Por Isabela Moya, do Estadão Conteúdo
SÃO PAULO – Uma linhagem do coronavírus (Sars-CoV-2), chamada de XEC, que vem se espalhando pelo mundo, foi detectada no Brasil, nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina. O primeiro achado foi realizado pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) em amostras referentes a dois pacientes residentes na capital fluminense, diagnosticados com Covid-19 em setembro.
Estudos mostram que a XEC, que deriva da variante da Omicron, emergiu da recombinação genética entre cepas que já estavam em circulação. Esse evento acontece quando uma pessoa é simultaneamente infectada por duas linhagens diferentes de vírus.
Nesse caso, pode haver combinação dos genomas dos dois agentes infecciosos durante a replicação viral. O genoma da XEC, que contém segmentos dos genomas das linhagens KS.1.1 e KP.3.3, tem ainda mutações extras que podem facilitar sua propagação, conforme relatado pela Fiocruz.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) classificou a XEC como variante sob monitoramento, em 24 de setembro, devido a mutações no seu genoma que podem impactar o comportamento do vírus e também por observarem os sinais iniciais de “vantagem de crescimento” em comparação com outras variantes em circulação, explica a Fiocruz.
A atenção para a XEC aumentou entre junho e julho de 2024, após crescimento de casos identificados na Alemanha. A linhagem rapidamente se disseminou pela Europa, Américas, Ásia e Oceania, com ao menos 35 países reportando infecções. Até o dia 10 de outubro, mais de 2,4 mil sequências genéticas da XEC foram registradas na plataforma Gisaid.
Segundo a virologista Paola Resende, pesquisadora do Laboratório de Vírus Respiratórios, Exantemáticos, Enterovírus e Emergências Virais do IOC, dados do exterior indicam que a XEC pode ser mais transmissível do que outras linhagens, mas será necessário avaliar o seu comportamento no Brasil.
“Em outros países, essa variante tem apresentado sinais de maior transmissibilidade, aumentando a circulação do vírus. É importante observar o que vai acontecer no Brasil. O impacto da chegada dessa variante pode não ser o mesmo aqui porque a memória imunológica da população é diferente em cada país, devido às linhagens que já circularam no passado”, explica Paola, que também atua na Rede Genômica Fiocruz.
A identificação da XEC no Brasil ocorreu por meio de um esforço de vigilância que expandiu o sequenciamento genético do Sars-CoV-2 na cidade do Rio de Janeiro entre agosto e setembro, em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde.
Durante três semanas, foi feita a coleta de amostras de swab nasal, que foram enviadas ao Laboratório de Referência do IOC/Fiocruz para análise dos resultados positivos para Sars-CoV-2 diagnosticados por testes rápidos em unidades básicas de saúde. Apesar de ter identificado a presença da XEC, o monitoramento mostrou que a linhagem JN.1 continua sendo a predominante no Brasil desde o fim de 2023.
“Realizamos essa ação para compreender em tempo real o que estava ocorrendo no Rio, uma vez que havia leve aumento nos diagnósticos de covid-19 na cidade. Isso foi muito importante para detectar a variante XEC, que precisará ser acompanhada de agora em diante”, acrescenta Paola.
Dados da Secretaria Municipal de Saúde do Rio e do Infogripe, da Fiocruz, não indicam alta nos casos na cidade. A virologista alerta para o enfraquecimento da vigilância genômica do SARS-CoV-2 no Brasil e reforça a necessidade de manter o monitoramento em todo o território nacional.
“Atualmente, estamos sem dados genômicos de diversos Estados porque não tem ocorrido coleta e envio de amostras para sequenciamento genético. É muito importante que esse monitoramento seja mantido de forma homogênea no País para acompanhar o impacto da chegada da variante XEC e detectar outras variantes que podem alterar o cenário da Covid-19”, ressalta Paola.
A pesquisadora enfatiza a importância dos dados genômicos do Sars-CoV-2 em circulação para adaptar a composição das vacinas anticovid. A OMS conta com um grupo consultivo técnico dedicado a essa questão, que se reúne duas vezes ao ano. Em abril, o comitê sugeriu a criação de imunizantes que tenham como base a linhagem JN.1. Está agendada uma nova reunião para dezembro.