Por Iolanda Ventura, da Redação
MANAUS – O virologista e vice-diretor de Pesquisa da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) Amazônia, Felipe Naveca, afirma que pessoas que não se vacinam contra a Covid-19 contribuem para o surgimento de variantes que as vacinas atuais podem não conter a gravidade dos sintomas.
Em live nas redes sociais do Portal da Ciência, iniciativa de divulgação científica do Grupo de Pesquisa Trokano da Ufam (Universidade Federal do Amazonas), o pesquisador falou sobre aumento nos casos de Covid-19 no estado, e alertou que o vírus continua a se propagar. “Enquanto tiver pessoas sendo infectadas o vírus continua circulando e enquanto ele continua circulando, continua sofrendo mutações”.
O virologista explica que a hipótese mais provável para o surgimento da Ômicron é que tenha aparecido no continente africano, em países com baixa cobertura vacinal e que são afetados pelos altos índices de HIV, vírus causador da Aids, que ataca o sistema imunológico.
“Então, a hipótese mais provável para o surgimento da Ômicron é que o vírus ficou muito tempo infectando uma mesma pessoa, com imunidade baixa, provavelmente por ser portador de HIV, e o vírus foi sofrendo várias mutações dentro dessa pessoa. Até que ele acumulou uma série de mutações que foram benéficas para ele e aí ajudou o vírus a se espalhar mais”, afirmou.
Naveca critica a distribuição desigual de vacinas entre os países e alerta que os “vácuos” de imunização permitem a evolução do vírus. “Se essa hipótese realmente se comprovar e tudo leva a crer que sim, o que estamos vendo é que precisamos ter uma divisão mais igualitária das vacinas para que a gente não continue tendo ‘bolsões’ onde o vírus vai continuar evoluindo e a gente não sabe onde isso vai parar”, disse.
Naveca diz que os não vacinados devem procurar a proteção contra o novo coronavírus. O virologista afirma que hoje, apesar do aumento de infectados, as vacinas conseguem reduzir significativamente os casos graves, mas que isso não impede o aparecimento de uma variante que rompa o bloqueio.
“Estamos vendo uma variante [Ômicron] que consegue escapar bem da imunidade, mas não causar doença grave na maioria dos casos. Mas a gente não pode descartar uma situação de total escape vacinal e causar doença grave possa ocorrer se o vírus continuar evoluindo desse jeito. Então, são essas situações que as pessoas que não se vacinam acabam expondo toda a comunidade”, alertou.
Ômicron: mais branda?
Felipe Naveca afirma que é preciso ter cautela com suposições de que a Ômicron é uma variante branda da Covid-19. Isso porque, segundo o pesquisador, o cenário da pandemia agora é diferente do vivenciado em 2020 e início de 2021, quando não havia imunizantes. Ele cita como exemplo o Amazonas.
“Se a gente tivesse a entrada da Ômicron um ano atrás, seria desastrosa certamente. A gente estaria vivendo momentos muito complicados. Por isso que eu não gosto muito dessa afirmação de que ela causa doença leve porque estamos desconsiderando o fato de que a população não é mais a mesma, é uma população que tem o que a gente chama de imunidade híbrida. É uma imunidade causada tanto pela vacinação quanto pela exposição ao vírus”, explicou.
Naveca acrescenta que mesmo em níveis baixos, há casos graves de Covid-19 causados pela Ômicron. “Eu sempre falo para os meus alunos ‘nunca menospreze o potencial de um vírus’. Então é importante não acharmos que só doenças leves vão ser causadas pela Ômicron”.
De acordo com o virologista, pessoas não vacinadas correm o risco de morrer se contaminadas pela variante. “A gente teve um aumento de óbitos nas últimas semanas. Não adianta dizer que não aconteceu. E mais de 95% dos casos de Covid nas últimas semanas são causadas pela Ômicron em todo o Brasil. Então é óbvio que a Ômicron tem um papel nesses casos graves e nesses óbitos”, disse.
Sobrecarga da Saúde
Naveca avalia que outro malefício causado pela recusa em se vacinar é a sobrecarga do sistema de saúde. Ele cita como exemplo médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem que estão indo para o terceiro ano na pandemia.
“Então imagina agora que eles estão tendo esse aumento de casos justamente porque tem uma parcela da população que não quis se vacinar. Não é falta de oferta da vacina, é porque não quis”, afirmou. “Então esse é um estresse do sistema de saúde que era desnecessário”, criticou.
Vacinas
O virologista considera errado afirmar que as vacinas contra a Covid-19 são experimentais. “Não são experimentais, elas já passaram por essa fase e foram aprovadas pelos principais órgãos regulatórios do mundo. A Anvisa é um dos principais órgãos do mundo, tem profissionais extremamente competentes. E eles não iriam aprovar se não tivessem passado por um crivo muito rígido”, disse.
Naveca explica que as tecnologias usadas nos imunizantes não são novas. “E toda a tecnologia por trás, seja das vacinas de RNA, como a vacina da Pfizer e da Moderna, seja da vacina de adenovírus, que é a vacina da Astrazeneca e agora produzida pela Fiocruz, são tecnologias que não surgiram agora. São tecnologias de muitos anos, mas que foram implementadas agora graças a esse avanço tecnológicos que estamos vivendo”, informou.
Ele esclarece que a vacina não impede a contaminação, mas a evolução da doença. “Além disso, a gente tem o fato de que as vacinas não são esterilizantes, no sentido de que impedem a infecção, você diminui a infecção, diminui consideravelmente os casos graves”.