenas, consequência de processos históricos de expulsão de seus territórios, e que hoje estão em uma fase de aumento e expansão. Trata-se de uma mobilidade que contém sua própria especificidade e singularidade. Nos casos em que a circulação destes grupos indígenas ocorre em territórios de circulação tradicional indígena, separados por fronteiras geopolíticas nacionais, omite-se que estes povos são sujeitos de direitos coletivos, reconhecidos nas legislações nacionais e nos instrumentos internacionais, que devem ser garantidos independentemente do lugar onde eles se encontrem.
A livre circulação destes povos deve ser compreendida dentro de suas dinâmicas tradicionais e deve ser respeitada e protegida pelos Estados envolvidos considerando-se o direito dos indígenas a circular livremente pelo território e acessar às políticas públicas que considerem adequadas aos seus interesses. A mobilidade de grupos indígenas tem uma especificidade própria que deve ser compreendida e respeitada pelos agentes estatais que com eles atuam. Esta especificidade deve pautar as políticas públicas de acolhida, documentação, educação, saúde, reconhecimento de suas formas próprias de organização social e tomada de decisões, garantindo sempre a efetivação dos direitos contemplados nos instrumentos internacionais como a Convenção 169 da OIT, e de direitos humanos.
As novas dinâmicas migratórias exigem das autoridades competentes e dos diversos Estados nacionais a garantia dos direitos fundamentais dos migrantes e o cumprimento das obrigações dos Estados no campo da salvaguarda dos direitos, a proteção à vida e saúde das pessoas, as políticas públicas sólidas e consistentes de acolhida e integração e o combate contra toda forma de discriminação, exploração, xenofobia ou criminalização dos migrantes.
Marcia Oliveira é doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia (UFAM), com pós-doutorado em Sociedade e Fronteiras (UFRR); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia, mestre em Gênero, Identidade e Cidadania (Universidad de Huelva - Espanha); Cientista Social, Licenciada em Sociologia (UFAM); pesquisadora do Grupo de Estudos Migratórios da Amazônia (UFAM); Pesquisadora do Grupo de Estudo Interdisciplinar sobre Fronteiras: Processos Sociais e Simbólicos (UFRR); Professora da Universidade Federal de Roraima (UFRR); pesquisadora do Observatório das Migrações em Rondônia (OBMIRO/UNIR). Assessora da Rede Eclesial Pan-Amazônica - REPAM/CNBB e da Cáritas Brasileira.
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Muito incoerente a senhora, doutora. Um texto que trata de imigração em larga escala de venezuelanos e cubanos na Amazônia, a senhora escrever que: “As migrações têm sido produzidas, em larga escala, pelo sistema capitalista que reproduz relações desiguais, injustas e opressoras”. Creio que ocorreu um equívoco, vamos corrigir: “As migrações têm sido produzidas, em larga escala, pelo sistema socialista que reproduz pobreza, miséria, desbastecimento, violência e opressão.” Não precisa agradecer.
“As migrações tem sido produzidas, em larga escala, pelo sistema capitalista que reproduz relações desiguais, injustas e opressoras. Entretanto, os migrantes são as verdadeiras vítimas deste sistema de exclusão.” É isso mesmo? Não vejo americanos e britânicos vindo para o Brasil em busca de melhores condições de vida….
Me mandaram ler esse texto como fonte de informações sobre o assunto das migrações na Amazônia. Bem, espero que ao menos os números estejam certos. O Capitalismo venezuelano e cubano está causando a migração daqueles povos… essa deu vergonha de ler.